1
Introdução
O dispositivo intra-uterino (DIU) é um método considerado
eficaz por estudos de comprovada evidência científica, nomeadamente
nos Estados Unidos e Reino Unido.
Existem no entanto alguns mitos sobre este método contraceptivo,
por se pensar durante muito tempo que existia ligação directa
entre a utilização do DIU e doença inflamatória
pélvica (DIP). Após a vasta experiência de utilização
e os resultados epidemiológicos daí resultantes, concluiu-se
que esse risco se concentra no primeiro mês após a sua aplicação
e apenas nas mulheres expostas a doenças de transmissão
sexual (DTS).
A probabilidade de gravidez em mulheres que utilizam DIU's considerados
clássicos é inferior a 1% para alguns autores, e de 0,1
a 2% para outros. No que diz respeito ao DIU com levonorgestrel (Mirenaâ)
o risco de gravidez é considerado tão baixo como o da esterilização
feminina: menos de uma gravidez por 200 mu-lheres, por ano.
2
Tipos de DIU's
DIU inerte de polietileno - não são comercializados
em Portugal mas poderão aparecer mulheres que os introduziram noutro
país. É importante reter que estes dispositivos não
precisam de ser substituídos e funci-onam apenas como método
mecânico.
DIU com cobre - Multiload®, Gine-T®,.Nova-T®. Hoje é
consensual que os DIU's com 250 Cu podem perma-necer pelo menos 5 anos
e os DIU's com 380 Cu mantêm a sua eficácia durante pelo
menos 10 anos, con-forme aprovado pela FDA e recomendado pela OMS.
DIU com levonorgestrel - Mirena®. A quantidade de levonorgestrel
eficaz mantém-se pelo menos durante 7 anos.
3
Mecanismo de acção
Muitas teorias tentam explicar o mecanismo de contracepção
dos dispositivos. A mais recente resulta de estudos que apontam o dispositivo
funcionando como "corpo estranho". Assim, a par de uma acção
mecâni-ca, existe uma reacção bioquímica e
inflamatória não infecciosa que desencadeia libertação
de prostaglan-dinas. Esta libertação tem como resultado,
alteração da actividade uterina e da mobilidade tubárica,
assim como um efeito directo nos espermatozoides.
O aumenta do fluxo menstrual deve-se também a uma provável
acção fibrinolítica e a efeitos locais no en-dométrio.
O dispositivo com levonorgestrel tem no entanto um efeito oposto no fluxo
menstrual pois, apesar de provo-car algumas irregularidades nos primeiros
meses, o fluxo reduz drasticamente pelo efeito progestageneo, que induz
diminuição da espessura do endométrio. Algumas mulheres
desenvolvem mesmo amenorreia.
No entanto o mecanismo de acção ainda não se encontra
totalmente esclarecido.
4
Indicações
Mulheres fumadoras com idade > 35 anos
Mulheres com contra-indicação formal para o uso de contracepção
hormonal (hipertensão, enxaqueca) - excluído o DIU com levonorgestrel.
Mulher que desejam contracepção eficaz e se esquecem de
tomar a pílula e não pretendem efectuar esterili-zação.
Mulheres cujos companheiros estão ausentes por períodos
irregulares de tempo.
Nulíparas que não podem ou não querem utilizar outro
tipo de contracepção.
Mulheres com fluxo menstrual abundante e dismenorreia têm indicação
para o dispositivo com levonorges-trel.
5
Contra -indicações absolutas
Gravidez
Hemorragia não esclarecida
Neoplasia do colo uterino
Neoplasia do endométrio
Doença inflamatória pélvica (DIP)
Alterações mórficas locais (útero biseptado)
Alergia ao cobre e doença de Wilson
Portadoras de HIV ou com SIDA
Mulheres com imunosupressão
6
Contra-indicações relativas
Nuliparidade
Comportamentos sexuais promíscuos
Antecedentes de gravidez ectópica
Anemias crónicas (incluindo a Talassemia e Drepanocitose)
Menorragias
Infecções cervico-vaginais
Fibromas uterinos
Doença valvular
Corticoterapia sistémica
Em qualquer uma destas contra-indicações deve ser ponderado
o risco/beneficio e a eventualidade de al-guns poderem ser corrigidos.
