1
Introdução
Existe crescente evidência de que a optimização do controlo metabólico pode reduzir a incidência de retinopatia, nefropatia e neuropatia quer na diabetes tipo 1 quer na diabetes tipo2. Afim de obter e manter um bom controlo glicémico na diabetes tipo 2 cerca de 5-10% dos diabéticos devem iniciar terapêutica insulínica. Esta alteração terapêutica, em geral bem aceite nos casos sintomáticos, é em regra adiada nos diabéticos com queixas menos pronunciadas. Esta atitude dos clínicos, pode ser explicada, em parte, pela ansiedade em reduzir a “qualidade de vida” dos diabéticos com o inicio do uso de terapêutica injectável, percepção que é contrariada em vários estudos, onde a melhoria do controlo glicémico influenciou positivamente a qualidade de vida através da diminuição dos sintomas. A importância da influência da educação terapêutica, da empatia dos educadores e a experiência de que a terapêutica com insulina é mais fácil do que o esperado, quer pelos diabéticos, quer pelos profissionais, é confirmada nos mesmos estudos.
A Insulina é uma molécula proteica segregada normalmente pelas células
ß do pâncreas. Necessita ser administrada exogenamente nos diabéticos, dela necessitados para o seu equilíbrio metabólico, por ser destruída pela acção do pH gástrico.
Actualmente é utilizada a insulina designada como humanizada (com aminoácidos e sua sequência, semelhante à humana). As modificações galénicas da insulina alteram-lhe a farmacocinética, permitindo conseguir-se esquema posológicos que se assemelhem à insulinemia resultante da produção endógena normal.
Apenas existe uma formulação na forma de solução cristalina susceptível de ser administrada por via endovenosa (IV) e nas bombas de perfusão de insulina, para além das vias intramuscular (IM) e subcutânea (SC). As suspensões de insulina só podem pois ser administradas por via SC.
A insulina lispro é um análogo da insulina humanizada, da qual difere pela inversão da sequência dos aminoácidos 28 (prolina) e 29 (lisina) da cadeia
ß. Este facto permite que a molécula se dissocie directamente de hexâmeros a monómeros com fraca capacidade de reassociação (contrariamente à insulina), pelo que apresenta um mais rápido início e menor duração de acção, menor risco de hipoglicemia e melhor perfil glicémico postprandial.
As principais diferenças cinéticas entre as insulinas são:
- velocidade de início de acção;
- tempo para atingir o pico de acção;
- duração de acção.
De acordo com estas diferenças as insulinas caracterizam-se em:
- Acção rápida.
- Acção intermédia.
- Acção prolongada.
- Acção mista (associação de insulinas de acção rápida e intermédia).
2
Acções farmacológicas
A insulina e o potássio ao ligarem-se à glicose permitem a sua entrada para a célula e a sua disponibilidade para ser catabolizada com produção de energia sob a forma de ATP. Outro dos efeitos da insulina é a possibilidade conferida à glicose para ser armazenada no fígado e no músculo sob a forma de glicogénio, que será posteriormente utilizado em períodos de maior consumo energético e de baixo valor da glicemia.
A insulina é também fundamental para a formação dos lípidos e das proteínas a partir da energia resultante do catabolismo glucídico. Esta acção sobre os tecidos dela dependentes permite a manutenção de valores de glicemia estáveis nos tecidos não dependentes da insulina de que a célula cerebral é paradigma.
3
Farmacocinética
O início e a duração da acção da insulina são função do tipo de insulina, da preparação, da via de administração e de variáveis individuais, como a presença de anticorpos anti-insulina.
Absorção
Após administração subcutânea (SC), a insulina é absorvida, sob a forma de monómeros, para a circulação sanguínea através da via linfática. Sabe-se que podem existir variações na velocidade de absorção de 25% a 50% intra e inter individual, na velocidade com que se desdobra e sai do local da injecção SC, que é altamente irregular e dependente do tipo de insulina e de outros factores.
Metabolismo
É primordialmente hepático e em menor percentagem, pode sofrer metabolismo renal, muscular e no tecido adiposo (30%).
