Bloqueadores beta após enfarte?

 

 

Pergunta clínica: Em indivíduos que tiveram um enfarte agudo do miocárdio (EAM), os bloqueadores beta (BB) diminuem a morbi-mortalidade?

Desenho do estudo: Revisão sistemática com meta-análise de ensaios clínicos aleatorizados e controlados (ECAC) até 2013 e sem restrições linguísticas. Foram incluídos os ECAC com amostras superiores a 100 indivíduos que tiveram EAM e que comparassem o uso de BB com controlo. Foram excluídos ECAC sobre insuficiência cardíaca/disfunção sistólica ventricular esquerda pós enfarte, uma vez que nestes a eficácia dos BB terá provas dadas. Os ECAC foram classificados em ECAC da “era da reperfusão” se >50% dos pacientes recebessem reperfusão através de trombólise ou revascularização ou aspirina/estatina. De outra forma, os ECAC eram considerados da era da pré-reperfusão.

Resultados: Foram incluídos 60 ECAC, num total de 102003 pacientes e com um seguimento médio de 10 meses. Na era da pre-reperfusão (48 ECAC),os BB demonstraram reduzir a mortalidade total (RR 0.86; IC95% 0.79-0.94), cardiovascular (RR 0.87; IC95% 0.78-0.98), EAM (RR 0.78; IC95% 0.63-0.97) e angina (RR 0.88; IC95% 0.82-0.95).

Na era da reperfusão (12 ECAC), a mortalidade total não foi reduzida (RR 0.98; IC95% 0.92-1.05). Adicionalmente, reduziram a curto prazo (30 dias) o EAM (RR 0.72; IC95% 0.62-0.83, NNT=209) e a angina (RR 0.80; IC95% 0.65-0.98, NNT=26) à custa de um aumento do risco de insuficiência cardíaca (RR 1.10; IC95% 1.05-1.16, NNH=79) e do choque cardiogénico (RR 1.29; IC95% 1.18-1.41, NNH=90).

Conclusão: Na prática atual do tratamento do EAM, os BB não apresentam benefícios na mortalidade, sendo que os seus benefícios na recidiva do EAM/angina são a curto prazo e parecem não ultrapassar os riscos associados (choque/insuficiência cardíaca).

Comentário: Muitas das recomendações atuais para o uso dos BB nos pacientes com EAM baseiam-se em dados da era pré-reperfusão. Os dados destes ECAC demonstraram benefícios dos BB que parecem não existir atualmente, uma vez que os tratamentos médicos contemporâneos são mais agressivos. Por outro lado, estes ECAC apresentaram elevado risco de vieses (36/48), enquanto esse risco parece ser menor nos ECAC da era da reperfusão (6/12). Assim as atuais recomendações deverão ser revista à luz destes resultados.

Artigo original:Am J Med

Por Vítor Cardoso, USF Gualtar  

 

 

Prescrição Racional
Menu