7
Aplicação prática
Antes da hipótese de aplicação do DIU, já
deve ter sido explicado ao casal quais as vantagens, riscos, efei-tos
secundários, eficácia e segurança deste método
contraceptivo. Quer o consentimento esclarecido quer a tranquilidade e
segurança transmitida à mulher por quem o aplica, são
factores muito importantes para o uso bem sucedido do DIU.
Preferencialmente deve ser colocado com a mulher menstruada (no 2º
ou 3º dia do período menstrual), por duas ordens de razão:
- existe de algum modo a garantia da não existência de gravidez;
- estando o colo uterino ligeiramente mais aberto, além de ser
menos doloroso para a mulher, é mais fácil a introdução
quer do histerómetro quer do dispositivo.
No pós- parto o dispositivo pode ser aplicado às 6 semanas,
pois está provado que não existe maior risco de infecção
pélvica, e existe um menor risco de perfuração com
a vantagem de ser um método que não interfe-re na amamentação.
Há, no entanto, estudos que evidenciam bons resultados com inserção
pós-parto ime-diata ou pós-aborto (10 min. após a
expulsão da placenta).
Deve ser feito um exame ginecológico com toque bimanual para avaliar
o tamanho e posicionamento do útero, e da possível existência
de qualquer anomalia física que invalide a aplicação
do DIU.
Aplica-se o espéculo, que deve ser irrecuperável, e quando
se visualiza o colo fixa-se o espéculo; limpa-se o colo com uma
compressa embebida numa solução anti-séptica, observando
bem quer as paredes vaginais quer o colo uterino.
De imediato fixa-se o colo, aplicando uma pinça de garras (Pozzi)
na região superior do mesmo (o corres-pondente às 12 horas),
não esquecendo que a mulher deve ser avisada do que se está
a fazer, para que a colaboração seja a melhor possível.
Com o colo fixo, faz-se tracção com uma das mãos,
na direcção do aplicador, no sentido da horizontalização
do útero tentando corrigir a sua anteroversão, e com a outra
mão introduz-se o histerómetro no orifício ex-terno
do colo; deve sentir-se uma ligeira resistência na passagem do orifício
interno do colo e sem forçar muito para não criar falsos
trajectos, introduz-se o restante para aferir o tamanho e orientação
da cavidade uterina, que normalmente tem entre os 6 a 8 cm.
O DIU deve então ser preparado dentro da cânula de acordo
com o tipo que estamos a utilizar (GINO T®, MULTILOAD® etc.),
medindo-o pelo resultado da histerometria.
A introdução deve ser imediata, com a técnica adequada
ao tipo de DIU em causa, ficando apenas no exte-rior do orifício
externo do colo o filamento (fios).
Os fios devem ser cortados a cerca de 2-3 cm do orifício externo
do colo, avisando a mulher que caso os sinta ao lavar-se os deve empurrar
para cima.
Limpa-se novamente com uma compressa embebida na solução
anti-séptica, e após retirar o espéculo efectua-se
o toque bimanual.
8
Complicações
na inserção
- Lipotimia por reacção vagal
- Hemorragia no ponto de fixação da pinça de garras
- Dores violentas ou espasmo do colo uterino
- Perfuração quer com histerómetro quer com o próprio
dispositivo
No caso de
suspeita de perfuração com o histerómetro não
deve ser aplicado o DIU; no caso da suspeita ser após a colocação
do DIU, deve a mulher ser posta ao corrente da situação
e requerer de imediato uma eco-grafia para localização do
mesmo.
Durante algum
tempo pensou-se ser importante o uso profilático de antibioterapia
(azitromicina) aquando da inserção dos DIU's, mas todos
os estudos apontam no sentido de que não há qualquer vantagem
no seu uso. As mulheres candidatas ao uso deste método desde que
bem seleccionadas não têm risco acrescido de infecções
do tracto genital.
No entanto, segundo alguns autores essa atitude pode tornar-se questionável
em países onde a prevalência de DTS's como a Chlamydia trachomatis
e da Neisseria gonorreia é substancialmente mais elevada.
9
Vigilância («follow-up»)
A primeira consulta subsequente à colocação do DIU
deverá ser efectuada às 4 a 6 semanas, ou seja, deve-rá
ocorrer um ciclo menstrual até nova consulta.
A frequência das restantes vigilâncias dependerá da
disponibilidade da mulher, sendo o ideal de 6 em 6 meses; caso não
seja possível então deverá ser anual.
