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Parte IV – Problemas clínicos
4.8. Abordagem do paciente com problemas musculo-esqueléticos

288. Deformidades da coluna / escoliose
JM Batista Marques

Documento de trabalho
última actualização em Dezembro 2000

Contacto para comentários e sugestões: Nogueira, R;
Silva, Eugénia

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Introdução
A coluna vertebral apresenta no plano sagital quatro curvaturas fisiológicas: a torácica e a pélvica que são côncavas para a frente (cifoses); a cervical e a lombar, que são côncavas para trás (lordoses). As primeiras estão presentes à nascença e são praticamente fixas; as segundas desenvolvem-se quando a posição erecta é assumida e são móveis. No plano frontal a coluna normal não apresenta curvaturas. Quando surgem deformidades na coluna vertebral estas podem classificar-se em antero-posteriores e em laterais, consoante afectam, respectivamente, o seu plano sagital ou o frontal. Por vezes surgem deformidades afectando concomitantemente ambos os planos, como é o caso das cifoscolioses e lordoscolioses. As deformidades da coluna vertebral são um problema relativamente frequente na prática diária da medicina geral e familiar, sendo um achado frequente durante um Exame Global de Saúde ou um rastreio executado no âmbito do Programa de Saúde Escolar.
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Deformidades antero-posteriores
As deformidades no plano sagital são consequência de um aumento ou de uma diminuição das curvaturas fisiológicas. Quando existe um aumento de uma curvatura fisiológica, temos no caso da cifose uma hipercifose (também denominada apenas de cifose), e no da lordose, uma hiperlordose. Quando existe uma diminuição temos um apagamento da curvatura fisiológica cifótica ou lordótica, a qual em casos extremos pode ultrapassar a própria rectificação, surgindo mesmo a sua inversão. A nível cervical a deformação mais vulgar é a hiperlordose, geralmente de compensação em relação com uma hipercifose dorsal, como ocorre na espondilartrite anquilosante, sendo frequentemente acompanhada de uma contractura dos trapézios. A nível dorsal o aumento da cifose é o achado mais frequente, sendo na maioria dos casos devida a uma doença de Scheuermann ou epifisite vertebral de crescimento, a uma cifose senil (por diminuição degenerativa progressiva da altura dos discos intervertebrais), ou a uma espondilartrite anquilosante. No caso de uma hipercifose muito acentuada, surgindo geralmente no quadro de uma D. de Scheuermann, poder-se-á tornar necessário o uso de uma ortótese durante o crescimento esquelético, ou nos casos mais graves se ter que proceder à sua correcção cirúrgica. No caso de uma hipercifose angular, secundária a um esmagamento vertebral, este é geralmente pós-traumático (na osteoporose, mesmo após traumatismo mínimo), podendo contudo ser secundário a doença infecciosa (tuberculose, brucelose,...) ou tumoral (metástase óssea, mieloma múltiplo,...). A nível lombar a deformidade mais frequentemente observada é a hiperlordose, bastante vulgar em mulheres pós-menopáusicas, devido ao relaxamento da parede abdominal e a concomitante obesidade, o chamado síndrome trofostático da pós-menopausa. O apagamento da lordose lombar, a sua rectificação ou mesmo a sua inversão (cifose lombar), é normalmente consequência de uma epifisite lombar de crescimento, de uma hérnia discal de longa duração, ou de uma espondilartrite anquilosante.
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Deformidades laterais. A escoliose

As deformidades da coluna vertebral no plano frontal denominam-se escolioses. Problema bastante comum afectando cerca de três por cento da população, são cinco vezes mais frequentes no sexo feminino e apresentam tendência a afectarem vários membros dentro da mesma família.
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Classificação
Existem dois tipos de deformidades, de importância clínica muito diferente pelas suas implicações em termos de prognóstico e de terapêutica, que pode ir desde a simples vigilância, até à indicação cirúrgica inadiável: as escolioses não-estruturadas e as escolioses estruturadas. As escolioses não-estruturadas são curvaturas da coluna vertebral sem rotação das vértebras e que desaparecem em decúbito; as escolioses estruturadas são curvaturas que são sempre acompanhadas de rotação das vértebras em torno do eixo longitudinal da coluna e que não desaparecem em decúbito. Segundo a Scolioses Research Society, consideram-se três critérios para a sua classificação: a etiologia, a área anatómica afectada e o padrão da curva. Segundo a sua etiologia, as escolioses não-estruturadas (ou atitudes escolióticas), que surgem como a adaptação de uma coluna normal a uma situação anormal, podem ter as mais diversas origens, tais como:

