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Parte IV – Problemas clínicos
4.11. Abordagem do paciente com problemas no aparelho genital
361. Neoplasia da próstata
Sebastião José Baleiras
Documento de trabalho
última actualização em Dezembro 2000

Contacto para comentários e sugestões: Baleiras, Sebastião


A neoplasia mais frequente da próstata é o adenocarcinoma. O sarcoma da próstata é raro e surge geralmente nas crianças. Podem também aparecer carcinomas prostáticos indiferenciados, carcinomas de células escamosas e carcinomas ductais de células de transição, que respondem mal aos tratamentos habituais. O adenocarcinoma apresenta-se macroscopicamente, geralmente como um nódulo duro, único ou múltiplo, de contornos irregulares, sendo de melhor prognóstico os tumores bem diferenciados.
O adenocarcinoma prostático é raro antes dos 50 anos, tornando-se muito frequente a partir desta idade, para atingir o pico de frequência na oitava década de vida.
Este problema de saúde tende a aumentar, devido ao aumento da esperança de vida, já que, actualmente a população com mais de 65 anos aumenta 20 a 25% em cada 10 anos.
O aumento do número de diagnósticos ficou também a dever-se ao doseamento do antigénio específico da próstata (PSA), a partir do início da década de 90.
O cancro da próstata é a segunda causa mais comum de morte por cancro nos homens, em muitos países ocidentais, apenas ultrapassada pelo cancro do pulmão.
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Sintomas

O carcinoma da próstata é geralmente de crescimento lento, sendo por isso assintomático no início. Nas fases seguintes da doença podem aparecer sintomas de obstrução vesical (polaquiúria, disúria, urgências urinárias), hematúria, piúria e por vezes hematoesperma. As metástases surgem geralmente na pélvis, arcos costais e corpos vertebrais podendo originar dores ósseas. Uma próstata endurecida, de consistência pétrea, de superfície irregular, ou um nódulo da próstata palpável no toque rectal sugerem uma neoplasia da próstata.
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Diagnóstico

O homem com queixas urinárias suspeitas de neoplasia da próstata deverá ser submetido a um exame médico que contemple o toque rectal, o doseamento do PSA e uma ecografia prostática preferencialmente trans-rectal. Quando se detectam imagens ecográficas suspeitas, deve efectuar-se uma biópsia dirigida e orientada por ecógrafo.
Na neoplasia da próstata o valor do PSA é geralmente superior a 10 ng/ml, enquanto que valores compreendidos entre 4 e 10 são suspeitos e devem conduzir a uma investigação cuidada 
O carcinoma da próstata produz frequentemente metástases ósseas osteoblásticas que se devem pesquisar, através de exames radiográficos ou cintigráficos, quando existe uma próstata de consistência pétrea. 
Na era pré-PSA, quando o diagnóstico do cancro da próstata era feito com base em sintomas e sinais clínicos, o estádio da doença, na altura do diagnóstico, era relativamente avançado e a sobrevivência global era menor do que a desejável, aparecendo muitos doentes já com metástases.
Os cancros da próstata são frequentemente classificados em três graus. O grau III inclui os que têm uma classificação de Gleason superior a 7, o grau II inclui os que têm uma classificação de Gleason de 5 a 7 e o grau I inclui os que têm uma classificação de Gleason inferior a 5.
No diagnóstico diferencial da neoplasia da próstata deve considerar-se a prostatite crónica, a litíase prostática e a prostatite granulomatosa.
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Toque rectal

O toque rectal deve ser efectuado no exame físico de rotina, num ambiente adequadamente confortável e de garantia de privacidade. Realiza-se com o doente em decúbito lateral com a coxa e a perna que ficam por cima flectidas. Os doentes com próstatas mais volumosas são melhor observados na posição de pé, dobrados sobre a mesa de observação. O doente deve estar relaxado e, nalguns casos, deve solicitar-se que mantenham os pés afastados, apontando os dedos grandes do pé um para o outro, para se evitar a contracção dos músculos das coxas. Deve usar-se sempre uma boa quantidade de gel lubrificante. 
Alguns cancros da próstata, palpáveis no toque, acompanham-se de níveis normais do PSA. No entanto, embora alguns cancros não detectados pelo doseamento do PSA sejam detectados pelo toque rectal, o método laboratorial geralmente permite o diagnóstico da doença numa fase mais precoce.
Calcula-se que cerca de um terço dos homens com mais de 50 anos tenham focos do cancro da próstata, mas que apenas 20 a 25% dos casos se tornam clinicamente evidentes.
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Doseamento do PSA

