Meta-análise: corticoides no tratamento da pneumonia?



Pergunta clínica: Os corticoides devem ser incluídos na terapêutica da pneumonia adquirida na comunidade?

Enquadramento: A pneumonia consiste numa inflamação aguda do parênquima pulmonar de etiologia infeciosa. Esta doença é frequente (nos Estados Unidos ocorrem anualmente 5 a 11 casos por 1000 habitantes) e é potencialmente grave, principalmente nos grupos vulneráveis e com comorbilidades. Os microrganismos mais frequentemente implicados (e resistências) são diferentes dependendo do local onde foi adquirida a pneumonia, pelo que a abordagem terapêutica é distinta. A pneumonia pode classificar-se de pneumonia associada a cuidados de saúde, adquirida no hospital, ou adquirida na comunidade.

Desenho do estudo: Meta-análise de estudos controlados randomizados. Pesquisa pelos termos “pneumonia” e “corticosteroid” em estudos de revisão elegíveis, em qualquer idioma, na MEDLINE, EMBASE e Cochrane Central Register of Controlled Trials, entre 1 de janeiro de 2010 e 24 de maio de 2015, que relataram pelo menos um dos seguintes marcadores de resultado: duração de hospitalização, tempo para estabilização clínica, todas as causas de mortalidade, necessidade de ventilação mecânica, necessidade de unidade de terapia intensiva ou desenvolvimento de Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo. Nos estudos selecionados, foram incluídos adultos internados com pneumonia adquirida na comunidade, alocados forma aleatória em grupos com corticoterapia oral ou intravenosa versus placebo ou nenhum tratamento, para além da antibioterapia.

Resultados: O uso de corticoides diminuiu o tempo de internamento por 1 dia (3 estudos: diferença média: -1.0 dia; 95% CI -1,79 a -0,21 dias), menor tempo para a estabilidade clínica de 1,22 dias (5 estudos, 1180 pacientes, diferença média: -1.22 dias; -2,08 para -0,35 dias) e duração da hospitalização (6 ensaios; 1499 pacientes; diferença média, 1,00 dia [IC, 1,79-0,21 dias]; certeza elevada). A corticoterapia diminuiu a necessidade de ventilação mecânica (5 estudos, 1060 pacientes: risco relativo [RR] = 0,45; CI: 0,26-0,79) e a incidência de síndrome da angústia respiratória aguda (4 estudos, 945 pacientes: RR = 0,24; CI 0,10-0,56; certeza moderada). Os dados dos 12 estudos que avaliaram a mortalidade por qualquer causa revelaram uma tendência para diminuição do risco de morte por qualquer causa no grupo de corticosteroides (12 ensaios; 1974 pacientes, [RR], 0,67 [CI 95%, 0,45-1,01]; [RD], 2,8%; certeza moderada). A diferença entre os 2 grupos para este ponto final tornou-se estatisticamente significativa quando apenas os ensaios que preencheram os critérios para pneumonia grave foram incluídos (6 estudos: RR = 0,39; CI 0,20-0,77). O uso de corticoides aumentou o risco de hiperglicemia significativa (6 estudos: RR = 1,49; CI 1,01-2,19, certeza elevada). Não houve diferenças detetadas nas taxas de hemorragias gastrointestinais, complicações neuropsiquiátricas graves ou reinternamentos.

Conclusão: Para os adultos hospitalizados com pneumonia adquirida na comunidade, o tratamento com corticoides sistémicos pode reduzir a mortalidade em cerca de 3%, a necessidade de ventilação mecânica em aproximadamente 5% e a duração de internamento hospitalar em cerca de 1 dia.

Comentário: Esta meta-análise oferece evidência de boa qualidade de que pode haver benefício com a inclusão de corticoterapia, para além da antibioterapia, no tratamento dos doentes internados com pneumonia adquirida na comunidade. Contudo, tendo em conta a variabilidade da corticoterapia referida nos artigos acima descritos, são necessários mais estudos que permitam aferir melhor a posologia, duração e escolha da corticoterapia ideal a usar. Isto poderá vir a implicar uma revisão das recomendações actuais para o tratamento dos doentes com pneumonia.

Artigo original: Ann Intern Med

Por Joana Canais, USF Serra da Lousã 



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