1. posturais, onde se englobam toda a série de incorrecções de postura originadas por uma má adaptação da coluna à posição bípede;
2. de compensação, como por exemplo de uma dismetria dos membros inferiores, a qual pode ser real ou funcional, conforme exista uma lesão dos membros inferiores ou apenas uma alteração da estática dos mesmos; são ainda de compensação os desvios que têm a sua origem em lesões das estruturas anexas à coluna, que podem ter as mais variadas causas;
3. antiálgicas, surgindo como atitude de defesa perante a dor, como no caso de uma ciatalgia;
4. inflamatórias, provocadas por um processo inflamatório da coluna ou estruturas anexas;
5. pitiáticas ou histéricas, cuja etiologia está implícita.

As escolioses estruturadas apenas em cerca de 20% dos casos têm uma causa conhecida, a qual pode ser:

1. congénita, a mais frequente, tendo a sua origem em anomalias da formação embriológica das vértebras, as quais podem ser de formação (vértebra em cunha, hemivértebra), de segmentação (unilateral, bilateral) ou mistas;
2. neuromuscular, podendo ser neuropática ou miopática; nas escolioses neuropáticas distinguem-se dois grupos: por lesão do 1.º neurónio (paralisia cerebral, degenerescência espinocerebelosa, siringomielia,...) e por lesão do 2.º neurónio (poliomielite, D. de Charcot-Marie-Tooth,...); das miopáticas salienta-se a da artrogripose e a da distrofia muscular;
3. neurofibromatose de von Recklinghausen;
4. doenças mesenquimatosas (S. de Ehlers-Danlos, S. de Marfan,...);
5. doença reumatóide;
6. traumática (fractura, pós-cirúrgica, irradiação);
7. retracções das partes moles (pós-empiema, pós-queimadura);
8. osteocondrodistrofias (mucopolissacaridoses, displasias,...);
9. infecção óssea (aguda, crónica);
10. doenças metabólicas (raquitismo, osteogénese imperfeita, homocistinúria,...);
11. tumores (ósseos, da espinal medula).

O grande grupo das escolioses ditas idiopáticas, cuja etiologia não foi ainda determinada e cujo diagnóstico é o de exclusão, constitui os restantes 80% das escolioses estruturadas, classificando-se em:

1. infantis (0-3 anos), que podem ser resolutivas ou progressivas (benignas, malignas), e dentro das quais se pode considerar um subgrupo do lactente (0-6 meses);
2. juvenis (3-10 anos);
3. do adolescente (>10 anos).

Segundo a área anatómica afectada, as escolioses classificam-se em cervicais, cervico-torácicas, torácicas, tóraco-lombares e lombares.
Segundo o padrão da curva, classificam-se de curva única, de curva dupla e de curvas múltiplas. O padrão de curva mais frequentemente encontrado na escoliose idiopática é o de curva única (torácica direita, lombar esquerda, toraco-lombar direita). O padrão de dupla curvatura torácica direita lombar esquerda também é vulgar. A presença de uma curva torácica esquerda deve fazer alertar para a possível existência de uma escoliose secundária.
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História clínica
Havendo certas particularidades na organização da história clínica de um doente com uma escoliose, alguns dados são essenciais obtermos da anamnese e do exame objectivo.

