Dr. Bruno Heleno @ Copenhaga

 

 

Há quanto tempo está em Copenhaga? O que o levou a optar por ir viver para Copenhaga?

Cheguei a Copenhaga há pouco mais que dois anos. A minha escolha por Copenhaga teve duas grandes razões.

Primeiro, quando era interno, tinha a perceção de que as actividades preventivas eram uma parte muito significativa da actividade clínica de um médico de família. Lembro-me que isso até foi uma das coisas que me atraiu para a especialidade quando comecei, até porque durante a faculdade repetiam a noção que era melhor prevenir do que tratar. À medida que avancei na especialidade, e muito graças a pessoas que conheci na MGF, fui apercebendo-me que a prova científica que sustentava essas actividades preventivas era inexistente ou de baixa qualidade. Por exemplo, a revisão sistemática da Cochrane sobre a eficácia da mamografia mostra que o impacto na mortalidade da mamografia, se existir, é muito mais baixo do que o que aprendi na faculdade.

Segundo, quando li essa revisão sistemática, fiquei com vontade de fazer investigação na área dos rastreios oncológicos. Concretamente, numa área que pouca a gente falava: os prejuízos associados ao rastreio. Ao ler mais sobre o tema, vi que a equipa por trás da revisão sistemática (Peter Gøtzsche e, na altura, a Margrethe Nielsen) era de Copenhaga. Uma das pessoas com quem colaboravam era um médico de família: o John Brodersen. Ou seja, em Copenhaga havia gente a fazer investigação na área que me interessava e que era possível fazer investigação mantendo uma perspectiva da medicina familiar. Acabei por enviar um e-mail ao John, a dizer do meu interesse em fazer um doutoramento nesta área. Ele convidou-me para uma entrevista e, passado um ano e meio, estava em Copenhaga como estudante de doutoramento dele. Ainda hoje fiquei surpreendido com a simplicidade do processo: um e-mail e uma entrevista.

Quais os aspectos mais positivos em integrar o doutoramento na Universidade de Copenhaga?

Do ponto de vista profissional, acho que a Universidade Copenhaga oferece-me recursos que ainda não existem em Portugal. Por exemplo, o departamento onde trabalho tem 15 médicos de família doutorados e vários outros doutorados entre enfermeiros, estatísticos, antropólogos, sociólogos. Há tempos, o Prof. José Augusto Simões enviou-me uma listagem de todos os médicos de família com doutoramento em Portugal e são 16, divididos por 8 faculdades. Naturalmente, tenho mais oportunidades para discutir os meus projetos com outros investigadores aqui.

Outra grande diferença é a rapidez com que se resolvem problemas. A título de exemplo, há uns meses o meu computador no gabinete avariou-se. Telefonei para o informático da unidade e 20 minutos depois tinha um computador de substituição instalado. Tive uma situação semelhante em Portugal umas semanas depois, e demorei 4-5 horas até conseguir um computador com acesso à internet e capaz de correr os programas estatísticos. Ou seja, o mesmo problema num sítio custou-me uma hora de produtividade e no outro meio dia de trabalho.

O sistema de saúde Dinamarquês pode ser um modelo para Portugal?

Não conheço o suficiente do sistema Dinamarquês para responder a esta pergunta.

Quais os conselhos que pode dar a um colega português que queira emigrar para a Dinamarca?

O primeiro conselho é que venha no Verão, para não estranhar o frio e a falta de luz…

Agora mais a sério, ser for para emigrar como médico de família, creio que isso implicará comprar uma clínica numa região da Dinamarca (de uma forma simplista, os médicos de família são donos de uma clínica privada que tem como pagador único o estado dinamarquês). Calculo que não seja fácil comprar clínicas nos centros urbanos, mas pode ser possível em locais de média dimensão ou zonas rurais. De qualquer forma, devem estar preparados para dedicar 6 meses para aprender dinamarquês. Há uma colega portuguesa de psiquiatria em Vejle e creio que foi isso que ela demorou para conseguir ter actividade clínica. Algumas câmaras com carências de médicos, como no caso dela, podem disponibilizar-se para pagar o salário durante os 6 meses em que se está a aprender a língua.

Se for para fazer investigação, as coisas podem ser muito simples, como aconteceu comigo.

Pretende regressar a Portugal? Porquê?

Sinto-me muito bem a viver na Dinamarca: as pessoas que conheci esforçaram-se por me integrar, estou num país em que as coisas são organizadas; a qualidade de vida na Dinamarca é invejável. Mas, sinto-me bem porque sei que é um período limitado da minha vida. Do ponto de vista pessoal, a Dinamarca não é casa… E do ponto de vista profissional, custa-me ter deixado de trabalhar com algumas das pessoas que encontrei na USF, no ACES e na FCML e, sobretudo, ter deixado de fazer clínica. Por isso, o meu plano sempre foi regressar.

Para saber mais sobre o Dr Bruno Heleno: http://dk.linkedin.com/pub/bruno-heleno/12/40b/885

 Entrevista conduzida por Luís Monteiro

Médicos portugueses pelo mundo
Menu