Stress pós-traumático em doentes pós-AVC ou pós-AIT

Por Sofia Pinto, USF S. João

 

Pergunta clínica: qual a prevalência de perturbação de stress pós-traumático nos sobreviventes de AVC ou AIT?

Contextualização: Sendo um evento cardiovascular um fenómeno potencialmente traumático, dele pode resultar uma perturbação de stress pós-traumático (PSPT). A relação inversa também se verifica – estudos têm evidenciado um risco acrescido de mortalidade e recorrência de evento cardíaco após PSPT nesse contexto. Os investigadores crêem que existe relação semelhante entre o AVC e a PSPT. Estima-se que a prevalência de PSPT neste contexto varie entre 3–37% e que existe um risco quase 3 vezes superior destes doentes não aderirem à terapêutica.

Desenho do estudo: Foi realizada uma revisão sistemática e meta-análise transversal nos quais foram incluídos coortes observacionais. Para o diagnóstico de PSPT utilizou-se um questionário de auto-preenchimento ou entrevista clínica, ambos desenvolvidos ou alterados para se adequarem a esta situação em particular.

Obtiveram-se 1238 artigos, dos quais 9 cumpriam os critérios de inclusão. A população abrangida incluía 1138 participantes dos EUA ou Europa, com idade média de 64.5 anos, dos quais 47.5% eram homens.

A avaliação de PSPT foi realizada um a 60 meses após o AVC/AIT. Dois estudos efectuaram o diagnóstico por meio de entrevista clínica, os restantes pelo questionário do auto-preenchimento. Os questionários não tinham sido validados para este contexto, no entanto, escalas semelhantes tinham sido utilizadas com sucesso em doentes após síndrome coronário agudo (em contraposição à entrevista diagnóstica).

Resultados: A prevalência estimada de PSPT induzida por AVC/AIT foi de 13% (23% no primeiro ano e 11% após o primeiro ano) apresentando, no entanto, heterogeneidade significativa (3-37%). Esta deveu-se, em parte: a) ao momento em que foi efectuado o diagnóstico:  uma maior precocidade estima uma prevalência superior à avaliação mais tardia (25% até 1 ano vs. 12% após 1 ano); b) ao instrumento utilizado no diagnóstico: o questionário de auto-preenchimento estimou uma maior prevalência (28%) em relação à entrevista clínica (6%).

Conclusão: A PSPT após AVC/AIT é relativamente comum (cerca de 1 em 4 no primeiro ano e 1 em 9 a longo prazo) e pode influenciar medidas preventivas de recorrência de eventos tal como a adesão à terapêutica.

Comentário: Apesar das limitações do estudo, esta perturbação é uma realidade a considerar e um factor de risco a ter em conta. Desta forma, poderá ser importante identificar esta entidade em doentes que tenham sobrevivido um AVC ou que tenham tido um AIT de forma a tentar interromper este ciclo de morbi-mortalidade. Os médicos de família encontram-se numa posição privilegiada e têm competências específicas que permitem avaliar a PSPT nestes doentes e implementar as medidas preventivas necessárias. Resta obter um bom meio de diagnóstico para não sobre/subestimar a prevalência desta entidade.

 

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