Restrição de sódio na IC: o sabor da evidência

Por Vítor Cardoso, USF Gualtar 

Pergunta clínica: A restrição de sódio melhora os resultados em saúde na insuficiência cardíaca sistólica (IC)?

Desenho: Revisão baseada na evidência, realizada pelos colaboradores do Alberta College of Family Physicians.

Resultados: Foi encontrada uma meta-análise publicada em 2012 que incluiu 6 ensaios clínicos aleatorizados e controlados (ECAC), num total de 2747 pacientes com insuficiência cardíaca sistólica. Uma dieta baixa em sódio (1800mg/dia), comparativamente a uma ingestão de 2800 mg/dia resultou num aumento da mortalidade por todas as causas, RR=1.95 (1.66-2.29), number needed to harm (NNH) de 8, mortalidade por IC, RR=2.23 (1.77-2.81), NNH=10 e de hospitalizações por IC RR=2.10 (1.67-2.64), NNH=5). Outros três estudos observacionais, com fatores de confundimento importantes, obtiveram diversos resultados. O primeiro estudou 302 pacientes e concluiu que uma dieta com elevado teor em sódio (>3000 mg/dia) melhorava a sobrevida livre de eventos nos indivíduos das classes I/II da classificação da NYHA e piorava aqueles nas classes III/IV. O segundo estudo (n=182) demonstrou que os pacientes admitidos no serviço de urgência por IC descompensada não se associavam a uma maior probabilidade de terem ingerido alimentos ricos em sódio nos três dias anteriores. E finalmente o terceiro (n=123), concluiu que os pacientes que consumiam quantidades mais elevadas de sódio por dia (>2800 mg) apresentavam uma maior incidência de descompensações agudas da IC.

Comentário: É curioso assistir à tendência de refutar um conhecimento que nos foi lecionado há não muitos anos atrás; aludindo à imperiosidade de questionar o que nos é “oferecido”. As recomendações norte-americanas atuais não são baseadas na evidência e recomendam uma dieta restrita em sódio de 2000-3000 mg/dia (5-7,5 gr de NaCl) para os pacientes com IC sintomática, considerando uma restrição mais rigorosa naqueles com IC moderada a severa. Os 6 ECAC incluídos na meta-análise apresentam importante limitações: foram realizados pelo mesmo grupo, a adesão à terapêutica não é descrita e foram utilizadas altas doses de diuréticos. Apesar de o peso amostral poder não ser o suficiente para trazer robustez aos resultados, há que reconhecer que os NNH calculados foram consideravelmente baixos. Por outro lado, considero que a interpretação prática destes resultados na realidade portuguesa deve ser muito cautelosa, atendendo ao conhecido elevado consumo de sal, elevada prevalência de HTA e à principal causa morte em Portugal (AVC).

                                                                                                                                       Artigo original

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