Inibidores do ácido gástrico e deficiência Vit. B12

Pergunta clínica: Será que a utilização prolongada de inibidores da produção de ácido gástrico se associam com a deficiência em vitamina B12?

Enquadramento: Os inibidores da bomba de protões (IBPs) e os antagonistas dos recetores 2 da histamina (AR2Hs) suprimem a produção de ácido gástrico podendo por esse motivo conduzir à mal absorção da vitamina B12. No entanto, são escassos os estudos de base populacional sobre a associação da exposição prolongada a estas medicações e a deficiência em vitamina B12. Assim, os investigadores propuseram-se estudar a associação entre a utilização de IBPs e AR2Hs e a deficiência em vitamina B12 num contexto de base comunitária nos Estados Unidos.

Desenho do estudo: A avaliação da associação entre a deficiência em vitamina B12 e a prévia utilização de medicação supressora da produção de ácido gástrica foi feita através de um estudo caso-controlo na população norte-californiana de “Kaiser Permanente”. Desta forma, foram comparados 25956 indivíduos com o diagnóstico de deficiência de vitamina B12 com 184199 indivíduos sem deficiência de vitamina B12, entre Janeiro de 1997 e Junho de 2011. A informação foi recolhida através de bases de dados eletrónicas de farmácias, e de laboratórios de diagnóstico clínico. O risco de deficiência de vitamina B12 foi estimado utilizando o odds ratio (OR) através de regressão logística.

Resultados: Entre os indivíduos com o diagnóstico de deficiência de vitamina B12, 3120 (12,0%) tiveram a prescrição de IBPs durante 2 anos ou mais, 1087 (4,2%) tiveram a prescrição de AR2Hs durante 2 ou mais anos e 21749 (83,8%) não tiveram prescrição de IBPs nem de AR2Hs. Nos indivíduos sem deficiência de vitamina B12, 13210 (7,2%) tiveram a prescrição de IBPs durante 2 anos ou mais; 5897 (3,2%) tiveram a prescrição de AR2Hs durante 2 ou mais anos e 165092 (89,6%) não tiveram prescrição de IBPs nem de AR2Hs. Tanto a prescrição por 2 anos ou mais de IBPs (OR: 1,65 [IC 95%: 1,58-1,73]) como a de AR2Hs (OR: 1,25 [IC 95%: 1,17-1,34]) se associou a um risco aumentado de deficiência de vitamina B12. Doses superiores a 1,5 comprimidos/dia de IBPs mostraram uma associação mais forte com a deficiência de vitamina B12 (OR: 1,95 [IC 95%: 1,77-2,15]) do que doses inferiores a 0,75 comprimidos/dia (OR: 1,63 [IC 95%: 1,48-1,78], p=0,007 para a interação).

Conclusão: A utilização prévia ou actual de inibidores da produção ácida gástrica associou-se de forma significativa com a presença de deficiência de vitamina B12.

Comentário: Neste estudo, a utilização de inibidores da produção ácida gástrica por 2 ou mais anos associou-se ao diagnóstico subsequente de deficiência de vitamina B12. A magnitude desta associação foi maior no sexo feminino e nos grupos etários mais jovens – com inibição ácida mais potente (IBPs vs. AR2Hs) – e menor após descontinuação da sua utilização. Não se observou qualquer tendência relacionada com utilizações mais prolongadas O papel de fatores confundidores nestes resultados não pode ser excluído por completo. Não obstante parece pertinente concluir que a utilização destes fármacos identifica uma população com risco acrescido para a deficiência de vitamina B12, independentemente de fatores de risco adicionais. Na prática clínica a utilização de supressores da produção ácida gástrica mantém-se como uma opção pertinente tendo em conta o doente em concreto. Recomenda-se uma vigilância adequada e a prescrição da menor dose possível.

Artigo original

Por Ana Mafalda Macedo, UCSP Carvalhido 

 

 

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