Pressão arterial: menos não é sempre melhor

Pergunta clínica: Em pacientes idosos sob tratamento anti-hipertensivo, atingir valores de pressão arterial sistólica mais baixos associa-se a menor morbi-mortalidade?

Enquadramento: A prevalência de hipertensão aumenta com a idade. Existem alguns estudos que sugerem haver benefício do tratamento anti-hipertensivo também nos idosos. Por outro lado, a pressão arterial sistólica baixa em idades mais avançadas, particularmente em indivíduos frágeis, está associada a um maior risco de declínio cognitivo. Recentemente, tem havido muita controvérsia sobre os valores alvo a atingir no controlo da pressão arterial. 

Desenho do estudo: Estudo de coorte prospetivo, de base populacional, com follow-up de 5 anos. Todos os habitantes da cidade de Leiden, na Holanda, foram convidados a participar neste estudo se completassem 85 anos entre 1997 e 1999. Foram excluídos os participantes que morreram menos de 3 meses após a inclusão no estudo e os que não tinham registo prévio da medição da pressão arterial. A população alvo era de 705 habitantes. Inicialmente, e periodicamente ao longo dos 5 anos, foram recolhidos dados relativos a: parâmetros sociodemográficos, diagnósticos médicos, medicamentos, avaliação cognitiva (Mini Mental State Examination), força de preensão manual (como indicador de fragilidade) e pressão arterial.

Resultados: Dos 570 participantes, 249 (44%) receberam terapêutica anti-hipertensiva. Durante os 5 anos de follow-up, 263 (46%) participantes morreram. A mortalidade por todas as causas foi maior nos participantes sob tratamento anti-hipertensivo com pressão arterial sistólica mais baixa (hazard ratio 1,29 por cada menos 10 mmHg de pressão arterial sistólica; IC 95% 1,15 – 1,46). Também se verificou um declínio cognitivo mais acelerado nos participantes sob anti-hipertensivos e com pressão arterial sistólica mais baixa (P = 0,004). O declínio cognitivo foi mais rápido naqueles com menor força de preensão manual. Nos participantes sem tratamento anti-hipertensivo, não foram observadas associações significativas entre pressão arterial e mortalidade ou declínio cognitivo.

Conclusão: Neste estudo de coorte de pacientes com mais de 85 anos, a menor pressão arterial sistólica durante o tratamento com medicamentos anti-hipertensivos está associada a maiores taxas de mortalidade e maior declínio cognitivo.

Comentário: Apesar de ser um estudo observacional, o achado de que uma menor pressão arterial sistólica está associada a aumento da mortalidade e declínio cognitivo em idosos sob tratamento anti-hipertensivo é motivo para reflexão. Este estudo levanta a questão de qual é o nível ideal de pressão arterial alvo para pacientes idosos e/ou frágeis. São necessários mais estudos com critérios de inclusão mais amplos. O lema “’the lower, the better” não deve ser uma norma pois pode causar dano ao doente idoso hipertenso.

Artigo original: Age Ageing

Por Andreia Ramalho, USF Sobreda  




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