Estudo RCT: profilaxia da enxaqueca em crianças e jovens



Pergunta clínica: Em idade pediátrica, o trartamento com amitriptilina ou topiramato é mais eficaz do que o placebo na redução de dias com enxaqueca?

População: crianças e jovens com enxaqueca

Intervenção: Medicação com amitriptilina ou topiramato

Comparação:  Terapêutica farmacológica versus placebo

Outcome: redução relativa ≥50% no número de dias de enxaqueca

Enquadramento: A enxaqueca em idade pediátrica tem elevada prevalência, com impacto importante na qualidade de vida. As recomendações para o seu tratamento são baseadas apenas em consensos de peritos.

Desenho do estudo: Ensaio clínico de fase 3, randomizado controlado e duplamente cego. Realizado em vários centros nos E.U.A. Critérios de inclusão: jovens com idade entre os 8 a 17 anos com o diagnóstico de enxaqueca; limitação moderada ou severa (avaliada pela escala “Pediatric Migraine Disability Assessment Scale”) e cefaleias frequentes (4 ou mais dias por mês). Os 328 doentes elegíveis foram aleatorizados em 3 grupos (ratio 2:2:1). 132 foram medicados com amitriptilina (1mg/kg/dia), 130 com topiramato (2mg/kg/dia) e 66 com placebo durante 24 semanas. Objetivo principal : redução relativa ≥50% no número de dias de enxaqueca. Objetivos secundários: avaliação da incapacidade associada a enxaqueca, número de dias com enxaqueca, percentagem de doentes que completaram o ensaio e eventos adversos.

Resultados: O estudo terminou precocemente por se considerar supérfluo. Não houve diferenças significativas entre os grupos quanto ao objetivo principal, que ocorreu em 52% do grupo medicado com amitriptilina, 55% dos jovens que tomaram topiramato e 61% dos doentes com placebo (amitriptilina vs. placebo, P=0.26; topiramato vs. placebo, P=0.48; amitriptilina vs. topiramato, P=0.49). Não se detetaram diferenças na incapacidade relacionada com a enxaqueca, dias de enxaqueca ou doentes que completaram o período de estudo entre os grupos. Os doentes medicados com amitriptilina ou topiramato tiveram mais efeitos adversos do que os medicados com placebo, incluindo fadiga (30% vs. 14%), boca seca (25% vs. 12%) no grupo com amitriptilina, parestesias (31% vs. 8%) e perda de peso (8% vs. 0%) no grupo com topiramato. Três jovens no grupo da amitripitilina tiveram alterações graves do humor e um doente no grupo do topiramato fez uma tentativa de suicídio.

Conclusão: Neste ensaio o tratamento profilático da enxaqueca com amitriptilina ou topiramato, comparado com o placebo, não reduziu a frequência dos sintomas e esteve associado a mais efeitos adversos.

Comentário:. Frequentemente, criticam-se as principais publicações médicas por não publicarem ensaios clínicos com resultados negativos, ou seja, ensaios em que a eficácia dos fármacos testados não tenha sido observada. Felizmente, esta realidade tem-se alterado e a publicação deste estudo é bom exemplo disso. Neste caso, verifica-se que o uso, em crianças e jovens, de uma estratégia terapêutica que é comum para a profilaxia da enxaqueca no adulto, não é eficaz e pode até acarretar riscos pela exposição aos efeitos adversos. Por tudo isto, um estudo muito pertinente, principalmente sob uma perspectiva de prevenção quaternária.

Artigo original: N Engl J Med

Por Joana Penetra, USF Topázio 





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