O doseamento do PSA veio permitir diagnósticos mais precoces de adenocarcinomas da próstata e melhores prognósticos. Com o surgimento do doseamento do PSA, a determinação da fosfatase alcalina deixou de ter significado clínico no diagnóstico e seguimento da neoplasia da próstata, devido à sua pequena especificidade.
A semi-vida do PSA é de 2 a 3 dias, pelo que pode ser necessário esperar entre 2 e 3 semanas para fazer uma determinação do PSA após uma manipulação prostática ou um tratamento.
Cerca de um terço dos doentes com níveis de PSA acima de 4 ng/ml vêm a ter no futuro um cancro da próstata, e entre este número é ainda maior quando se encontram valores de PSA progressivamente mais elevados. 
As análises comparativas do PSA deverão ser feitas no mesmo laboratório, uma vez que existem pequenas diferenças nos reagentes dos vários fabricantes, devendo ser trabalhadas nas primeiras 24 horas após a colheita. Se assim não se fizer, as amostras devem ser conservadas a -20ºC, porque os níveis vão-se reduzindo à temperatura ambiente. 
Nos casos em que o valor do PSA é duvidoso, está indicado o doseamento do PSA livre. Uma relação do PSA livre/PSA total, inferior a 10% é muito sugestiva de neoplasia da próstata.
Os homens com próstatas maiores, por hiperplasia benigna podem também apresentar valores ligeiramente mais elevados do PSA. Este aspecto tem sido corrigido através do cálculo da densidade da próstata. Consiste na divisão do valor total do PSA (em ng/ml) pelo volume da próstata (em ml). Pode ser sobretudo útil em situações de níveis de PSA com valores superiores a 4 ng/ml e inferiores a 10 ng/ml. Outra medição é a velocidade do PSA, a qual mede a variação do valor doseado em função do tempo. Um aumento superior a 0,75 ng/ml por ano tem mostrado ser sugestivo de cancro da próstata.
Os doentes em tratamento com finasteride, por hiperplasia benigna da próstata, geralmente apresentam reduções de cerca de 50% nos níveis de PSA e tem havido algumas preocupações teóricas acerca da possibilidade de isto poder reduzir a detecção precoce do cancro da próstata. Nos doentes a tomar finasteride, a subida dos níveis de PSA deve ser um motivo de preocupação, ainda que os níveis sejam inferiores a 4 ng/ml.
O doseamento do PSA é um bom indicador da resposta à hormonoterapia, permitindo detectar a evolução antes dos 6 meses, ainda antes da primeira evidência clínica, radiográfica ou cintigráfica.
O PSA diminui com a eficácia do tratamento e aumenta de novo no caso de recidiva tumoral.
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Ecografia prostática

A ecografia transrectal é o método de eleição para o diagnóstico das alterações da próstata com pequena expressão volumétrica, pela proximidade à zona periférica. A especificidade da ecografia prostática transrectal é aproximadamente 60%. É uma técnica simples que é tão bem tolerada como o toque rectal.
Este método é um bom guia de punção-biópsia de lesões prostáticas palpáveis e não palpáveis.
Na maior parte dos casos as alterações observam-se na zona periférica da glândula como imagens hipoecogenicas, contudo só 20% das lesões hipoecogenicas são neoplásicas. As neoplasias iso-ecogenicas representam 40%.
Com a utilização da ecografia transrectal, a supra-púbica passou a ser muito menos utilizada. 
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Biopsia
Nos doentes com massas palpáveis, a biópsia é realizada na zona da lesão. As biópsias são efectuadas por via transrectal, orientadas por sonda de ecografia.
Para prevenir infecções, é recomendável fazer uma antibioterapia profiláctica durante os 5 dias que antecedem a biópsia e nos 2 dias seguintes.
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Exames radiográficos e cintigráficos

