Suplementação de ferro na gravidez


Pergunta clínica: a suplementação de ferro durante a gravidez permite melhorar a saúde materna e infantil?

Enquadramento: O défice de ferro é o défice nutricional mais prevalente em todo o mundo e é a causa mais frequente de anemia na grávida.

Desenho do estudo: Atualização de uma revisão sistemática de 2006 da US Preventive Services Task Force, sobre o rastreio e suplementação para anemia por défice de ferro na gravidez. Foi realizada uma pesquisa bibliográfica nas bases de dados MEDLINE e Cochrane (de 1996 a Agosto de 2014), assim como em listas de referências de revisões sistemáticas relevantes, para identificar estudos publicados desde 1996. Foram seleccionados apenas ensaios clínicos em língua inglesa e estudos observacionais controlados sobre a eficácia do rastreio e suplementação de rotina para anemia por défice de ferro na gravidez nos países desenvolvidos.

Resultados: 12 estudos com suplementação de ferro foram incluídos, não se encontrando estudos observacionais controlados que preenchessem os critérios de inclusão. Com base em 11 dos estudos, a suplementação rotineira de ferro na grávida apresentou efeitos inconsistentes sobre as taxas de cesarianas, tamanho pequeno para a idade gestacional e baixo peso ao nascer, bem como nenhum efeito sobre a qualidade de vida materna, idade gestacional, Apgar, parto prematuro ou de mortalidade infantil. Os 12 estudos selecionados demonstraram melhorias nos índices hematológicos maternos, embora nem todos fossem estatisticamente significativas.

Conclusão: Não há evidência de que a suplementação pré-natal de rotina, para prevenção de anemia por défice de ferro, melhore os resultados clínicos de saúde materna ou infantil. No entanto, a mesma suplementação pode melhorar os índices hematológicos maternos.

Comentário: Nesta recente revisão sistemática, e embora considerando o viés de selecção de artigos apenas em língua inglesa, constata-se uma mudança na abordagem desta questão. A gravidez deixa assim de ser considerada uma condição sine qua non para a realização de suplementação com ferro, reservando-se esta apenas para casos selecionados. Ao analisar as orientações existentes em Portugal, a norma da DGS 063 divulgada em 2011, referente à “prescrição e determinação do hemograma”, menciona que, apesar da redução da hemoglobina ser fisiológica (principalmente a partir do segundo semestre) a OMS recomenda, de modo geral, suplementação com ferro para todas as grávidas. Já de acordo com a mais recente norma 030 de 2013 dedicada à “abordagem, diagnóstico e tratamento da ferropénia no adulto”, a suplementação com ferro oral na grávida apenas deve ser iniciada se a ferritina for inferior a 70 ng/ml (Nível de Evidência A, Grau de Recomendação II). Assim, cada vez mais as recomendações atuais evoluem no sentido da identificação em todas as grávidas da eventual existência de anemia ferropénica, reservando a terapêutica de suplementação com ferro apenas para os casos necessários, pois está comprovado que esta em nada contribui para uma melhoria da saúde materna ou neonatal.

Artigo original: Ann Intern Med

Por André Lourenço, USF Modivas




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