índice parcial
Parte IV – Problemas clínicos
4.8. Abordagem do paciente com problemas musculo-esqueléticos

296. Osteoporose
Laura Marques

Documento de trabalho
última actualização em Dezembro 2000

Contacto para comentários e sugestões: Nogueira, R;
Silva, Eugénia


A osteoporose é uma doença sistémica, do esqueleto caracterizada por uma diminuição da massa óssea e alteração da microarquitectura do tecido ósseo, com o consequente aumento da fragilidade do osso e maior risco de fractura.
O risco de fractura correlaciona-se com a densidade mineral óssea (B.M.D.) medida pela densitometria radiológica (DEXA). Um Comité de Peritos da Organização Mundial de Saúde a estabelecer uma definição densitométrica da osteoporose. Assim, há osteoporose quando a B.M.D. é inferior a – 2,5 desvios padrões (D.P.) em relação a uma população jovem normal do sexo feminino (T-Score). Se a B.M.D. é inferior a – 2,5 D.P., em relação ao Score T, e se, para além disso, há, pelo menos, uma fractura, a osteoporose é grave. Diz-se que há osteopenia quando a B.M.D. está compreendido entre –2,5 D.P. e –1 D.P. em relação ao ScoreT; e que é normal quando a B.M.D. é superior a –1 D.P. em relação a uma população jovem saudável do sexo feminino. 
A prevalência da osteoporose é difícil de calcular em virtude de variar de país para país e, no mesmo país, de região para região, facto a que não são alheios factores genéticos e ambientais. As previsões apontam para um marcado agravamento deste problema ao longo das próximas décadas devido ao aumento previsível da população mundial e, também a uma previsível maior esperança média de vida.
1
Fisiopatologia e causas da osteoporose
A remodelação do osso (formação e reabsorção) é um processo contínuo; a osteoporose resulta da incapacidade de atingir uma massa óssea óptima antes dos 30 anos de idade ou do facto da velocidade de reabsorção óssea ultrapassar a de formação após se ter alcançado uma massa óssea máxima.
As vértebras, os punhos, as ancas, os úmeros e as tíbias estão particularmente sujeitos a fractura nestes casos.
A osteoporose classifica-se em primária e secundária. A osteoporose primária, por sua vez, subdivide-se em osteoporose pós-menopáusica, ou tipo I, e osteoporose senil, ou associada ao envelhecimento, também denominada tipo II.
A osteoporose tipo I ou pós-menopáusica, surge entre os 50 e os 60 anos de idade, é muito mais frequente nas mulheres do que nos homens (6:1) e origina, sobretudo, uma perda desproporcionada de osso trabecular o que leva a uma maior prevalência de fracturas a nível das vértebras. É devida à deficiência de estrogénios que surge na menopausa e que leva a um aumento da reabsorção óssea e, consequentemente, a um balanço de cálcio negativo, o qual, por sua vez, conduz a uma diminuição da secreção da hormona paratiroideia, diminuição da produção de 1-25 dehidrocolecalciferol, diminuição da absorção intestinal do cálcio e, de novo, balanço negativo. Os seus factores de risco incluem raça branca, baixa estatura, estilo de vida sedentário e tabagismo.
A osteoporose tipo II, ou do envelhecimento, que ocorre em homens e mulheres acima dos 65 anos embora ligeiramente mais frequente no sexo feminino, atinge, tanto o osso esponjoso como o osso cortical e, associa-se quer a fracturas vertebrais quer a fracturas da anca.
A causa principal da osteoporose do envelhecimento é o hiperparatiroidismo secundário, devido à diminuição de absorção intestinal do cálcio que surge depois dos 65 anos, e que leva a um aumento da reabsorção óssea. Esta osteoporose do envelhecimento é ainda, devida a uma diminuição da actividade dos osteoblastos e subsequentemente, da osteoformação.
A osteoporose secundária tem múltiplas causas, como sejam a imobilização, as alterações da nutrição, as doenças endócrinas, as doenças hematológicas, as doenças gastroenterológicas, as doenças neurológicas, as doenças respiratórias crónicas, as doenças reumáticas, as doenças infiltrativas, as doenças hereditárias e as doenças iatrogénicas. Tem a particularidade de originar fracturas em idades mais jovens do que a osteoporose primária.
A osteoporose secundária à imobilização, é devida, por um lado à diminuição da actividade dos osteoblastos, levando a que uma maior osteoformação, e, por outro lado, a um aumento da actividade dos osteoclastos conduzindo a um aumento da reabsorção óssea. Ao contrário da osteoporose dos indivíduos que têm uma vida sedentária, instala-se muito rapidamente e é muito intensa, atingindo perdas de 30 a 40% da massa óssea ao fim de alguns meses, que não é irreversível visto prevenir-se com a realização de exercícios físicos isométricos e isotónicos.
2
Clínica da Osteoporose
Na osteoporose primitiva a composição do osso é normal, havendo apenas uma redução da massa óssea, o que a torna diferente de outras doenças em que há anormalidade da composição mineral óssea, como, por exemplo, na osteomalacia, em que há um deficit de mineralização da matriz proteica. É uma doença assintomática até que se dê a primeira fractura do colo do fémur ou vertebral. Quando há fracturas vertebrais, únicas ou múltiplas, altera-se a biomecânica da coluna com consequentes alterações das curvaturas da mesma (hipercifose dorsal e hiperlordose lombar), surgindo então, dores crónicas com ritmo mecânico e diminuição da estatura. As fracturas vertebrais ou do colo do fémur traduzem-se, clinicamente, em dor aguda e, no caso de fractura da anca, em dificuldade ou impossibilidade para a marcha. Estas fracturas podem ocorrer, em estádios evoluídos da doença, com traumatismos mínimos como movimentos súbitos de inclinação, levantamento de pesos ou salto.