Os exames radiográficos do esqueleto são os mais utilizados para o despiste de neoplasias ósseas, apresentando-se estas como imagens de condensação difusa. O exame essencial no despiste de metástases ósseas é a cintigrafia óssea com tecnesium 99, que visualiza as anomalias, caracterizadas por uma hiperfixação do isótopo. Quando o valor do PSA é superior a 100 ng/ml é quase certa a existência de metástases.
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Rastreio
O principal fundamento para o rastreio do cancro da próstata baseia-se no facto de que a estratégia mais eficaz, com maior probabilidade de sucesso, é a detecção, o diagnóstico e o tratamento precoces.
O doseamento do PSA veio possibilitar o rastreio, permitindo baixar as taxas de morbilidade e de mortalidade do cancro da próstata.
A Sociedade Americana do Cancro e a Associação Americana de Urologistas apoiam o rastreio através do toque rectal e da determinação do PSA, com início aos 50 anos de idade. O rastreio em idade mais precoce, por volta dos 40 anos, deve ser considerado nos doentes que têm familiares em primeiro grau com cancro da próstata e nos doentes de raça negra, que têm um risco maior de morte.
Os doentes com níveis de PSA entre 4 e 10ng/ml devem ser observados com repetição das análises ou serem submetidos a uma biópsia. É consensual que os doentes com níveis de PSA acima de 10ng/ml devem ser submetidos a ecografia transrectal e biópsia.
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Tratamento
As opções terapêuticas devem ser consideradas com base na esperança de vida projectada dos doentes, dispondo-se das seguintes opções: expectativa armada, cirurgia, radioterapia, hormonoterapia, que poderão ser isoladas ou associadas. Existem algumas terapêuticas em investigação, geralmente utilizadas nos casos avançados e nos resistentes aos outros tratamentos. Quadro I
Não há tratamento curativo para o cancro da próstata em fase avançada. Os doentes com neoplasia da próstata em fase inicial, e que tenham uma esperança de vida que não ultrapasse os 10 anos (homens com 75 anos de idade ou que tenham uma patologia que lhes limite a esperança de vida a menos de 10 anos), poderão não ser submetidos a qualquer terapêutica, uma vez que as possibilidades de morrerem deste cancro são muito reduzidas. Apenas se justificam medidas de vigilância que poderão passar apenas pela medição do PSA com intervalos de 6-12 meses.

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Quadro I

Alternativas terapêuticas nas formas localizadas de cancro da próstata
Observação (expectativa armada)
Cirurgia
Prostatectomia retro-púbica radical
Prostatectomia perineal radical
Prostatectomia conservadora da inervação
Radioterapia
Convencional de altas doses
Tridimensional
Braquiterapia intersticial
Convencional em altas doses mais braquiterapia
Terapêutica hormonal
Isolada
Com cirurgia
Com radioterapia
Terapêuticas em investigação
Criocirurgia
Terapêutica com protões
Terapêutica com neutrões