Eliminação
A remoção esplâncnica e renal é independente da glicemia e é tanto maior quanto mais elevada for a insulinemia. A insulina, após filtração glomerular renal, é reabsorvida ou destruída parcialmente nos tubos proximais, numa percentagem de 98%. Cerca de 40% do teor de insulina é reabsorvido e volta à circulação. Os restantes 60% são metabolizados (Quadro
I).4
Quadro I
Factores condicionantes do início e da duração de acção da insulina |
Via de administração
|
É mais rápido para IV > IM > SC.A cinética da via intranasal é semelhante à da IV (início de acção mais rápido e duração de acção inferior).
|
Função renal
|
A IR reduz a depuração e pode prolongar e intensificar a acção da insulina exógena.
|
Função da tiróide
|
O hipertiroidismo aumenta a depuração reduzindo a duração da acção da insulina, dificultando o controlo. A estabilização do doente depende do seu estado tiroideu.
|
Anticorpos
Anti-insulina |
Ligam-se à insulina à medida que é absorvida e libertam-na lentamente, atrasando o início da acção e/ou prolongando o seu efeito.
|
Enzimas subcutâneas
|
Doentes que possuam enzimas subcutâneas (raro) de degradação da insulina são resistentes à terapêutica SC, respondendo à IV.
|
5
Factores condicionantes da farmacocinética
As interferências resultam de alterações na absorção, metabolismo e eliminação. Quanto maior a dose mais rápida a sua absorção para além do tipo (a insulina regular é a mais "rápida") (Quadros
II e III)
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Quadro II
Factores que afectam a absorção SC da insulina
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Aumentam a absorção
|
Diminuem a absorção
|
exercício físico (sobretudo na 1ª hora)
|
frio
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massagem calor
|
hipoglicemia
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cetoacidose
|
tabagismo (vasoconstrição?)
|
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Quadro III
Características que interferem com a absorção
|
Características da insulina que aumentam a absorção
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- grau de solubilidade da insulina
- quanto mais elevada é a dose administrada maior é a intensidade e eventualmente a duração do efeito.
|
Local da Injecção
|
- a absorção é mais rápida a partir da injecção na região abdominal, seguindo-se a região deltóide, a nádega e a coxa por último
|
8
Características diferenciais entre as formulações
As insulinas de acção rápida são soluções e destinam-se a iniciar o seu efeito imediatamente após a injecção. São injectadas antes de uma refeição e actuam como um bólus, durante a digestão.
A insulina de acção intermédia permite, com 2-3 injecções diárias, um equilíbrio metabólico para diabéticos do tipo 1, com uma vida regular ou para diabéticos tipo 2. A sua actividade manifesta-se por mais de 12 horas.
A insulina de acção prolongada (suspensão) mimetiza a produção basal de insulina normal. Injecta-se uma vez por dia, porque o seu efeito é de longa duração.
A concentração de todas as insulinas existentes no mercado Português é de 100 Ul/ml.
Aspectos da insulina
- Solução - Insulina de acção rápida
- Suspensão - Insulinas de acção lenta e intermédia
As suspensões requerem uma agitação cuidadosa antes de se retirar a quantidade a injectar. Esta agitação não deve permitir a formação de espuma, que dificulta a medição de um volume rigoroso e pode destruir a integridade da molécula, alterando a sua eficácia (Quadro
IV).
