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Parte II – Promoção e protecção da saúde nas diferentes fases de vida
2.7. Saúde do adulto
88. Terapêutica Hormonal de Substituição
Graça Veiga
Documento de trabalho
última actualização em Dezembro 2000

Contacto para comentários e sugestões: Jordão, J Guilherme


Numerosos estudos observacionais e retrospectivos apontam inequívocas vantagens na utilização das terapêuticas hormonais de substituição (THS). Elas melhoram a qualidade de vida diminuindo os sintomas desagradáveis da menopausa; tratamentos prolongados diminuem o risco de doença cardiovascular, melhoram o perfil lipídico, o risco de osteoporose, do AVC, do cancro colo-rectal e de D de Alzheimer, impedem a atrofia urogenital limitando as doenças que daí advêem. Contudo, dados do estudo HERS («Heart and estrogen/ progestin replacement study») vieram refrear os ânimos dos mais entusiastas defensores das THS. Neste estudo, os resultados avaliados foram o enfarte do miocardio não fatal ou a morte por doença coronária. A THS não prevenia os acidentes cardiovasculares ou a morte nas mulheres com doença coronária grave estabelecida, nem influenciavam o prognóstico (apesar dos benefícios significatívos a nível dos lípidos). A taxa de acidentes cardiovasculares foi mais elevada (versus os que fizeram placebo), durante o primeiro ano, embora fosse mais baixa nos anos seguintes. Houve também um risco mais elevado de trombose venosa profunda, embolia pulmonar e de doença da vesícula biliar. Contudo, o estudo HERS incide na prevenção secundária, não deveremos extrapolar os dados para prevenção primária. Enquanto se aguarda os resultados de um grande estudo (NHL-BI), decisões de fazer/ não fazer THS deverão ser tomados à luz dos conhecimento actuais, tomando também em linha de conta os resultados dos estudos observacionais anteriores, nomeadamente o estudo PEPI e o estudo das enfermeiras saudáveis.
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Quem deverá fazer terapêutica hormonal de substituição?
Quem assim o desejar, partindo-se do pressuposto que a soma total dos benefícios iguala ou ultrapassa os riscos.
Muitos autores consideram que são contra-indicações absolutas para este tipo de tratamento o cancro hormono-dependente, a doença hepática activa, a trombose activa e perdas hemáticas vaginais de causa desconhecida. Serão contra indicações relativas a doença hepática crónica, a hipertriglicidemia grave (pelo risco de pancreatite), a endometriose, tromboembolismo de origem hormonal, embolia pulmonar não devido a trauma. A THS pode agravar os episódios de migraine nas mulheres que melhoraram os seus episódios de enxaqueca após a menopausa.
Poderão beneficiar especialmente da THS as mulheres com factores de risco acrescido para doença coronária e osteoporose, as mulheres com menopausas precoces e as mulheres com menopausas cirúrgicas.
A decisão final deverá ser sempre uma decisão partilhada, equacionando-se para aquele caso específico as vantagens e desvantagens da terapêutica, a vontade da mulher cumprir determinados procedimentos preventivos e a sua aceitação das hemorragias vaginais que ocorrem com as terapêuticas de oposição, únicas de risco aceitável para as mulheres de útero intacto.

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Quadro I

Contra indicações para a utilização das THS

Contra indicações absolutas Contra indicações relativas
Cancro da mama
D. Hepática activa
Trombose activa
Perdas vaginais de causa não esclarecida
D Hepática crónica
Hipertriglicidemia severa
Endometriose
Tromboembolismo de origem hormonal
Embolia pulmonar não devido a trauma

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Que exames fazer antes de uma THS?