Em qualquer uma destas vigilâncias deve ser efectuado o toque bimanual
e o exame ginecológico com es-péculo.
Os fios devem estar visíveis, e no caso de haver queixas do casal
em relação ao seu comprimento devem ser cortados.
As citologias são efectuadas de acordo com o esquema geral, não
usando para a colheita o "citobrush", mas sim a cotonete e a
espátula.
10
Efeitos secundários
Dor pélvica intensa e persistente - deve levar à
extracção do DIU, caso seja insuportável.
Período menstrual mais abundante - deve manter-se vigilância
(anemias) e tranquilizar a mulher, procurando não ser intempestivo.
Corrimento vaginal - o aumento da secreção mucoide
não deve confundir-se com leucorreia; é importante esclarecer
a mulher sobre esta diferença.
«Spotting» - apenas existirá no inicio e desaparecerá
espontaneamente com o tempo.
11
Complicações
Expulsão
Ocorre com mais frequência nos 3 primeiros meses após a sua
colocação e em nulíparas. A taxa de expul-são
diminui com a idade, paridade e tempo de utilização.
Infecção Pélvica
Pode ocorrer por falta de assepsia no momento da inserção
ou porque a mulher adquiriu entretanto uma doença sexualmente transmissível
- deve ser retirado o DIU.
Gravidez
Quando confirmada a gravidez intra-uterina, e se se pretende que evolua,
deve ser retirado o DIU o mais precocemente possível.
12
Vantagens
Eficaz
Reversível
Pouco dispendioso
Vigilância eventualmente anual
Não interfere no acto sexual
Não interfere na libido
Não interfere na amamentação
Não tem efeitos sistémicos (excepto o DIU com levonorgestrel)
13
Bibliografia
Canavan P T, M D. Appropriate Use of the Intrauterine Device.
American Family Phisician Dezembro 1998; 58 (9) 2077-2084
Coggins C, Sloan N L. Prophylactic antibiotics before insertion of intrauterine
devices. Lancet 1998; 351: 1962-1963.
Cooling H. Contracepção: as opções actuais.
UPDATE 1999; Abril 120:37-40.
Diaz S, Zepeda A, Maturana X, Reyes M V, Miranda P, Casado M E, Peralta
O, Croxatto H B. Fertility Re-gulation in Nursing Women. Contraception
1997; 56:223-232.
Direcção Geral da Saúde. Divisão de Saúde
Materna, Infantil e dos Adolescentes. Saúde Reprodutiva Pla-neamento
Familiar. Orientações Técnicas 1998; Ministério
da Saúde.
DIU's - In Update. In Population Reports. Population Information Program,
The Jonh Hopkins School of Public Health 1995; XXIII-5. In Direcção
Geral da Saúde. Divisão de Saúde Materna, Infantil
e dos Adoles-centes. Progressos em Saúde Reprodutiva.1998; Outono
5.
Ebi K L, Piziali R L, Rosenberg M, Wachob F. Evidence against tailstrings
increasing the rate of pelvic in-flammatory disease among iud users.Contraception
1996; 53:25-32.
Fedele L , Bianchi S , Raffaelli, Portuese A, Dorta M. Treatment of adenomyyosis-associated
menorrhagia with a levonorgestrel-releasing intrauterine device. Fertility
and Sterility 1997;68(3):426-429.
Hicks D A. Department of Genitourinary Medicine, Royal Hallamshire Hospital,
SheffieldS10 2SF, UK. What risk of infection with iud use? Lancet 1998;
351:1238.
Home Family Planning, Intrauterine devices (IUDs) FAQ. 1998; August 12
Home Family Planning. Pospartum IUD insertion: what do we know? 1998;
August 12.
Odlind V.Modern intra-uterine devices .Baillier,s Clinical Obstetrics
and Gynaecology 1996;10(1):55-67.
Tatum H J, Beltran R S, Ramos R, Kets H V, Sivin I, Schmidt F H. Immediate
postplacental insertion of GYNE-T 380 and GYNE-T380 postpartum intrauterine
contraceptive devices:Randomized study. Am J Ob-stet Gynecol 1996; 175(5):1231-1235.
Walsh T, Grimes D, Frezieres R, Nelson A, Berstein L, Coulson A, Bernstein
G. Randomised controlled trial of prophylatic antibiotics before insertion
of intrauterine devices. Lancet 1998;351:1005-1008.
|