A erradicação do Helicobacter pylori é eficaz na dispepsia funcional

 

 

Pergunta clínica: Em pessoas com sintomas de dispepsia funcional a erradição do Helicobacter pylori é uma terapêutica eficaz?

Desenho do estudo: Revisão sistemática e meta-análise, que actualizou a revisão Cochrane de 2006, pesquisando as bases de dados MEDLINE, EMBASE e EMBASE Classic até Outubro de 2021, bem como literatura cinzenta, sem restrições linguísticas. Foram incluídos ensaios clínicos aleatorizados que avaliassem a eficácia do tratamento de erradicação em doentes com dispepsia funcional e com H. pylori, comparativamente à terapêutica anti-secretora ou procinéticos, com ou sem antibióticos placebo, ou ao placebo apenas. Foi critério de elegibilidade a existência de um seguimento de, pelo menos, 3 meses. A selecção de estudos, extracção de dados e avaliação do risco de viés foram efectuadas de forma independente por dois revisores. As divergências foram resolvidas por consenso. A meta-análise foi conduzida pelo modelo de efeitos aleatórios.

Resultados: Foram incluídos 10 novos ensaios, perfazendo um total de 29 ensaios clínicos aleatorizados e 6781 pacientes. Apenas 6 estudos foram classificados como tendo baixo risco de viés, sendo os problemas mais comuns a ocultação da alocação pouco clara e o reporte incompleto de outcomes. Com base em 18 estudos, com 4564 doentes, o tratamento de erradicação foi superior ao grupo de controlo na cura dos sintomas (Risco Relativo [RR]=0,91, IC 95% 0,88-0,94, Number needed to treat [NNT]=14; I2 = 7%) e na melhoria dos sintomas (RR=0,84, Intervalo de Confiança [IC] 95% 0,78-0,91; NNT=9). No entanto, houve evidência de viés de publicação, sugerindo que ensaios mais pequenos ou com resultado negativo poderão não ter sido publicados. Em 16 estudos em que foi reportado o sucesso da erradicação, os pacientes com erradicação confirmada tiveram menor probabilidade de falha na melhoria e cura da dispepsia (RR=0.74; 0.64 – 0.85; I2 = 82%; NNT = 6), contudo com elevada heterogeneidade e assimetria no diagrama de funil, sugerindo viés de publicação. Quanto aos efeitos adversos (RR =2,19, IC 95% 1,10-4,37) e ao abandono do tratamento (RR =2,60, IC 95% 1,47-4,58), estes foram mais comuns no grupo submetido a tratamento de erradicação de H. pylori.

Comentário: Os resultados desta revisão sistemática e meta-análise indicam que a erradicação de H. pylori é eficaz na cura e melhoria dos sintomas de dispepsia funcional, particularmente quando há confirmação dessa erradicação. Apesar do benefício demonstrado ser modesto, a dispepsia funcional é uma doença crónica e prevalente, afeta 7% população mundial, pelo que um NNT de 14 para cura e um NNT de 9 para melhoria da sintomatologia, pode levar a uma redução substancial dos custos associados a esta patologia. Para além de ser custo-eficaz, a erradicação de H. pylori diminui a incidência de úlcera péptica e carcinoma gástrico. No entanto, não é claro se o benefício se deve à erradicação da H. pylori ou ao efeito da antibioterapia na flora gastrointestinal, uma vez que não se verificou uma correlação estatisticamente significativa entre a taxa de sucesso da erradicação e a cura/melhoria dos sintomas nos doentes com dispepsia funcional. Por outro lado, o RR de ausência de cura/melhoria foi menor no grupo em que H. pylori foi erradicada com sucesso, o que se pode traduzir num efeito direto sobre a bactéria. Em doentes com dispepsia funcional, deverá considerar-se a testagem e erradicação de H. pylori.

Artigo original: Gut

Por Ana Isabel Vasques, UCSP Guarda

 

 

 

 

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