Anamnese - Na anamnese é importante sabermos qual o motivo da consulta, o qual na maior parte das vezes foi a constatação pela família, mas também com alguma frequência pelo professor de Educação Física, pelo treinador desportivo ou durante um rastreio escolar, da existência de uma assimetria do tronco, de uma omoplata mais proeminente que a outra, de um desnivelamento dos ombros ou da bacia. É importante investigarmos quando é que a deformidade surgiu e qual tem sido a sua evolução, se já foi efectuado algum tratamento e no caso afirmativo qual foi, se entretanto surgiram algumas complicações, nomeadamente cardiovasculares e neurológicas, e se existem queixas álgicas. Esclarecer se a dor interfere com as actividades da vida diária, ou com a prática de actividade desportiva, é importante não só para avaliarmos a gravidade da dor, mas também para ficarmos a saber até que ponto é que podemos recomendar a prática de exercício físico, elemento fundamental para um desenvolvimento músculo-esquelético equilibrado. Nos antecedentes pessoais a história peri-natal (problemas surgidos no decurso da gestação, possível traumatismo ou anoxia no parto) e o desenvolvimento psicomotor (alterado em doenças metabólicas, neurológicas, musculares,...) são importantes para o rastreio de causas secundárias de escoliose. Devemos também investigar os hábitos alimentares (raquitismo, hipovitaminoses,...), o cumprimento do calendário de vacinações, bem como a ocorrência de doenças infecciosas (poliomielite, meningoencefalite, tuberculose,...) e a sua relação com a aparecimento da deformidade. Nos antecedentes familiares há que interrogar sobre a consanguinidade dos pais (a sua frequência é elevada na D. de Friedreich), sobre a existência de doenças familiares (D. de Charcot-Marie-Tooth, miopatias,...), ou de eventuais alterações da coluna em outros elementos da família. O conhecimento da maturidade fisiológica é um factor que irá ser importante na orientação terapêutica. O aparecimento de sinais pré-pubertários marca o início da fase de crescimento rápido, e nas raparigas a menarca indica o início da fase descendente do pico de crescimento pubertário.

