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Parte IV – Problemas clínicos
4.8. Abordagem do paciente com problemas musculo-esqueléticos

295. Osteoartrose
Jorge Morgado

Documento de trabalho
última actualização em Dezembro 2000

Contacto para comentários e sugestões: Nogueira, R;
Silva, Eugénia

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Introdução

A osteoartrose (osteoartrite; doença articular degenerativa) é a forma mais comum de reumatismo e uma das doenças mais prevalentes no ser humano. É um dos principais motivos de consulta em Medicina Geral e Familiar, é uma das principais causas de absentismo ao trabalho e encontra-se intimamente ligada à incapacidade e dependência registada depois dos sessenta anos. A osteoartrose (OA) define-se como:

1. Um conjunto heterogéneo de situações clínicas com características patológicas e radiológicas comuns.
2. Degenerescência da cartilagem articular, acompanhada por uma reacção hipertrófica do osso subcondral e marginal.
3. Alterações radiológicas que incluem estreitamento da interlinha articular, esclerose subcondral e osteofitose marginal.
4. Mais frequente a partir dos quarenta anos, com particular predilecção pelos joelhos, ancas, mãos e coluna vertebral.
5. As manifestações clínicas incluem a dor ao movimento, a rigidez articular após repouso e a diminuição da amplitude dos movimentos.

O tratamento da OA é paliativo e incide no alívio da dor, do desconforto e da incapacidade funcional das articulações atingidas, através de meios farmacológicos, físicos e cirúrgicos.
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A osteoartrose na medicina geral e familiar
A AO é um dos principais motivos de consulta em medicina geral e familiar. Estima-se que afecta 5% a 10% da população em geral e 85% da população com mais de 75 anos. Num estudo feito nos Estados Unidos sobre a OA sintomática do joelho e da anca foi estimada uma incidência de 200/100 000 pessoas/ano. Os factores de risco para a OA podem ser vistos como actuando através de dois mecanismos patogénicos principais:

1. Factores que influenciam a predisposição para a OA:
A Obesidade está principalmente associada à OA dos joelhos, não havendo ainda explicações claras para esta associação.
A Hereditariedade como factor etiológico da OA está associada à variante poliarticular. Parece poder dever-se a uma anomalia do código genético para a síntese do colagéneo.
No sexo feminino a forma poliarticular de OA é predominante, sugerindo a mediação hormonal na sua patogénese. Por isso a prevalência desta forma de OA parece aumentar após a menopausa.
A Osteoporose. Vários estudos indicam a associação negativa da OA com a osteoporose.
A Hipermobilidade devida a laxidão ligamentar aumenta o risco de OA.
Outras Doenças A OA está associada a outras doenças como a diabetes mellitus, a hipertensão arterial, a hiperuricémia, a hemofilia, etc.

2. Factores biomecânicos anormais.
Traumatismos - meniscos e lesões dos ligamentos do joelho estão associados com à OA desta articulação. A fractura do fémur está associada à OA da anca, a da tíbia à OA do tornozelo, a do úmero à OA do ombro e a fractura do escafoide à OA do punho.
Ocupação - O uso repetitivo de articulações inerente a algumas profissões e actividades (desportistas, agricultores, etc.), predispõe ao aparecimento da OA.
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Classificação das OA
A heterogeneidade da OA levou a diversas classificações. As mais úteis em Medicina Geral e Familiar são:

1. Segundo a etiologia
Primárias ou idiopáticas - quando a causa é desconhecida.
Secundárias
Metabólicas - Acromegalia, hemocromatose, hemofilia, etc.
Anatómicas - Doença de Perthes, luxação congénita da anca, síndroma de hipermobilidade, etc.
Traumáticas - Grandes traumatismos articulares, traumatismos articulares crónicos, fracturas articulares e cirurgia articular.
Inflamatórias - Artrites sépticas e outras artropatias inflamatórias.