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Quadro IV
Insulinas disponíveis
|
Designação
|
Apresentação
|
Aspecto
|
Início de acção
|
Pico de acção
|
Duração de acção
|
Preço por UI ($) (1999)
|
Regular*
|
Actrapid® Humulin
|
Frasco/ recarga*
|
solução cristalina
|
15-30 min
|
2h
|
6-8 h
|
0.2892/ 0.3373§
|
Regular® Isuhuman
|
Frasco/ recargas
|
0.233/ 0.326§/
0.347# |
Rapid®
|
Frasco/ recarga
|
0.262/ 0.474# |
Intermédia*
|
com zinco
|
Monotard®
|
Frasco (5 e 10 ml)
|
suspensão
|
1,5 h
|
6-8 h
|
22 h
|
0.274
|
Humulin lenta®
|
0.233
|
com protamina
|
Insulatard®
|
frasco/ recarga
|
suspensão
|
1,5 h
|
4 h
|
18 h
|
0.278/ 0.442§
|
Humulin NPH®
|
frasco/ recarga
|
0.236/ 0.424§ /
0.353# |
Isuhuman Basal®
|
frasco/ recarga
|
0.252 / 0.474#
|
Insulatard Novolet®
|
seringa pré-cheia descartável
|
0.439
|
Misturas *
|
rápida+protamina
|
Humulin M1®
|
frasco/ recarga
|
suspensão
|
15-30 min
|
2-4 h
|
18 h
|
0.237/ 0.414§
|
Humulin M2®
|
frasco/ recarga
|
0.237/ 0.414§ /
0.353# |
Humulin M3®
|
frasco/ recarga
|
0.237/ 0.414§ /
0.353# |
Humulin M4®
|
frasco/ recarga
|
0.237/ 0.414§
|
Isuhuman Combi 25®
|
frasco/ recarga
|
0.262 / 0.474#
|
Mixtard 10®
|
recarga
|
0.421§
|
Mixtard 20®
|
recarga
|
0.421§
|
Mixtard 30®
|
frasco/ recarga
|
0.2897/ 0.442§
|
Mixtard 30 Novolet®
|
seringa pré-cheia descartável
|
0.439
|
Mixtard 40®
|
recarga
|
0.421§
|
Mixtard 50®
|
recarga
|
0.421§
|
Prolongada*
|
Humulin Lenta®
|
frasco
|
suspensão
|
4-6 h
|
12-24 h
|
30 h
|
0.236
|
Humulin Ultralenta®
|
frasco
|
0.236
|
Ultratard®
|
frasco
|
0.278
|
Análogos
|
Lispro®
|
recarga
|
solução cristalina
|
15 - 30 min
|
1h |
4h
|
|
§ recargas de 1.5 ml e # 3 ml; * todas HM “humanizadas” e com concentração de 100 U/ml
10 A injecção
A limpeza da área de injecção é desnecessária em doentes com uma boa higiene; caso contrário, deve ser feita com álcool a 70º ou éter.
A injecção subcutânea deve ser feita numa prega cutânea da área a injectar. A agulha deve ser inserida rapidamente, na perpendicular (90º), no centro da área após o que se procede à injecção.
Locais de injecção
A insulina é administrada habitualmente por via subcutânea (SC), havendo toda a conveniência de se proceder à rotação do local da injecção, para evitar o as lipodistrofias cutâneas que irão alterar a absorção (condensações lipídicas no local da injecção que alteram a velocidade de absorção ou atrofia de gordura com aspecto de depressões cutâneas por desaparecimento lipídico).
Técnicas de administração
Após a introdução da agulha na pele e antes da injecção, o êmbolo da seringa deve ser puxado ligeiramente para trás, para que haja a certeza de que não se atingiram vasos sanguíneos durante a introdução da agulha (Quadros 5 e 6). Aplica-se posteriormente uma certa pressão na área da injecção, com ou sem algodão embebido em álcool e sem massajar.11
Quadro V
Instrumentos de injecção de insulina
|
SERINGA
As seringas que existem no mercado nacional são de O,5 cc correspondentes a 50 UI de insulina ou de 1 cc que corresponde a 100 UI de insulina. A graduação, em UI, da seringa está adaptada à concentração de insulina.
|
CANETA INJECTORA
A cada unidade da caneta corresponde 1 UI de insulina a 100 Ul/ml. Método prático, que corresponde a uma modificação das seringas, em que as doses são facilmente medidas e injectadas. Deve esperar-se uns segundos, após injectar para que a insulina não recolha ao frasco devido ao vácuo do êmbolo. Algumas estão mesmo adaptadas para a utilização por invisuais.
|
12
Quadro VI
Agulhas e seringas para injecção de insulina (Protocolo da Diabetes)
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Agulhas
|
marca
|
tipo
|
tamanhos
|
Omnican-MINI®
|
para as canetas da Lilly e Novo
|
8mm e 12mm
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Omnican-H-Mini®
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para a caneta da Aventis (Hoescht)
|
8mm e 12mm
|
BD®
|
para as canetas da Lilly e Novo
|
5mm
|
BD®
|
para a caneta da Aventis (Hoescht)
|
5mm
|
Seringas
|
BD®
|
Agulha incorporada, sem espaço morto e escala de 1 em 1 U
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50cc
|
Embora as habituais sejam a administração com seringa ou "caneta injectora" (Quadro
VII), existem outras possibilidades em estudo.13
Quadro VII
Outros meios de administração da insulina
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BOMBAS DE PERFUSÃO
(Não disponíveis no mercado Português)
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Utilizadas em condições muito especiais de terapia intensiva. Método de administração que mais imita a secreção pancreática fisiológica de insulina. libertada em bólus como resposta aos alimentos ingeridos.