Exame objectivo – O exame objectivo permite-nos fazer o diagnóstico diferencial de uma escoliose não-estruturada de uma estruturada, pesquisar sinais que orientem no diagnóstico etiológico, quantificar a curva e avaliar as complicações provocadas pela deformidade. Devemos registar a altura, o peso, a envergadura e a altura do tronco (importante no diagnóstico das doenças mesenquimatosas), observarmos a postura corporal e o posicionamento da cabeça. Devemos procurar na pele a presença das típicas manchas de «café com leite» e os tumores (neurofibromatose), a simetria da face, a implantação dos pavilhões auriculares (doenças genéticas), a configuração do véu do palato, a implantação dentária, a existência de atrofias musculares (D. de Charcot-Marie-Tooth, siringomielia), e os sinais pubertários pela escala de Tanner. O exame do tronco deve realizar-se em várias posições: em ortostatismo (de costas, de perfil e de frente), na posição de sentado e em decúbito ventral. Na posição ortostática iniciamos a observação com o doente de costas, na sua postura de repouso habitual, olhando em frente, com os membros inferiores em extensão e os calcanhares em linha. Referenciamos na pele do dorso, com um lápis dermográfico, a saliência das apófises espinhosas (ou dos corpos vertebrais, no caso de existir rotação), e observamos o nivelamento dos ombros, do vértice das omoplatas, das cristas ilíacas, das pregas sub-glúteas e popliteias, a simetria dos triângulos toraco-braquiais ou de figura, e determinamos com o fio de prumo se o desvio é ou não compensado. Com o doente em flexão anterior do tronco - teste de Adams ou «forward bending test» -, vamos detectar e quantificar a existência de saliências paravertebrais, as gibosidades (cuja existência é comprovativa de uma rotação de corpos vertebrais, característica de escoliose estrutural), e avaliar a flexibilidade das curvas, o que é também investigado pelas inclinações laterais do tronco. Em seguida vamos observar o doente de perfil, medir as flechas no plano sagital a nível de C7 e de L5, e com o teste de Adams avaliar nesta outra perspectiva a harmonia e a flexibilidade das curvaturas. Ainda com o doente em pé mas agora de frente, observamos a simetria da grelha costal e a existência de deformidades («pectus escavatum» ou «carinatum»), a obliquidade da linha branca, a simetria das espinhas ilíacas antero-superiores, das glândulas mamárias e dos ombros. A observação do doente em decúbito ventral dá-nos a indicação quanto à flexibilidade e à redutibilidade da curvatura pelo decúbito (redutível na escoliose não-estruturada, não redutível na estruturada), e permite-nos pesquisar a existência de pontos dolorosos vertebrais e paravertebrais. O exame do doente na posição de sentado, e no caso de se tratar de uma escoliose não-estruturada (cujo padrão de curva é geralmente dorso-lombar esquerdo), permite-nos frequentemente verificar o seu desaparecimento pela anulação da causa da mesma, uma diferença de comprimento dos membros inferiores. É então necessário confirmar essa dismetria pela medição dos membros inferiores, a qual é feita da crista ilíaca antero-superior ao maléolo interno. Em doentes aos quais é impossível manter o ortostatismo, é também a posição de sentado a que nos vai possibilitar observar a execução do teste de Adams. Permite também, além de abolir a desigualdade dos membros inferiores, anular os efeitos da relativamente frequente retracção dos isquio-tibiais. É necessário também verificarmos se existe qualquer alteração estática nos outros segmentos do corpo (pés cavos na D. de Friedreich,...) principalmente se estas alterações são assimétricas. Como causa de atitude escoliótica encontram-se por vezes alterações da acuidade visual ou auditiva, principalmente quando existem diferenças bilateralmente. O exame neurológico, importante auxiliar no estabelecimento da etiologia da deformidade, deve ser realizado de um modo sistemático, podendo a detecção de sinais suspeitos mas inconclusivos justificar a referência para consulta da especialidade. O exame articular, pesquisando sinais de hipermobilidade articular, e o teste muscular, são outros aspectos importantes do exame objectivo a não negligenciar.
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Exames complementares de diagnóstico
Dos exames complementares de diagnóstico salientam-se os exames imagiológicos, tendo estes particular interesse por permitirem precisar e completar o exame clínico, fornecendo dados quantitativos relativos às curvas escolióticas e por poderem orientar o diagnóstico etiológico. Numa primeira consulta serão pedidos exames da coluna vertebral em filme extra-longo na posição ortostática (em carga), nas incidências postero-anterior e de perfil. A incidência antero-posterior é preterida em relação à postero-anterior a fim de se diminuir a exposição das glândulas mamárias aos raios X. Pede-se também uma radiografia do punho e da mão esquerda para determinação da idade óssea, e no caso de ter sido detectada objectivamente uma dismetria dos membros inferiores, pedimos uma medição radiológica dos mesmos. Estes exames radiográficos iniciais poderão ter de ser completados, se necessário, por estudos localizados de um ou outro segmento, ou ainda por filmes destinados a determinar o grau de redutibilidade da curva: em decúbito, em inclinações laterais, em suspensão ou em tracção. Em casos especiais pode ser necessária uma TAC ou uma mielografia. Deverá completar-se a avaliação imagiológica pela fotografia, que tem a vantagem de uma fácil comparação com exames futuros, ou então pela fotogrametria (método de Moiré ou estereometria dorsal), análise topográfica do tronco que nos permite fazer uma avaliação qualitativa do desvio. Sempre que a patologia oriente nesse sentido, e para permitir confirmar uma suspeita ou esclarecer uma dúvida, podemos também ter necessidade de recorrer a outros exames complementares, dos quais destacamos o electromiograma, a biopsia muscular, o podograma, o ecocardiograma e as provas de função respiratória.