Do ponto de vista laboratorial os níveis de cálcio, fósforo e fosfatase alcalina são normais podendo, haver uma velocidade de sedimentação elevada e hipercalciúria aquando da ocorrência de uma fractura.
Os estudos radiológicos revelam diminuição de cerca de 30% da densidade óssea; as vértebras tornam-se progressivamente mais bicôncavas e podem visualizar-se as fracturas por compressão.
Dos vários métodos, sensíveis e específicos de medição da massa óssea e avaliação do risco de fractura, a absorção de dupla radiação X (Dexa)- Densitometria Óssea- é actualmente, a técnica mais utilizada visto ser simples, precisa, reprodutível, analisar o osso trabecular e esponjoso e utilizar uma radiação desprezível. Os locais mais frequentemente estudados são a coluna lombar e o colo do fémur. 
O diagnóstico da osteoporose primitiva é sempre um diagnóstico de exclusão 
não podendo ser efectuado sem eliminar outras causas de osteoporose, nomeadamente um mieloma múltiplo, uma osteomalacia, uma metástase vertebral de um carcinoma e um hiperparatiroidismo.
Na osteoporose secundária a clínica está intimamente relacionada com as doenças que a causaram. Por exemplo no hipogonadismo feminino vai haver amenorreia e secura da vagina, podendo haver involução dos caracteres sexuais secundários, como atrofia mamária.
Na anorexia nervosa vão haver sinais de má nutrição, amenorreia (a magreza e o hipoestrogenismo são os factores que levam à perda da massa óssea e à fractura osteoporótica).
No homem, as principais causas de hipogonadismo incluem o eunucoidismo, a orquiectomia associada ou não à cirurgia prostática, a síndroma de Klinefelter e o atraso da puberdade.
A fisiopatologia e a clínica da osteoporose do homem são idênticas à da mulher apresentando apenas algumas diferenças que incluem;
1. As fracturas osteoporóticas serem menos prevalentes no homem (estimam-se que apenas 30% das fracturas do colo do fémur, em todo o mundo, ocorrerem no homem e que a prevalência das fracturas vertebrais seja metade da verificada no sexo feminino).
2. A menor prevalência das fracturas osteoporóticas no homem estar relacionada com diversos factores como o maior pico de massa óssea, a menor perda de massa óssea ao longo da vida, os dados antropométricos e o exercício físico.
3. A osteoporose no homem, ser sobretudo devida ao facto da formação não compensar a reabsorção óssea
4. Dada a clara associação da osteoporose no homem com o hipogonadismo, deve efectuar-se, nos doentes osteoporóticos do sexo masculino, um estudo da função testicular determinando os níveis de testosterona e da hormona luteinizante.
5. Contribuírem, igualmente, para a osteoporose do homem, os hábitos alcoólicos e tabágicos mais pesados no homem do que na mulher, se bem que se assiste, no Ocidente, a uma inversão parcial destes hábitos com os homens a fumarem cada vez menos e as mulheres cada vez mais.
6. Enquanto na mulher, a terapêutica hormonal de substituição com os estrogénios é eficaz e está bem demonstrada, sobretudo nos primeiros anos que se seguem ao inicio da menopausa, no homem mesmo com hipogonadismo, a eficácia da terapêutica hormonal de substituição com testosterona é modesta e pode acompanhar-se de vários efeitos adversos, sobretudo sobre a próstata.
7. As diferentes terapêuticas não hormonais da osteoporose (calcitonina, bifosfonatos e outro) têm sido pouco estudadas em populações osteoporóticas masculinas.
3
Prevenção e tratamento da osteoporose
O facto da osteoporose e das fracturas osteoporóticas serem uma das principais causa de morbilidade e de mortalidade nos indivíduos idosos, sobretudo nas mulheres, tem levado a que nos últimos anos, a prevenção e tratamento da osteoporose tenha sido bastante estudada. A nutrição, o exercício físico e os estilos de vida saudável são fundamentais no tratamento e sobretudo, na prevenção da osteoporose sendo tanto mais importantes quanto mais cedo forem iniciados no decurso dos anos que constituem a vida. Com efeito, há hoje numerosas evidências de que a adopção de comportamentos saudáveis na infância vai desfechar num mais alto pico de massa óssea no fim da maturação do esqueleto constituindo um capital ósseo, de enorme importância, para os anos que se vão seguir de perda de massa óssea, atrasando, ou mesmo prevenindo, a fractura osteoporótica. Até há pouco tempo, os estrogénios (orais ou transdérmicos) eram o único fármaco disponível e especificamente aprovado na prevenção da perda óssea após a menopausa. Posteriormente o modulador selectivo dos receptores de estrogénios, raloxifeno (60mg/dia), foi adicionado a esta lista. Para além destes, o alendronato na dose de 5 mg/dia/per os foi igualmente aprovado para a prevenção da osteoporose.
As terapêuticas da osteoporose não farmacológicas consistem em suplementos de cálcio e de vitamina D. O cálcio existe em vários alimentos; no entanto, podem adquirir-se suplementos de cálcio. O suplemento da dieta com vitamina D tem principalmente indicação em idosos internados e em doentes com má nutrição e má absorção visto a sua deficiência ser rara em doentes com dietas saudáveis e que estão expostos ao sol.
Dentre as terapêuticas disponíveis com indicação no tratamento da osteoporose sobressaem os estrogénios, a calcitonina de salmão(50-100 unidades 3 vezes por semana ou 200 unidades por dia) e o alendronato(10 mg/dia em jejum).
Existem outras terapêuticas aprovadas pela FDA, mas nenhuma delas tem a indicação específica para a osteoporose. Estão entre estas os metabolitos da vitamina D, calcifediol e calcitriol, o etidronato e o citrato de tamoxifeno.