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INTRANASAL
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Em estudo. A possibilidade de se utilizar esta via de administração resulta da ligação da insulina a um surfactante, que não deve ser agressivo para a mucosa nasal, por aplicação prolongada.
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INTRARRECTAL
|
Em estudo. A associação da insulina ao dihidrocolato de sódio mostrou-se eficaz por via rectal.
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PERFUSÃO IV
|
Utilizada em situações de emergência.
|
14
Condições de conservação
A insulina é uma substância de natureza proteica, pelo que pode perder actividade se não for conservada convenientemente. Os frascos em uso podem ser conservados à temperatura ambiente, sem qualquer alteração da insulina (cerca de seis semanas).Os frascos de reserva devem ser mantidos no frigorífico, mas afastados do congelador, dado que a congelação determina a desnaturação proteica e a perda da actividade. A insulina deve ser desprezada e iniciada a terapêutica com outro frasco, quando se observarem alterações do seu aspecto (ex. coloração amarelada).
Em viagem
O diabético deve levar consigo a insulina necessária ao seu tratamento, durante o período de viagem ou a contactar um médico no local, face às diferentes apresentações ainda existentes nos outros países (40 UI e 100 UI por ml).
Deve evitar-se as alterações de temperatura (ex. na bagageira do avião pode congelar) e a exposição à luz directa, porque se degrada gradualmente, dando-lhe uma coloração amarelada.
Interacções Medicamentosas
São resultantes da antagonização ou do aumento dos efeitos farmacodinâmicos (Quadro
VIII).
Quadro VIII
Interacções medicamentosas da Insulina
|
NECESSIDADES AUMENTADAS(potenciação da acção hipoglicemiante)
|
NECESSIDADES REDUZIDAS(potenciação da acção hipoglicemiante)
|
Costicosteróides
Glucagon
Hormona do crescimento
Catecolaminas
Estimulantes beta adrenérgicos
Tiroxina
Contraceptivos orais
Tiazidas (diuréticos)
L-asparaginase
Fenitoína
|
Salicilatos (altas
doses)
Álcool
Antidiabéticos orais
Cloroquina
Disopiramido
Tetraciclinas
|
16
Reacções adversas
Os problemas principais que se colocavam eram consequência do grau de pureza deficiente da insulina: aparecimento de lípodistrofías, alergias no local da injecção e resistência à terapêutica.
Actualmente, os problemas apontados já praticamente não se colocam, por se dispor de insulinas de elevado grau de pureza.17
Contra-indicações
Em pessoas alérgicas ao fármaco, situações que são extremamente raras com maior prevalência na de origem animal (em desuso). Nestes casos o médico optará por outro tipo de insulina.18
Efeitos secundários
Geralmente consequência de um mau controlo terapêutico, podem surgir:
- Aumento de peso por efeito anabólico.
- Flutuação da glicemia entre hipo e hiperglicemia.
- Hipoglicemia. Deve-se geralmente à administração de doses de insulina superiores às necessárias, exercício físico exagerado, de uma alimentação deficiente em hidratos de carbono ou intervalo alimentar prolongado.
- Hiperglicemia. Devida em geral a administração de doses inferiores às necessárias, uma refeição mais abundante em hidratos de carbono ou a intercorrência (infecção, stress, etc).
Medidas a tomar
Adaptar a posologia de insulina aos valores de glicemia encontrados, tendo em conta o teor alimentar em hidratos de carbono (HC) ingeridos e o exercício físico praticado. Reforçar a autovigilância da glicemia e eventualmente da cetonúria, em particular se há suspeita de intercorrência.
19
Factores que influenciam o controlo glicémico
1. Dieta - Erros e/ou alterações na sua constituição (os excessos alimentares e os intervalos de tempo irregulares entre as refeições são erros frequentes).
2. Actividade física - Aumenta a captação de glucose baixando a glicemia e as necessidades de insulina, mesmo horas após a sua efectuação, pelo que se deve diminuir as doses ou aumentar a ração alimentar prévia.
3. "Stress" - Psíquico ou por infecções intercorrentes, cirurgia e/ou traumatismos.
4- Alterações hormonais - sobretudo na puberdade e gravidez pela acção da hormona do crescimento. Na menstruação por vezes as glicemias podem estar aumentadas no período pré-menstrual.
