Controlo intensivo diabetes: sim, mas…



Pergunta clínica: O controlo glicémico intensivo nos doentes diabéticos tipo 2 previne os eventos cardiovasculares e aumenta a sobrevida global em comparação com o tratamento padrão?

Enquadramento: O ensaio prévio intitulado “The Veterans Affairs Diabetes Trial” tinha demonstrado que a redução intensiva dos níveis de glicemia, quando comparada com o tratamento padrão (durante 5,6 anos) não reduz de forma significativa a taxa de eventos cardiovasculares major num grupo de 1791 veteranos de guerra diabéticos. Este estudo estende o seguimento desses diabéticos durante cerca de 10 anos.

Desenho do estudo: Estudo coorte prospectivo. Os autores utilizaram bases de dados para identificar procedimentos, internamentos ou mortes. A maior parte destes doentes (77.7%), concordou ainda em ser submetido a inquéritos anuais e revisões periódicas dos seus processos. O objectivo primário foi o tempo decorrido até ao primeiro evento cardiovascular (EAM, AVC, ICC de novo ou agravamento da mesma, amputação por gangrena isquémica ou morte por causa cardiovascular). Os objectivos secundários foram a mortalidade cardiovascular e a mortalidade por todas as causas.

Resultados: A diferença nos níveis de HbA1C entre o grupo submetido a terapêutica intensiva e o grupo submetido a terapêutica padrão foi em média de 1.5% (6.9% versus 8.4%), tendo diminuído para 0.2-0.3% 3 anos após o término do ensaio. Depois de um seguimento médio de 9.8anos, observou-se uma diminuição significativa do objectivo primário do grupo submetido a terapêutica intensiva, em relação ao grupo padrão (HR 0.83, IC 95%, 0.70-0.99, p=0.04), com uma redução absoluta no risco de eventos cardiovasculares de 8.6 eventos por 1000 pessoas/ano. Não se registou uma redução significativa na mortalidade cardiovascular (HR 0.88, IC 95%, 0.64-1.20, p=0.42). Não foi evidente também uma redução significativa na mortalidade total (HR 1.05, IC 95%, 0.89-1.25, p=0.54) para um seguimento médio de 11.8 anos.

Conclusão: O controlo intensivo dos níveis de glicémia nos doentes diabéticos tipo 2 diminui os eventos cardiovasculares major mas não aumentou a sobrevida global a longo prazo.

Comentário: Este estudo ajuda a colocar em perspectiva o objectivo do controlo intensivo da glicemia como fim em si mesmo. A salientar que mesmo os doentes incluídos no grupo de controlo intensivo tiveram uma HbA1C média de 6,9%, o que constitui um valor muito diferente da meta que algumas normas sugerem. Não obstante, ao acompanharmos o doente diabético, tendo em conta uma visão holística e integrada, não podemos ignorar que um evento cardiovascular major tem um profundo impacto na sua qualidade de vida e na sua família e comunidade.

Artigo original:N Engl J Med

Por Simão Rodrigues, USF Al-Gharb  



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