Vários factores são determinantes na previsão da “cura” do cancro da próstata: os doentes com PSA inferior ou igual a 10 ng/dl, um score de Gleason inferior ou igual a 7, e um tumor com dimensão inferior a 1,5 ml, estão num subgrupo favorável. Por outro lado os doentes com níveis de PSA superiores a 10 ng/dl, ou com score de Gleason superiores a 8, têm pior prognóstico.
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Expectativa armada
O cancro da próstata é uma doença heterogénea pelo que em alguns casos, a não realização de qualquer terapêutica local pode ser uma opção terapêutica correcta.
Uma vez que o cancro da próstata é de evolução muito lenta e aparece geralmente em homens muito idosos, sofrendo doutras patologias que podem ser fatais, torna-se indispensável que o tratamento seja adaptado ao risco vital causado pelo cancro nesse paciente em particular.
Geralmente, esta opção é considerada uma boa alternativa nos doentes com PSA superior a 10 ng/dl, com um score de Gleason de 2 a 4, sem doença palpável no toque rectal e com uma esperança de vida de menos de 10 anos, baseada nas tabelas de sobrevivência adequadas para esse caso.
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Opções cirúrgicas
O cancro da próstata pode “curar-se” pela remoção da próstata e das vesículas seminais, através de uma abordagem retro púbica ou perineal. No caso da doença ser limitada à próstata, a opção de escolha da técnica depende da preferência do cirurgião.
Os níveis de PSA, após a prostatectomia radical, devem aproximar-se de zero. Níveis detectáveis, após a cirurgia, significam a persistência de tecido prostático ou de células neoplásicas. Uma subida dos níveis de PSA, após cirurgia, significa recidiva da neoplasia.
A prostatectomia radical pode acarretar a curto prazo incontinência urinária e, em muitos casos, impotência permanente. Estes problemas surgem mais frequentemente quando se utiliza a prostatectomia radical retropúbica, no entanto a cirurgia com técnicas conservadoras dos nervos reduz estas complicações.
A ressecção transuretral utiliza-se como tratamento paliativo das perturbações miccionais ligadas à obstrução secundária à evolução local da doença, estando geralmente indicada nos estadios mais avançados. Esta ressecção deve ser complementada com outro tratamento apropriado, por ser considerada insuficiente.
A prostatectomia radical e a radioterapia podem beneficiar grupos mais jovens, seleccionados.
As principais complicações da prostatectomia radical são a incontinência urinária e a impotência.
A maioria dos doentes com incontinência pós-operatória volta a ter controlo das micções, mas o tempo que decorre até reaverem a continência é muito variável, podendo oscilar entre algumas semanas e um ano. Três meses após a cirurgia, cerca de metade dos doentes, estão novamente continentes. Os doentes devem ser ensinados a fazer as manobras de Kegel para reforçar o esfíncter e os músculos pélvicos. A incontinência é geralmente considerada pelos doentes como a pior das complicações pós-operatórias da prostatectomia radical, apesar de a maioria acabar por retomar o controlo miccional.
A impotência após a prostatectomia radical está directamente relacionada com a idade do doente e a extensão do tumor. 
Os doentes devem ser informados e tranquilizados, de que a actividade sexual não aumenta os níveis hormonais nem a possibilidade de recidiva do tumor.
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Radioterapia
Em virtude de a próstata ser um orgão profundo e estar envolvido por muitas estruturas delicadas, obriga a técnicas de irradiação muito minuciosas. Geralmente é uma terapêutica bem tolerada e os sintomas irritativos desaparecem 2 a 4 semanas após o final da tratamento. Quando é bem sucedida acompanha-se da redução dos níveis de PSA para níveis normais. 
Os efeitos acessórios agudos são a diarreia, a cistite, a proctite e o mal-estar. Para além destes, poderão persistir efeitos crónicos, como estenose uretral, cistite e impotência sexual.
A braquiterapia intersticial é outra opção possível, para os doentes que têm doença limitada à próstata. Na maioria dos centros médicos, a técnica consiste na colocação de um implante radioactivo (iodo 125 ou paládio 103) na próstata. Esta técnica evita a longa duração da radioterapia externa. Os efeitos acessórios são a uropatia irritativa aguda, a qual vai tendo uma intensidade menor com o passar do tempo. Tal como acontece com a radioterapia externa, as complicações a longo prazo são raras e consistem em cistite ou proctite, numa pequena percentagem dos doentes.
Com qualquer destes dois tratamentos, a potência sexual mantém-se em 50 a 70% dos casos.
As complicações mais frequentes, após radioterapia externa, são as queixas gastrointestinais, incluindo diarreia, rectorragia e sintomas do tubo digestivo alto, principalmente as náuseas e os vómitos. Outra complicação potencial é a disfunção urinária, incluindo a cistite que, geralmente, se manifesta por polaquiúria e urgência miccional.
A radioterapia externa e o acompanhamento sob vigilância são usados especialmente nos homens com mais de 70 anos e nos que apresentam outras doenças significativas concomitantes.
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Tratamento hormonal
- O objectivo essencial do tratamento hormonal é o de se opor à acção androgenica estimulante da próstata, quer pela castração, quer pela administração de agonistas da LHRH, ou pelo recurso a antiandrogéneos.
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Castração
- A castração origina geralmente uma impotência sexual e frequentemente também afrontamentos.
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Estrógenos
- Constituíram durante muito tempo e constituem ainda em alguns casos, o tratamento de eleição do cancro da próstata metastizado.
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Agonistas da LH-RH
- Administram-se geralmente por via intramuscular, habitualmente sob a forma retard, uma vez por mês.
O uso de análogos LH-RH tem vindo a tornar-se na terapêutica endócrina mais comum do cancro da próstata.
O principal efeito acessório associado à terapêutica com análogos LH-RH é a chamada reacção de exacerbação, que consiste num agravamento transitório da sintomatologia tumoral durante a fase inicial do tratamento. Como acontece com as outras terapêuticas hormonais, podem aparecer afrontamentos, redução da libido e impotência.
O tratamento hormonal neoadjuvante consiste em vários meses de castração hormonal, antes de se iniciar a terapêutica regional. Este tipo de tratamento geralmente é reservado para formas avançadas de cancro da próstata (nos casos em que a doença tem extensão para além dos limites da cápsula da próstata ou tecidos peri-prostáticos).
Várias drogas, como por exemplo os anti-androgénios e os agonistas da hormona libertadora da LH, podem ser usados para fazer a castração médica. Após a terapêutica antiandrogénica ter sido completada, pode ser iniciada a terapêutica local com radioterapia externa ou com cirurgia.
Os afrontamentos, que podem ser muito intensos, são o principal efeito colateral da terapêutica endócrina. Para melhorar este sintoma têm sido utilizados vários fármacos, nomeadamente a clonidina, a associação de beladona-fenobarbital-ergotamina, o acetato de mergestrol e doses baixas de estrogénios.
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Avaliação de «follow-up»
- O método fundamental de detecção da recidiva do cancro da próstata é o doseamento do PSA com intervalos regulares. Recomenda-se que este doseamento seja efectuado todos os 3 ou 6 meses, durante o primeiro ou segundo ano após a terapêutica inicial e, depois, anualmente. Após prostatectomia radical, o nível deve ser indoseável três meses após a cirurgia. Nos doentes primariamente tratados com radioterapia, os níveis de PSA descem gradualmente e geralmente atingem o ponto mais baixo um ano após a terapêutica. Nalguns casos, poderão ser necessárias cintigrafias ósseas e outros métodos de imagem, em função dos sintomas do doente.
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Cancro da próstata em fase avançada. Terapêuticas endócrinas e medidas paliativas