5- Gastroparesia - devida à lentificação da digestão gástrica.
6- Insuficiência renal (IR) - variável segundo o seu grau, tipo de diálise efectuada e da alimentação, levando a modificações posológicas frequentes.
20
A insulinoterapia está indicada em:
Tratamento permanente
- Diabéticos tipo 1 (DID);
- Falência da terapêutica oral na diabetes tipo 2 (DNID);
Tratamento temporário
- Diabetes gestacional;
- Na diabética tipo 2 que pretende engravidar ou que já está grávida;
- Intervenções cirúrgicas ( pré e pós operatórios);
- Doenças intercorrentes (ex. TP e outras infecções graves, EM, etc);
- Diabéticos com úlcera aguda do pé
21
Situações mais comuns em Medicina Familiar
Diabetes Inaugural (ver Diabetes Mellitus)
Situação em que a sintomatologia de poliúria, polidipsia, astenia e emagrecimento, em regra de instalação não muito longa, acompanhada de valores de glicemia diagnóstica exigem o início de insulina. A instituição da primeira injecção pela equipa de Cuidados Primários, em particular pelo seu Médico de Família, acompanhada de explicação sobre a situação, reforça a confiança e laços necessários à futura educação terapêutica contínua (Quadro
IX). O diabético deve então ser referenciado a uma consulta de diabetes hospitalar, que na sua maioria garantem acessibilidade prioritária a estes doentes, sobretudo crianças e adolescentes.
22 Quadro IX
Início de Insulina na Diabetes
tipo 1 |
Fluxograma
1. Explicação simples sobre diabetes tipo 1
2. Ensino de técnica com seringa na 1ª consulta utilizando
insulina regular
3. Contacto com o colega hospitalar para consulta
4. Se não houver possibilidade de consulta no mesmo dia, propor
duas doses de insulina de acção intermédia 0,1 a 0,2 unidades
(UI) por quilo de peso distribuídas em duas tomas: ao acordar, 20 a
30 minutos antes do pequeno-almoço (2/3 da dose total) e ao jantar
(NPH) ou deitar (Zn) (1/3 da dose total) e disponibilizar contacto.
5. Verificar e garantir o acesso a consulta especializada e manter
disponibilidade.
|
23
Cetose (ver Cetacidose diabética)
Situação para a qual a equipa deve saber educar o diabético tipo 1 a tratar e que pode ocorrer por défice de insulina face à sua sobre utilização (situação de stress) ou por dose insuficiente.24
Diabetes tipo 2 mal controlada
Questão: Quando iniciar Insulina na diabetes tipo 2 mal controlada?
- Na falência secundária aos antidiabéticos orais - história de anos de evolução, seguidos de agravamento do controlo metabólico e instalação de "polis" e emagrecimento. A dúvida se se trata de uma falência secundária ou de uma diabetes tipo 1 de instalação lenta ("LADA" - Late Autoimune Diabetes of the Adult) tem relativa importância clínica, já que o início de tratamento com insulina se impõe em ambos os casos.
- Na insulinoresistência relativa (muitas vezes por deficiente adesão à dieta e exercício) - esta situação impõe avaliação criteriosa, já que o início da insulinoterapia aumentará o peso agravando a insulinoresistência. No entanto, a maioria dos diabéticos parece associar o uso da insulina ao agravamento do seu estado e aderir às propostas da equipa. Por outro lado, ao diminuir-se a glucotoxicidade na célulaß
pancreática devida à permanente exposição a hiperglicemia, poderá vir a verificar-se posteriormente diminuição progressiva das doses, havendo autores que chegam a advogar a sua utilização mesmo nas fases precoces com este fim.
Propomos iniciar insulinoterapia nestes diabéticos desde que:
a. Não haja possibilidade de correcção pelo reforço de dieta hipocalórica e fraccionada e exercício físico adaptado;
b. Não consigam alcançar controlo metabólico aceitável (HbA1c<8%);
c. Haja perfil de risco acrescido
- Por doença intercorrente ou complicação - a necessidade de correcção metabólica para promover a cura de patologia associada (ex. TP ou EAM) ou de sintomas devidos à diabetes e que afectam a qualidade de vida (ex.: neuropatia hiperestésica, prurido vulvar persistente) ou por complicação (úlcera aguda do pé) implica muitas vezes o início de insulinoterapia.
