Cessação tabágica aumenta risco cardiovascular?

Por Ângelo Costa, UCSP Fernão de Magalhães

Pergunta clínica: as terapias de cessação tabágica aumentam o risco de eventos cardiovasculares?

Enquadramento: o tabagismo é a principal causa de morte evitável em todo o mundo. A cessação precoce associa-se a aumentos importantes na expectativa de vida, melhoria na qualidade vida e redução dos custos em cuidados de saúde. Como tal, têm sido propostas como primeira linha de tratamento, três opções: terapia de reposição de nicotina, bupropriona e vareniclina. Há uma preocupação histórica de que as terapias de cessação tabágica possam aumentar o risco de doenças cardiovasculares (DCV). Por exemplo, a FDA (US Food and Drug Administration) realizou estudos com o intuito de verificar se existiriam diferenças entre o uso de vareniclina e o risco de eventos CV.

Desenho do estudo: meta-análise comparando a segurança da terapêutica de substituição de nicotina, da bupropriona e da vareniclina com eventos cardiovasculares e eventos cardiovasculares adversos (MACE- morte cardiovascular, enfarte agudo do miocardio não fatal e AVC não fatal) relatados em casos clínicos randomizados (ECR) publicados e relatórios da FDA em fumadores com ou sem DCV pré-existente

Resultados: de 63 ECR envolvendo 30 508 participantes, 21 corresponderam a terapêutica de substituição de nicotina, 28 a bupropriona e 18 a vareniclina verificou-se que não houve aumento de risco de eventos DCV com a bupropriona (RR 0,95), ou com a vareniclina (RR 1,30), mas a terapêutica de substituição de nicotina demonstrou um risco elevado para eventos menos graves (RR 2,29) e para qualquer evento DCV quando comparado com placebo (RR 1,81). Relativamente ao MACE apenas a bupropriona evidenciou um efeito protector (RR 0,45).

Comentário: Apesar dos resultados obtidos referirem que a terapêutica de substituição de nicotina está associada a um aumento de eventos DCV, não há significância estatística quando restrita a eventos MACE. Existem várias limitações a serem consideradas: foram consideradas duas definições de eventos CV, com a definição de MACE pela FDA a assumir um papel mais rigoroso a nível de resultados. Além disso, trata-se de um estudo novo, em que pela primeira vez se associam os resultados de eficácia e os resultados de eventos de DCV. Outra limitação foi a informação heterogénea de eventos cardiovasculares em ECR, optando-se assim pela definição MACE da FDA. O uso do tabaco é uma importante causa de morbilidade e mortalidade, sendo referido como a principal causa de doença evitável de doença e morte na sociedade actual. Estudos indicam que indivíduos com cardiopatia isquémica que deixam de fumar, têm um risco reduzido de eventos cardiovasculares e a cessação associa-se a melhoria da tolerância ao exercício, menor risco de amputação, aumento da sobrevivência e diminuição do risco vascular cerebral recorrente. Segundo a circular normativa nº 26 da DGS (28/12/2007), os fármacos recomendados são a Terapêutica de Substituição de Nicotina (nas variadas formulações), bupropiona, nortriplina, clonidina e vareniclina.

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