O urologista é geralmente o médico que trata os doentes com cancro avançado da próstata. Por vezes é chamado a colaborar o oncologista para instituição de uma terapêutica combinada, continuando o doente a ser seguido pelo urologista
O grau de progressão relativamente lento do cancro da próstata metastizado e a idade avançada dos doentes são factores chave nas decisões a tomar. Os doentes mais idosos e aqueles que têm patologia significativa associada podem ser tratados de forma mais conservadora comparativamente aqueles que têm uma maior esperança de vida.
A terapêutica endócrina é o primeiro meio de tratamento sistémico dos doentes com cancro da próstata com metástases.

Para além do cancro da mama, o cancro da próstata é o único tumor no qual a terapêutica endócrina constitui a principal arma terapêutica. 
Clinicamente, conseguem-se remissões satisfatórias do cancro da próstata metastizado em doentes orquiectomizados ou submetidos a terapêutica com estrogéneos.

Orquiectomia bilateral – No diálogo com os doentes, o termo castração deve evitar-se. Os principais efeitos colaterais são a redução da libido, a impotência e os afrontamentos. Se bem que a orquidectomia bilateral tenha vindo a ser substituída pelo uso dos análogos da LH-RH como primeira terapêutica endócrina, nos casos de cancro da próstata com metástases, continua a ser uma opção viável para os doentes que não se sintam particularmente perturbados por este método. 