2. Registo descritivo

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Quadro I
Registo descritivo

 

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Clínica e diagnóstico da osteoartrose

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Quadro II

Sintomas e sinais da osteoartrose
Sintomas
-Ausência de manifestações sistémicas
-Dor ao movimento (dor em repouso nas formas severas)
-Rigidez não superior a 30 minutos, após repouso
-Contratura muscular
-Diminuição da amplitude dos movimentos
-Sensação de instabilidade articular
-Pouco frequente antes dos 40 anos
Sinais
-Dor local
-Tumefacção articular
-Crepitação
-Sinais inflamatórios moderados
-Osteofitos palpáveis
-Deformidade articulares


Características gerais das OA
As características comuns das OA são:
O aparecimento é geralmente lento e insidioso e os doentes não conseguem referir a altura e natureza dos primeiros sintomas. As queixas iniciais referem-se habitualmente a dor difusa e intermitente, relacionada ou imediatamente após o uso da articulação doente. Uma sensação de tumefacção dos músculos envolventes pode ocorrer, assim como uma redução da amplitude dos movimentos.
A dor é o sintoma mais importante da OA. Quase todos os doentes com AO sintomática referem dor relacionada com o uso da articulação afectada, que aparece segundos ou minutos após o início do movimento. Menos de metade dos doentes com OA sintomática refere dor em repouso e aproximadamente 30% referem dores nocturnas.
A OA é frequentemente acompanhada de contractura muscular, o que pode provocar grande dor quando sujeita a traumatismo.
Por via de regra, não há correlação entre a intensidade da dor e os achados radiológicos, sendo frequente encontrarem-se alterações radiológicas importantes em doentes assintomáticos.

Causas possíveis de dor:
1. Aumento da pressão intra óssea.
2. Sinovite.
3. Sindromas periarticulares secundários às alterações provocadas pela OA.
4. Dores musculares
Muitos doentes com OA dizem também ter fraqueza dos músculos que envolvem as articulações afectadas.
Os doentes com OA referem frequentemente sensação de rigidez articular no início dos movimentos. Muitos dizem ter necessidade de «aquecerem» a articulação para melhorarem o seu desempenho. Contrariamente ao que se passa com a artrite reumatóide a rigidez matinal na OA raramente dura mais do que 30 minutos. A rigidez parece dever-se à sinovite que é habitual na OA.
É frequente a redução da amplitude dos movimentos das articulações atingidas pela OA. Esta situação deve-se às alterações anatomopatológicas entretanto surgidas.
A sensação de instabilidade articular (parece que a articulação vai ceder) referida por muitos doentes, não é necessariamente acompanhada de evidência de laxidão dos ligamentos ou de destruição articular significativa. Este sintoma parece dever-se mais ao mau funcionamento muscular do que a anomalias articulares.
Crepitação ao movimento é normalmente sentida nas articulações atingidas por OA, podendo ser audível nos estádios mais avançados da doença. A crepitação articular acompanha toda a amplitude do movimento.
As articulações atingidas por OA apresentam muitas vezes sinais inflamatórios e evidência de destruição articular como por exemplo a deformidade em varo e a instabilidade das articulações.
A perda de função a que a OA conduz é fundamentalmente provocada pela dor, mas factores como a fraqueza muscular e a diminuição da amplitude dos movimentos podem ser importantes.
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Características específicas da OA das diversas articulações
As articulações mais frequentemente atingidas pela OA são os joelhos, as mãos as articulações coxo-femurais e as da coluna vertebral.

OA dos joelhos (gonartrose) - A gonartrose é uma das OA mais frequentes e aquela em que a obesidade parecer ser uma das principais causas. A gonartrose primária é frequentemente bilateral. Geralmente tem uma evolução lenta. Podem encontrar-se afectadas isoladamente, ou em qualquer combinação, as superfícies articulares femuro-tibial interna (75% mais frequente), femuro-tibial externa (26%) e femuro-patelar (48%). Frequentemente aparece a atrofia do quadricípite. Os doentes com gonartrose podem dividir-se em dois grupos principais.
1) Jovens, geralmente do sexo masculino com gonartrose unilateral devido a traumatismo dos joelhos, nomeadamente a lesões meniscais;
2) Pessoas de meia idade ou mais idosas, predominantemente mulheres com factores de risco identificáveis como a obesidade, os joelhos varos, valgos ou recurvados.