4
Bibliografia
Baynes K, Compston J. UPDATE. Osteoporose Induzida por Glicocorticóides. 1998 (15 Abril): 24-7.

Carolino J. Osteoporosis. American Family Physician. 1998(6); 57: 1293-98.

Clearihan L. Osteoporosis. Australian Family Physician. 1997(2); 26: 9.

Dawson-Hugles B, Harris SS, Krall EA, Dallal GE. Effect of Calcium and Vitman D Supplamentation on Bone Density in Men and Women 65 Years of Age or Older. N. Engl. J. Med. 1997: 337: 670-6.

Isenbarger WD, Chapin LB. Osteoporose. Opções Farmacológicas para a Prevenção e Tratamento. Posgraduate Medicine. 1998(2); 9: 52-60.

Joseph P.Huglhes D. Osteoporosis Guidelines for General Practitioners. Australian Family Physician. 1997 (10); 26: 1181-96.

Kleerekoper M. Detecção e Tratamento da Osteoporose. Posgraduate Medicine. 1999 (Março); 11(3): 11-20.

Maclennan A. Osteoporosis in Menopause and Beyond. Australian Family Physician. 1997 (February); 26: 123-31.

Mcknight A, Steelek, Mills K, Gilchristc, Taggart H. Bone Mineral Density in Relation to Medical and Lifestyle Risk Factors for Osteoporosis in Premenopausal, Menopausal and Postmenopausal Women in General Practice. British Journal of General Practice. 1995 (June); 45: 317-20.

Mykyta L J. The Consequences of Osteoporosis in the Elderly. Australian Family Physician. 1997; 26: 115-21.

Peter SM, Clifford JR, Kenneth HJ. Osteoporotic Vertebral Fractures in Postmenopausal Women. American Family Physician. 1997(6); 55: 1315-22.

Queiroz M V. Osteoporose. Lidel Edições Técnicas. 1998 (Fevereiro).

Reid IR. Establishing Healthy Bones in the Young. 1997 (February); 26: 132-4.

Sambrook P. Diagnosing Osteoporosis. The key Issues. Australian Family Physician. 1997 (February); 26109-12.

Seeman E. Do Men Suffer with Osteoporosis? Australian Family Physician. 1997; 26: 135-43.

Seeman E. Osteoporosis: Trials and Tributation. The American Journal of Medecine.1997 (18); 103: 74s-89s.

Wolman RL. Osteoporosis and Exercise. BMJ. 1994 (August); 30: 400-3.