TACs na infância e consequente risco de leucemia e tumores cerebrais

Por Vítor CardosoIFE MGF,USF Gualtar

A radiação ionizante das TC implica aumento do risco potencial para cancro, particularmente nas crianças, que são mais radiossensíveis que os adultos. A medula óssea e o cérebro são tecidos altamente radiossensíveis.

Objetivo: Avaliar o risco de tumores cerebrais e leucemia após TC.

Métodos: Estudo de coorte, observacional e retrospetivo. Foram incluídos indivíduos com idades <22 anos sem diagnóstico prévio de cancro, que realizaram TC pelo NHS entre o ano de 1985 e 2002. Os dados relativos à incidência de cancro, mortalidade e follow-up foram recolhidos até 31.Dez.2008. O follow-up para leucemia teve início 2 anos após a primeira TC e 5 anos para os tumores cerebrais.

Resultados: 74 de 178 604 pacientes foram diagnosticados com leucemia e 135 de 176 587 pacientes foram diagnosticados com tumores cerebrais. Observou-se uma associação positiva entre a dose de radiação e tumores cerebrais e leucemias. Comparando com os doentes que receberam uma dose de radiação <5 mGy, o risco relativo de leucemia para pacientes que receberam uma dose cumulativa de ≥30 mGy (dose média 51,13 mGy) foi de 3,18 e o risco relativo de tumores cerebrais de pacientes que receberam uma dose cumulativa de 50-74 mGy (dose média 60,42 mGy) foi 2,82.

Discussão: TC em crianças com doses cumulativas de cerca de 50 mGy podem triplicar o risco de leucemia; enquanto doses de cerca de 60 mGy (2-3 TC crânio) podem quase triplicar o risco de tumores cerebrais. Como estes tipos de cancro são relativamente raros, os riscos cumulativos absolutos são pequenos: nos 10 anos após a primeira TC em pacientes com idades <10 anos, estima-se que ocorra um caso a mais de leucemia e um caso a mais de tumor cerebral por 10000 TC ao crânio.

Comentários: A TC como procedimento diagnóstico é uma técnica muito valiosa, tendo-se verificado um aumento no seu uso, o que gerou uma certa apreensão. Os estudos dos efeitos da radiação têm sido baseados em modelos, por vezes pouco aplicáveis à população em geral. Este estudo analisa diretamente o efeito da TC no risco de cancro, numa amostra em larga escala nos hospitais do Reino Unido.

Como a TC é um exame muitas vezes requisitado quando se suspeita de leões neoplásicas, seria importante conhecer melhor, clinicamente, os indivíduos que foram estudados e o motivo pelo qual a TC foi realizada inicialmente. Certas situações ainda, como mutações genéticas ou o uso de fármacos radiossensibilizantes poderiam alterar o risco à priori de vir a desenvolver os cancros estudados. Apesar de provavelmente as outras técnicas radiológicas introduzirem taxas de radiações inferiores às da TC, seria útil incluir no estudo o historial individual de exposição às radiações. Esse viés é assumido pelos autores.

O uso criterioso de técnicas que usem radiação (TC) é crucial. Os benefícios devem compensar os riscos e a dose de radiação deve ser mantida tão baixa quanto possível. Exames alternativos devem ser considerados se for o caso. São necessários novos estudos, nomeadamente em indivíduos em idade adulta, diferentes raças, pesquisando outros tipos de cancro num follow-up maior.

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