Coxartrose - A coxartrose tem uma incidência semelhante em ambos os sexos e frequentemente é atingida apenas uma das articulações. São referidas várias causas locais que predispõem o aparecimento da doença, nomeadamente o aumento do ângulo de obliquidade do tecto acetabular, a coxa vara e a sub-luxação da cabeça femoral. A dor desencadeada pela marcha é o sintoma mais importante. Localiza-se especialmente ao nível da virilha, com irradiação para a face anterior da coxa. No entanto pode ser: 1) Posterior e confundir-se com uma ciatalgia; 2) Surgir na face externa da anca e confundir-se com a dor provocada pela trocanterite; 3) Surgir isoladamente ao nível do joelho o que pode provocar problemas de diagnóstico diferencial com a gonartrose. A rigidez após repouso é frequente e muitos doentes têm dificuldade em se calçarem. A amplitude dos movimentos passivos está diminuída, sendo a rotação interna geralmente o movimento que está mais comprometido. A grande maioria das coxartroses evoluem lentamente, havendo no entanto algumas que se agravam em poucos meses.

OA das mãos - A OA das mão é mais comum no sexo feminino do que no sexo masculino. As articulações interfalângicas distais são as mais frequentemente atingidas, seguindo-se as interfalângicas proximais. A evolução é lenta e as articulações apresentam-se geralmente com um aspecto moderadamente inflamatório, podendo ser muito dolorosas. Mais tardiamente aparecem protuberâncias ósseas características, conhecidas por nódulos de Heberden (nas articulações interfalângicas distais) e os nódulos de Bouchard (nas articulações interfalângicas proximais). Estas articulações podem apresentar também, erosões - OA erosiva. A fusão de articulações interfalângicas com OA erosiva pode ser precipitada pela administração de corticóides injectáveis. A artrose da primeira articulação carpo-metacarpiana (rizartrose) também é mais frequente no sexo feminino, sendo habitualmente muito dolorosa e incapacitante.

OA da coluna vertebral - A maioria das pessoas com mais de 40 anos apresenta alterações radiológicas de OA da coluna vertebral, parecendo fazer parte do processo normal de envelhecimento. A correlação entre os sintomas e os achados radiológicos é baixa, o que dificulta a análise desta doença. A OA das articulações interapofisárias e a degenerescência dos discos intervertebrais são processos diferentes mas intimamente relacionados, coexistindo frequentemente. As «dores de costas» baixas (lombalgias), fixas ou com irradiação, que se agravam com o permanecer sentado ou de pé durante muito tempo, são os sintomas mais comuns da OA vertebral. As dores evoluem geralmente por surtos e podem acompanhar-se de contractura muscular. Quando há compromisso neurológico por compressão das raízes nervosas ou da medula espinal, também são referidas parestesias nos membros inferiores. Esta complicação pode ser muito grave e provocar paraparésia espástica e incontinência dos esfíncteres. O síndroma vertebro-basilar deve-se a uma compressão das artérias vertebrais ou do plexo vertebral simpático que as envolve, devido a prolapsos discais ou osteofitose das articulações unco-vertebrais ou interapofisárias posteriores e provoca cervicalgias, tonturas e vertigens que se exacerbam com os movimentos de lateralidade e extensão do pescoço. A hiperostose vertebral anquilosante é uma forma de OA exuberante que atinge a coluna vertebral e que se caracteriza pela formação de pontes ósseas entre os corpos vertebrais, sendo sistematicamente poupadas as articulações sacro-ilíacas, o que tem interesse para o diagnóstico diferencial desta doença com a espondilite anquilosante.

OA de outras articulações - Outras articulações poderão ser afectadas pela OA, tais como a temporo-maxilar, a esterno-clavicular, a acromio-clavicular, o ombro, o cotovelo e as pequenas articulações do pé.
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Laboratório e imagiologia
Não sendo a OA uma doença sistémica as análises sanguíneas convencionais usadas para detectar inflamação, deficiências imunológicas e alterações metabólicas têm pouco valor diagnóstico. No entanto há numerosos exames que podem se úteis no diagnóstico da OA.

