Hipolipedimiantes: protectores em relação à pancreatite?

Por Pedro Azevedo, USF Fânzeres 

Pergunta clínica: As estatinas ou os fibratos diminuem o risco de pancreatite?

Desenho do estudo: Meta-análise de estudos randomizados. Desenvolveu-se uma revisão da evidência da associação entre a terapêutica com estatinas e fibratos e o risco de pancreatite. Para isso, foram identificados estudos nas bases de dados da MEDLINE, EMBASE e Web of Science (estudos desde Janeiro de 1994 (para as estatinas) e desde Janeiro de 1972 (para os fibratos)  até Junho de 2012). Foram ainda contactados investigadores para inclusão de artigos não publicados. Foram seleccionados estudos controlados randomizados com resultados que incluíssem efeitos cardiovasculares de estatinas ou fibrato. Foram incluídos estudos com mais de 1000 participantes seguidos por mais de 1 ano. Como resultados primários foram registados o número de participantes que desenvolveram pancreatite e a mudança nos níveis de triglicéridos ao fim de 1 ano.

Resultados: O risco relativo de cada estudo foi calculado usando um modelo de efeito aleatório. A heterogeneidade intra-estudos foi aferida usando o representante estatístico I2. Com um total de 113800 participantes a realizar estatinas em comparação a tratamento regular e um seguimento médio de 4,1±1,5 anos, 309 desenvolveram pancreatite (134 com estatinas e 175 do grupo controlo), representando um risco relativo de 0,77 [IC 95% 0,62-0,97, P=0,03 e I2=0%]. Em estudos com estatinas em que se comparavam diferentes doses 39,614 participantes  com um seguimento de 4,8±1,7 anos, 156 participantes obtiveram pancreatite (70 em dose intensiva e 86 em dose moderada (RR, 0.82 [95% CI, 0.59-1.12; P = .21; I2 = 0%]). Combinando os resultados de ambos os tipos de estudos obtínhamos o RR 0.79 (95% CI, 0.65-0.95; P = .01; I2 = 0%). Nos estudos com fibratos com 40,162 participantes conduzidos por 5,3±0,5 anos, 144 participantes desenvolveram pancreatite (84 com terapia com fibratos, 60 com terapia com placebo) com um risco relativo de 1.39 [95% CI, 1.00-1.95; P = .053; I2 = 0%].

Conclusões: Numa análise combinada dos estudos randomizados, o uso da terapia com estatina está associada a um menor risco de pancreatite quando em paciente com valores normais ou levemente elevados de triglicéridos. Com os fibratos, não se verificou uma diminuição do risco de pancreatite. 

Comentário: A medicina tem-se tornado cada vez mais exigente e os efeitos secundários medicamentosos são pontos essenciais a ter em consideração. Fica portanto demonstrado a existência de evidência bastante consistente para o uso seguro das estatinas, no que se refere ao risco de pancreatite, em doentes com níveis médio-baixos de triglicéridos. É de notar, no entanto, que sempre que lemos uma meta-análise devemos estar atentos à realização da análise da heterogeneidade dos estudos. Como nos casos apresentados os níveis de heterogeneidade eram de facto muito baixos a falta de tal análise é desculpável mas não a de uma análise do gráfico em funil para exclusão do viés de publicação, especialmente quando consideramos que os estudos têm amplitudes temporais muito diferentes. O conhecimento das metodologias nos estudos de síntese permite-nos um melhor uso da informação compilada. Vale a pena pensar nisso.

Artigo original 

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