Estrógenos – Este tratamento consiste no uso de estrogéneos por via oral, sendo o seu principal mecanismo de acção o efeito de retrocontrolo negativo, ao nível do hipotálamo. Isto leva a uma diminuição da secreção de LHRH, baixando a secreção de gonadotrifinas na hipófise. O resultado é a inibição da produção de androgéneos pelas células de Leydin do testículo. Após cerca de 2 semanas, atingem-se níveis de testosterona semelhantes aos que se encontram depois da orquidectomia.
Os estrogéneos também inibem directamente o metabolismo testicular e aumentam o nível da proteína de transporte das hormonas sexuais, reduzindo desse modo a porção de testosterona livre existente em circulação. 
A terapêutica estrogénica não acarreta a morbilidade psicológica da orquidectomia, mas encontra-se associada a efeitos acessórios importantes, como sendo o aumento do risco de eventos cardiovasculares, acidentes cérebro-vasculares, embolias pulmonares e ginecomastia. 
A supressão dos androgénios é uma terapêutica eficaz em cerca de 75% dos doentes com cancro da próstata metastizados, mas em quase todos os doentes assiste-se ao eventual aparecimento de resistência ao tratamento.
Quando a neoplasia progride, as dores ósseas são o sintoma que mais frequentemente necessita de alívio, beneficiando alguns doentes da terapêutica com bifosfonatos que suprimem a reabsorção óssea. A radioterapia local nas zonas dolorosas associadas com metástases ósseas alivia a maioria dos doentes
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Resumo

A posição actual quanto ao diagnóstico precoce do cancro da próstata é a seguinte: Recomenda-se o toque rectal anual em todos os homens com mais de 50 anos. O doseamento do PSA deve efectuar-se quando existe uma alteração ao toque rectal ou quando o paciente tem factores de risco. A ecografia prostática transrectal está recomendada nos casos de alterações ao toque rectal ou de elevação do PSA. As biópsias ecodirigidas por via transrectal estão indicadas nos casos de alterações ao toque rectal e/ou quando o valor do PSA é superior a 10 ng/ml. 
Na medida em que o médico responsável pelo tratamento dos doentes com neoplasia da próstata é muitas vezes o urologista, o papel do médico de família pode ser o seguimento intercalar, o alívio da dor e o tratamento dos efeitos colaterais das terapêuticas hormonais. Ao estar familiarizado com as principais formas de tratamento sistémico, o médico de família pode também ajudar o doente a tomar decisões terapêuticas que têm de ser individualizadas face às especificidades do estadio da doença, à presença de situações patológicas concomitantes, à idade e ao sistema de valores do doente. 

O doseamento do PSA revela aproximadamente 80% dos cancros da próstata que podem ser clinicamente detectáveis. Assim, cerca de 20% dos homens a quem é diagnosticado um cancro da próstata têm um nível de PSA normal, segundo o valor aceite como limite do normal (4ng/ml).
A especificidade do PSA pode ser aumentada se se conjugarem alguns parâmetros, como a Velocidade de Tendência (um aumento superior a 0,75 ng/ml/ano traduz um risco aumentado); a Densidade do PSA em que uma densidade superior a 0,10 ng/ml é suspeita e a razão do PSA livre/PSA total que quando é inferior a 10% acarreta uma maior probabilidade de cancro. 
É prudente o doseamento do PSA antes de se iniciar a terapêutica farmacológica para a HBP sintomática, uma vez que os fármacos anti-androgénicos, tais como o finasteride, descem o nível do PSA.
Após uma prostatectomia ou radioterapia para o cancro da próstata, recomenda-se o pedido dum doseamento do PSA de 3 em 3 meses durante o primeiro ano, de 6 em 6 meses durante os 2 anos seguintes e, em seguida uma vez por ano.
Apesar de ainda não existir consenso, muitos médicos são a favor do rastreio em massa do cancro da próstata, dada a elevada proporção de cancros da próstata que se apresentam clinicamente localizados quando são detectados através do rastreio, juntamente com as elevadas taxas de sobrevivência específica da doença após a prostatectomia radical.
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