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Quadro III
Exames complementares de diagnóstico na osteoartrose
Técnicas de imagem Radiografia convencional
Macroradiografia
Tomografia axial computurizada
Ultrasonografia
Termografia
Ressonância magnética
Análise do líquido sinovial Células
Partículas (cristais, fragmentos da cartilagem, etc.)
Bioquímica
Artroscopia Visualização da articulação
Histopatologia  

Na OA não complicada as análises são normais, o que ajuda a fazer o diagnóstico diferencial com outras doenças reumatismais. No entanto deve ser lembrado que a OA pode coexistir com outras artropatias. Os exames radiológicos convencionais são os mais fáceis de obter, são os mais baratos e são o mais importante meio de diagnóstico da OA. Um bom radiograma deve ter em conta:
1) um bom contraste, de forma a poderem ser visualizados os tecidos moles e a estrutura trabécular óssea;
2) um número adequado de planos de incidência;
3) o radiograma do joelho deve incluir a incidência com o paciente em carga.

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Quadro IV

Classificação radiográfica da Osteoartrose
Grau Classificação Descrição
0 Normal Sem características de AO
1 Duvidosa Esboço de osteófito, significado duvidoso
2 Ligeira Osteófito, manutenção da interlinha articular
3 Moderada Moderada diminuição da interlinha articular
4 Severa Interlinha articular muito diminuída com esclerose do osso subcondral


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4. Tratamento

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Quadro V

Tratamento da osteoartrose
Deve ser usada uma abordagem progressiva da OA, iniciando-se por medidas educacionais de protecção do aparelho locomotor e só posteriormente os medicamentos ou a cirurgia.
As articulações com OA podem ser protegidas do desgaste excessivo com a perda de peso, o uso de calçado que absorva o choque e outras medidas simples.
Manter a actividade do doente, incluindo das articulações afectadas, assim como a amplitude dos movimentos e o estiramento muscular.
As drogas devem ser usadas quando os sintomas são severos ou persistentes ou ainda para ajudarem a manter a actividade.
A cirurgia é possível para aliviar os sintomas persistentes e graves.

Os objectivos do tratamento da OA são diminuir, ou se possível fazer desaparecer, a dor e o desconforto, melhorar a capacidade funcional, aumentando a mobilidade das articulações atingidas, evitar a atrofia dos músculos adjacentes e prevenir o aparecimento de novas lesões ou o agravamento das já existentes. O doente deve estar consciente de que é portador duma doença crónica, benigna, na maior parte das vezes de bom prognóstico e se, nestes casos, seguir um tratamento adequado pode ter uma vida perfeitamente normal. Uma abordagem multidisciplinar do doente com OA deve ser sempre considerada.
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Quadro VI
Objectivos do Tratamento da Osteoartrose
Educação O doente, os familiares e quem trata do doente devem compreender a situação e saber o que podem fazer para ajudar
Aliviar os
Sintomas
A dor, a rigidez e outros sintomas da OA devem ser controlados o melhor possível, com o menor risco que se conseguir
Minimizar a
Incapacidade
Qualquer diminuição da função ou incapacidade, deve ser minimizada através de técnicas de reabilitação
Limitar a
Progressão
Todos os factores conhecidos que possam piorar a doença devem ser evitados, todas as praticas que levem a evitar o risco de progressão da doença devem ser instituídas, com o mínimo de riscos possíveis.

Educação - A educação do doente, da família e de quem dele trata, deve incluir o ensino simples mas claro do que é a OA, de quais são os factores de risco e como evitá-los. Os doentes deverão aprender as regras de protecção do aparelho locomotor e de exercícios simples para melhorar a sintomatologia.