A insulinoterapia deverá ser monitorizada, preferencialmente, através da autovigilância da glicemia e cetonúria (todos os diabéticos tipo 1 e maioria dos tipo 2) e apenas nalguns casos pela glicosúria de expoliação (ex. diabéticos tipo 2 idosos a quem se pretende apenas evitar esta)
|
25
Esquemas posológicos
De um modo geral, não existem protocolos fixos sobre as posologias a iniciar, mas apenas propostas de orientações.
A terapêutica insulínica tem como uma das suas principais características a adaptação ao indivíduo, baseada no tipo de insulina, no número de tomas diárias, no intervalo entre elas e no número de unidades a administrar. De início, as posologias são estabelecidas com base na experiência clínica de cada um e devem ser adaptadas aos objectivos individuais de tratamento, valores de glicemia verificados, de acordo com o autocontrolo e o controlo laboratoriais (Quadro
X).26
Quadro X
Inicio de insulina em diabetes tipo 2
|
Fluxograma
(não necessariamente numa consulta única)
1. Explicação simples sobre a necessidade de insulina;
2. Ensino sobre autovigilância da glicemia capilar;
3. Reforço do ensino sobre prevenção e tratamento da
hipoglicemia;
4. Ensino de técnica com seringa na consulta, utilizando insulina
regular;
5. Propomos 0,1 a 0,2 unidades (UI) por quilo de peso numa única toma ao deitar começando com 12 unidades e subindo 2 UI cada 3 dias até obter glicemias de jejum >70 e < 120mg/dl (6mmol/L), mantendo a terapêutica
oral;
6. Se a dose necessária alcançar as 18 UI propomos passar para duas tomas diárias, sendo que a do acordar deverá corresponder a 2/3 e a do jantar ou deitar, a 1/3. A terapêutica oral com sulfonilureias deve ser
interrompida;
7. Procurar discutir a manutenção do controlo com a equipa hospitalar, com ou sem referência do doente, sempre que possível.
|
A experiência do médico em manejar a insulina permite a adequação posológica a cada doente de acordo com os casos particulares como a terapêutica de manutenção em diabéticos com mau controlo sistemático, ou a adaptação em função da alimentação, ou do exercício físico, ou de uma patologia eventual, ou de outras situações.
Esquemas de uma ou múltiplas injecções exigem o conhecimento e adaptação ao doente, pelo que a utilização das insulinas deverá ter como regra a da demais medicação: prescrever aquela a que se está mais habituado e solicitar consultadoria, referenciando o doente sempre que necessário.
27
Organização dos seus cuidados
O tratamento da pessoa com diabetes assenta na organização dos seus cuidados tendo como fim a prevenção das complicações agudas e crónicas e a manutenção da qualidade de vida (Quadro
XI).
28
Quadro XI
Organização dos cuidados |
Recursos necessários
- Humanos (tempo próprio de um ou mais elementos)
1. Instrutor da dieta
2. Instrutor da técnica de injecção
3. Responsável pela prescrição e ensino da dosagem de insulina
4. Equipa contactável fora-de-horas com mensagem consistente
5. Sistema de programação e/ ou convocatória de consultas
- Equipamento
1. material de injecção
2. material de autovigilância
3. insulina
4. material impresso de informação
- Educação Terapêutica Mínima
1. Dieta ajustada à insulinoterapia
2. Prevenção e tratamento das hipoglicemias
3. Autovigilância da glicemia capilar
4. Autocontrolo: ajuste terapêutico face aos resultados da
autovigilância
5. Autoinjecção
6. Prevenção e correcção da cetose
|
Estes princípios válidos para qualquer nível de cuidados e para todos os grupos de diabéticos apresentam grande importância ao iniciar-se a insulinoterapia, pelo que há necessidade de uma estrutura e organização mínimas, sem as quais não é possível assegurar o adequado suporte ao diabético e família.
A actuação conjunta do Médico de Família e do especialista em Diabetes e a adequada comunicação entre todos os elementos de ambas as equipas é essencial para a obtenção de bons resultados.
Todos os elementos da equipa devem fornecer a informação e a aquisição das aptidões necessárias à educação terapêutica dos diabéticos e suas famílias, para além de exporem e discutirem os objectivos de tratamento individuais referenciando-os no se Guia do Diabético, numa forma coerente e integrada.
29
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