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Indicações terapêuticas
A escoliose não-estruturada não levanta problemas terapêuticos significativos, justificando contudo uma vigilância regular e o incentivo à prática de actividade desportiva (sendo a natação a mais adequada). Deverá também ser ensinado em meio especializado a prática de um adequado esquema de cinesiterapia vertebral, respiratória e de correcção postural, que depois será executado regularmente pelo doente no seu domicílio, ou noutro local possível ou de sua preferência (ginásio da escola, pavilhão gimno-desportivo ou clube local). A escoliose estruturada é já uma patologia potencialmente grave que pode não só levar a uma diminuição da esperança de vida como consequência das alterações cardiopulmonares e neurológicas que pode provocar, mas que também pode levar ao desenvolvimento de uma auto-imagem negativa conducente a problemas psicológicos e a uma grande dificuldade na integração social. É pois necessário uma vigilância apertada da evolução da deformidade, pelo menos até à maturidade óssea, e uma atitude terapêutica adequada, a qual é primordialmente função da sua etiologia. Se a escoliose está inserida no quadro clínico de uma outra doença (neuromuscular, metabólica, óssea,…), pode ser necessário considerar a evolução da própria doença, ao tentarmos actuar sobre a deformidade. No caso de uma escoliose congénita, a atitude terapêutica depende do tipo de anomalia em causa e principalmente da evolução da curva. Mais de metade das curvas congénitas são benignas, sendo o seu tratamento feito por cinesiterapia vertebral e se necessário por uma ortótese. As restantes são malignas, evoluindo rapidamente, sendo necessária a fixação cirúrgica da curva. Se a escoliose é idiopática, a atitude terapêutica será função da idade, do sexo, da maturação óssea, da localização e do grau da curva (medida pelo método de Cobb) e da sua evolução. Se a curva tiver entre 10 e 15 graus, o procedimento a seguir será semelhante ao descrito para as escolioses não-estruturadas, sendo contudo necessário mais rigor no controlo do cumprimento das medidas. Se a curva medir entre 20 e 40 graus, e se se tratar de um doente ainda em fase de crescimento, está normalmente indicado o uso de uma ortótese e de tracção vertebral. A ortótese actua como um suporte para a coluna, tentando prevenir que a curva se agrave durante a fase de crescimento da criança. Não se pretende com uma ortótese a rectificação de uma coluna escoliótica, e nem sempre se conseguirá impedir o agravamento da curva, mas contudo numa percentagem significativa de casos de adolescentes que ainda não atingiram a maturidade óssea, as ortóteses são muito eficazes provocando a paragem ou um claro abrandamento da sua evolução maligna. Existem vários tipos de ortóteses, moldadas em material plástico leve, e criadas para darem solução a diferentes tipos de curvas, mas que de um modo geral se podem dividir em dois grupos: as curtas, para curvas baixas (lombares e dorso-lombares) e as longas para curvas altas (dorsais, cervico-dorsais). A TLSO (Thoracic-Lumbar-Sacral-Orthosis) é uma ortótese curta que é utilizada em curvas não muito acentuadas e que apresenta diversos tipos com denominações diferentes consoante o local onde foi concebida (Boston, New York, Miami, Wilmington,…). A ortótese de Charleston é deste tipo, mas que ao contrário das outras que são usadas durante o dia, é usada apenas enquanto a criança dorme, dado que ao tentar corrigir ao máximo a curva, coloca o tronco numa posição difícil de suportar em ortostatismo. A ortótese de Milwaukee é longa, sendo formada por uma cinta pélvica moldada sobre a bacia e um anel cervical, ligados por hastes (uma anterior e duas posteriores) nas quais são aplicadas almofadas correctoras das gibosidades. A tracção vertebral pode ser passiva ou activa. A tracção passiva é geralmente nocturna, aproveitando-se o decúbito e o relaxamento muscular durante o sono para o efeito ser o maior possível com a menor força de tracção aplicada. A tracção activa ou auto-elongação vertebral é feita durante o dia e o doente é concomitantemente o motor e o receptor da força de tracção, o que psicologicamente é muito benéfico. Tanto a ortótese como a tracção vertebral só são tratamentos eficazes se o adolescente for cooperante e se existir o apoio da família. Devem ser mantidas as actividades normais, incluindo as desportivas, que serão acompanhadas por uma cinesiterapia adequada. Se a curva tiver 40 a 50 graus ou mais, a intervenção cirúrgica é geralmente necessária para melhorar a deformidade e para prevenir o seu agravamento futuro. Outros factores que influenciam a recomendação da cirurgia são a área da coluna envolvida, o carácter evolutivo da curva, a presença de diminuição ou aumento da cifose dorsal, o potencial de crescimento esquelético, a dor (rara nos adolescentes mas bastante comum nos adultos), e factores pessoais (incluindo a recusa no uso de ortótese e em fazer a tracção vertebral). A finalidade da cirurgia é conseguir a estabilização da coluna num grau óptimo de correcção da deformidade, e o procedimento cirúrgico mais habitual é a técnica de Harrington, que consiste na artrodese vertebral posterior com enxerto ósseo, e inserção de uma haste distractora no lado côncavo da curva e por vezes também de uma haste compressora no lado convexo. Estas hastes (de Harrington) são usadas para fazer a contenção da correcção obtida num alinhamento tão normal quanto possível, enquanto a fusão óssea se processa, e só muito raramente são posteriormente removidas. Apesar de limitativa da mobilidade da coluna vertebral, a cirurgia não impede que o doente, passado o período de imobilização do tronco necessário para a consolidação da artrodese vertebral (inicialmente por colete gessado, depois por ortótese), possa vir a fazer uma vida activa praticamente normal, só lhe estando impedido a prática de actividades físicas e desportivas violentas.