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Quadro VII

Regras de protecção do aparelho locomotor
Dormir em cama dura de preferência em decúbito dorsal
Não permanecer muito tempo de pé ou sentado
Não sentar-se em sofás baixos e moles
Evitar pegar em objectos pesados
Distribuir as cargas pelos dois membros superiores
Evitar as flexões da coluna vertebral
Usar simples, prático e confortável
Usar sapatos confortáveis com contrafortes resistentes e saltos baixos
Fazer pequenas caminhadas com períodos frequentes de repouso
Não utilizar transportes trepidantes
Ter um plano regular diário de exercícios físicos adequados à sua situação
Evitar posturas incorrectas
Na gonartrose evitar andar de bicicleta, subir e descer escadas


Fisioterapia - Os fisioterapeutas têm um papel importante na educação do doente, levando-o a ter uma atitude positiva perante o seu problema e persuadindo-os de que podem melhorar a sua qualidade de vida de forma significativa. Exercícios isométricos, mobilizações, reeducação dos doentes no uso das articulações atingidas, hidroterapia, dispositivos que limitem transitoriamente a mobilidade articular, etc. são técnicas importantes para a melhoria dos sintomas. As principais contra-indicações para o uso da fisioterapia são a dor intensa à mobilização articular e a destruição acentuada da articulação.

Terapia Ocupacional - tal como o fisioterapeuta, o terapeuta ocupacional tem um papel importante na educação do doente com OA. As técnicas de protecção do aparelho locomotor e relaxamento podem ajudar o doente com OA, particularmente os que têm dores intensas quando usam as articulações e nos doentes ansiosos. O terapeuta ocupacional pode ajudar significativamente os doentes com deficiência devido a OA com a aplicação de talas, ortoteses e ainda com adaptações do ambiente e treino na melhoria das actividades de vida diária.

Drogas - As drogas usadas na OA são principalmente os analgésicos, os anti-inflamatórios não esteróides (AINE), os corticóides, os relaxantes musculares e os condroprotectores. Os analgésicos como o paracetamol, o diflunisal, a clonixina e outros são usados principalmente em doentes com dores moderadas e ocasionais, ou quando os AINE estão contra-indicados. O uso de analgésicos de acção central é controverso, só devendo ser iniciado depois da falência das outras terapêuticas. Os AINE são os fármacos mais usados para tratar a OA. Os AINE são eficazes no controlo da dor e rigidez da OA, tanto quando tomados por curtos períodos como numa base de terapêutica «permanente», No entanto os efeitos secundários destas drogas devem ser tidos em conta, em especial quando prescritos a pessoas idosas. Deve ser sempre monitorizada a função renal e hepática, o hemograma e estar atento às possíveis lesões do aparelho digestivo. Não há diferenças significativas quanto à eficácia dos vários AINE, pelo que a prescrição deverá ter em conta principalmente os efeitos secundários. Os AINE que inibem selectivamente a COX2 parecem ser mais seguros do que os não selectivos.
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Quadro VIII

Recomendações
A droga a iniciar o tratamento da OA deve ser o paracetamol (4 g/dia)
Se o paracetamol não produzir efeitos satisfatórios deverá ser substituído pelo ibuprofeno - o AINE com menor risco de utilização (1,2 g/dia)
Se o alívio dos sintomas for inadequado, a dose do paracetamol pode ser aumentada (> 4g/dia), ou a do ibuprofeno (até 2,4 g/dia) ou associar-se estes dois fármacos.
O doente deve ter conhecimento do risco potencial de efeitos secundários dos AINE, antes do início ou quando se muda o tratamento, assim como das interacções medicamentosas e com o álcool.
O tratamento prolongado com AINE e analgésicos deve ser reavaliado com regularidade (pelo menos semestralmente).
Os doentes devem ser encorajados a usar o tratamento "só quando necessário".
O médico deve estar atento à possibilidade do doente poder estar, inadvertidamente a ingerir simultaneamente vários AINE.
Ainda não foi demonstrada, com base na evidência, o efeito terapêutico dos AINE de aplicação tópica.
A profilaxia de rotina dos efeitos gastrintestinais dos AINE não é adequada aos doentes com OA. No entanto o uso de medicamentos protectores do aparelho gastrintestinal está indicado nos doentes com risco de lesão digestiva, ou nos que apresentam dispepsia.
O médico deverá estar especialmente atento aos doentes que consomem AINE e: tenham antecedentes de doença péptica ulcerosa ou de intolerância aos AINE; usem anticoagulantes, aspirina e corticoides; abusem de álcool; história de hepatite, cirrose ou alcoolismo; insuficiência cardíaca congestiva, síndroma nefrótico ou doença crónica do parênquima renal (p.ex. nefropatia diabética); broncoconstrição.