Para além do exame físico geral, o exame ginecológico deverá ser cuidadoso, devendo-se proceder à colheita do exsudado cervico-vaginal para a realização de um exame anatomo-patológico. É importante que se avalie o epitélio de transição porque é o local mais frequente do carcinoma do colo do útero.
Dos exames complementares de diagnóstico deverá constar um estudo analítico, uma ecografia ginecológica, uma mamografia e eventualmente uma ecografia mamária.
A vigilância semestral deverá ser mantida, repetindo-se periodicamente os exames complementares.
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Quando iniciar/ suspender a terapeutica hormonal de substituição?
Não existem orientações formais para o inicio deste tipo de terapêuticas, contudo como elas aliviam as queixas desagradáveis da menopausa, a altura ideal é o inicio do climatério. Ressalve-se que, como não têm efeitos anti-conceptivos, poderão ser preteridas em relação aos anti-conceptivos de baixa dosagem, utilizando-se apenas depois da cessação da actividade do ovário. O potencial incómodo das hemorragias de privação será menor nesta fase porque as mulheres ainda estão habituadas a terem períodos menstruais.
A duração da terapêutica depende da motivação da doente para a continuar e, especialmente, se esta está apenas interessada em diminuir as queixas desagradáveis da menopausa ou a fazer prevenção. Sabemos que os benefícios em relação às doenças cardiovasculares e à osteoporose existem com terapêuticas longas (mais de cinco anos) e cessam após a suspensão das mesmas. Em todos os casos, a THS deverá ser interrompida se se identificar uma complicação ou uma contra indicação absoluta ou mesmo relativa. A reavaliação da situação particular dessa doente será mandatória para a decisão de a reiniciar com o mesmo formulado ou com outro, ou para a suspender para sempre.
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Que tipo de THS deverá ser prescrita?
Existem no mercado vários preparados orais ou trasdermicos, simples ou em associação com progestativos. Dado o risco aumentado de cancro do endométrio com a estrogenoterapia isolada, a ideia fundamental é que, mulher com útero deverá receber doses adequadas de progesterona (5 a 10 mg pelo menos 10-12 dia do ciclo). Deverá ser evitada a hiperplasia do endométrio, compensando o efeito estrogénico com o progestativo.
Um dos grandes obstáculos à THS da parte das mulheres é o restabelecimento das hemorragias vaginais de privação. Tanto os regimes cíclicos como os contínuos com progestagéneos estão associados a hemorragias, mas ao fim de um ano de tratamento é menos provável que ocorram com os últimos.
A tibolona, uma hormona sintética com efeitos estrogénicos e progestativos moderados, não provoca hemorragias de privação e pode ser uma alternativa para estas mulheres. Contudo, não existem grandes estudos que comparem a tibolona com outras terapêuticas mais clássicas e é uma terapêutica não comparticipada pelo nosso sistema de saúde.
Os preparados transdermicos podem ser interessantes quando a estimulação do metabolismo hepático deva ser evitado; as mulheres com história de trombose venosa profunda podem beneficiar com estes adesivos. Contudo, como os estrogéneos não passam pelo fígado, o perfil lipídio também não melhora.
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Quadro II

THS Disponível em Portugal

Designação
Comercial
Designação
Farmacológica
Via de administração Tipo de tratamento Hemorragia deprivação
Estraderm MX,25,50,100 Estradiol Transdérmica  Contínuo  Não *
Dermestril Estradiol Transdérmica Contínuo Não *
Climara Estradiol Transdérmica Contínuo Não *
Menorest Estradiol Transdérmica Contínuo Não *
Estrofen Estradiol Oral Contínuo Não *
Estracomb Estradiol + Noretisterona (C19) Transdérmica Estrogeneo contínuo + 14 dias de progestativo Sim
Premarim plus Estrog. Equinos + Medrogestona (C21) Oral Estrogeneo contínuo + 12 dias de progestativo Sim
Femoston Estradiol + Dy-Drogesterona (C21) Oral Estrogeneo contínuo + 14 dias de progestativo Sim
Nuvelle Val. Estradiol + Levonorgestrel (C19) Oral Estrogeneo contínuo + 12 dias de progestativo Sim
Trisequens Estradiol + Norestisterona (C19) Oral Estrogeneo contínuo +10 dias de progestativo Sim
Climen Val. Estradiol + Ciproterona (C21) Oral Estrogeneo cíclico + 10 dias de progestativo Sim
Dilena  Val.Estradiol + Medroxiprogesterona (C21) Oral Estrogeneo cíclico + 10 dias de progestativo Sim
Kliogest Estradiol + Noretisterona (C19) Oral Contínuo Não
Livial Tibolona Oral Contínuo Não

*Só devem ser utilizados nas mulheres histerectomizadas


A decisão de fazer a THS e qual o regime hormonal, deverá ser baseado na predictilidade do aumento da esperança de vida e da ocorrência de doença / a possibilidade de efeitos laterais, padrão de hemorragia e necessidade de efectuar monitorização do endométrio.
Em todos os casos a decisão final será da mulher.
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