Os corticóides como agentes anti-inflamatórios potentes têm aplicação na OA, mas têm muitos efeitos adversos pelo que devem ser usados especialmente em administração intra-articular nos surtos agudos de AO, situação em que há um componente inflamatório importante, garantindo um efeito de "ponte", isto é, proporcionando um alívio sintomático até que outros fármacos iniciem o seu efeito. As articulações que mais frequentemente são sujeitas a este procedimento são o joelho, ombro, punho e tíbio-társica. Não devem ser infiltradas simultaneamente várias grandes articulações devido à possibilidade de supressão do eixo hipotálamo-hipófise-supra-renal. Os corticóides mais usados são a betametasona, metilprednisolona e prednisolona. Os relaxantes musculares são usados quando a contratura muscular é um factor importante na génese da dor ou contribui para o seu agravamento. As drogas de acção lenta ou modificadoras da OA, ainda em investigação dividem-se em dois grupos:
1- sintomáticas como o complexo glicosaminoglicanos, o polisulfato de glicosaminoglicanos, o sulfato de glicosamina e outros, que melhoram a dor e a função articular;
2 - modificadoras da doença, como a cloroquina, a hidroxicloroquina, a doxiciclina, a diacereína (já comercializada) e outras que previnem, retardam ou revertem o processo osteoartrósico.

Cirurgia - Há muitos procedimentos cirúrgicos disponíveis para o tratamento da OA sendo geralmente aplicados na OA avançada, refractária a outras terapêuticas. O tratamento cirúrgico visa reparar a cartilagem, corrigir desalinhamentos articulares, ou uma abordagem mais radical como o artrodese e sobretudo a artroplastia. A artrodese usa-se preferencialmente em articulações em que a perda de mobilidade não é problemática (tibiotársica, subastragaliana). As artroplastias totais da anca e as osteotomias, sobretudo para realinhamento das articulações a nível do joelho são de primordial importância para que muitos doentes evitem a cadeira de rodas e melhorem significativamente a sua qualidade de vida.

Outras terapêuticas - A utilização de águas termais, principalmente as sulfúricas, têm-se mostrado úteis no alívio das dores dos doentes com OA. Em contrapartida, a acupunctura e a estimulação nervosa transcutânea não têm produzido bons resultados.
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Pontos práticos a reter
A OA é um conjunto heterogéneo de situações clínicas, com características patológicas e radiológicas comuns.Os principais sinais e sintomas são:
1) a dor, principalmente provocada pela utilização das articulações atingidas;
2) a rigidez após repouso;
3) a diminuição da amplitude dos movimentos;
4) degenerescência da cartilagem acompanhada de uma reacção hipertrófica do osso subcondral;
5) diminuição da interlinha articular;
6) maior incidência a partir dos quarenta anos em ambos os sexos.
Os doentes devem estar conscientes de que são portadores de uma doença crónica, benigna, na maior parte das vezes de bom prognóstico e se seguirem um tratamento adequado podem ter uma vida perfeitamente normal.
Os objectivos do tratamento da OA são diminuir, ou se possível fazer desaparecer a dor e o desconforto, melhorar a capacidade funcional, aumentando a mobilidade das articulações atingidas, evitar a atrofia dos músculos adjacentes e prevenir o aparecimento de novas lesões ou o agravamento das já existentes.

A abordagem do doente com OA deve ser progressiva

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Quadro IX

Medidas a desenvolver com todos os doentes com OA
Educação, aconselhamento, tranquilização acerca da benignidade da doença
Ensino de exercícios apropriados para a manutenção da mobilidade articular e da força muscular


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Quadro X

Medidas a desenvolver com alguns doentes com OA grave
Ensino de técnicas de protecção das articulações; rever funções/disfunções
Ajudas técnicas de compensação das incapacidades (alteração do calçado, bengalas, etc.)
Administração de analgésicos para combater a dor (paracetamol)
Início descontinuado de AINE


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Quadro XI

Medidas a desenvolver com a minoria dos doentes - doença severa
Aplicação de meios físicos para alívio dos sintomas
Corticoides intra-articulares
Sinovectomia química
Cirurgia

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