O Enfermeiro de Família Especialista

No fim de semana de 18/19 de Maio houve um interessante debate sobre o Enfermeiro de Família, no Fórum-USF AN (grupo de debate da internet aberto a todos os sócios da USF AN)

De um lado estavam enfermeiros especialistas (em  Saúde Materna e Obstétrica, Saúde Infantil e Pediátrica, Reabilitação, etc.) que consideram que faz todo o sentido as USFs e UCSPs serem constituídas pelos diversos especialistas e no outro um grupo de enfermeiros generalistas (sem especialidade) que defendem que o futuro Enfermeiro de Família deve ser um Enfermeiro Generalista com as competências referidas no Regulamento de Competências Específicas da Especialidade de Enfermeiro de Saúde Familiar.

Fazendo um paralelismo com a atividade médica seria uma discussão em que uns advogam que as UFS devem ser integradas por Pediatras, Ginecologistas, Psiquiatras, Cardiologistas etc. e outros que basta ter o Internato Comum acrescido de uma especialização em Terapia Familiar.

Porque de facto se consultarem o dito regulamento verão que todo ele versa exclusivamente a “Dinâmica Familiar”. O que sendo um instrumento importante não pode de todo ser confundido com o currículo da especialidade que deve ter um Enfermeiro de Família.

Esta discussão é importante, sobretudo quando está em preparação o diploma que institui a Especialização do Enfermeiro de Família. Para ela o meu contributo :

 

1- A Unidades de Saúde Familiares são equipes multiprofissionais que articuladamente prestam  cuidados de saúde a uma determinada população. Por isso a discussão do que se faz numa USF , quais os papeis dos vários atores, e como se articulam é algo que diz respeito a todos e não é um debate interno de uma classe profissional.

2- O presente debate centra-se exatamente sobre o papel dos enfermeiros numa USF. E é no contexto USF que a questão tem que ser debatida.

3- Aquilo que está no “Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Familiar”,  não corresponde ao papel esperado de um Enfermeiro de Família numa USF. Este Regulamento está para o Enfermeiros de Família como a especialização em Terapia Familiar está para o Médico de Família. O Médico de Família não é Medico de “Famílias”. A Medicina Geral e Familiar centra-se na Pessoa nos seus múltiplos contextos. Apesar da inscrição por famílias pesar assim na atividade do MF devendo este ter capacidades nesta área,  O “Familiar” da MGF advém do facto de uma maneira geral ser o médico de todos os elementos da Família e da recuperação de uma designação popular histórica “O Médico da Família” que tratava todos os elementos da mesma (não havia alternativas) e até fazia partos.

4- As Unidades de Saúde Familiares não têm como objeto principal o tratamento de ”Famílias”. A sua designação tem a mesma conotação que a MGF. O seu objeto é a prestação de todos os cuidados primários aos vários elementos da família sendo que de uma maneira geral a inscrição deve ser de base familiar. Dizemos Unidades de Saúde Familiares e não Unidades de Saúde Familiar.

5- Assim creio que é importante desfazer o equívoco e centrarmo-nos naquilo que deve ser  a carteira de serviços dos enfermeiros numa USF/UCSP. Ora esta deve corresponder ao que está tipificado na lei como carteira básica de serviços e que corresponde ao que é feito já hoje no dia a dia.

6- Aquilo que me parece correto é a existência nas USFs de Enfermeiros de Família Especialistas em CSPs.

E o que é isto? É enfermeiros a fazerem o que já hoje muitos, autodidatas, fazem em muitas USFs (tal como na nossa). Aquilo que  é preciso são  Enfermeiros de Cuidados de Saúde Primários com competências acrescidas em Saúde Materna, Saúde Infantil, Planeamento Familiar, Nutricionismo, Podologia, Promoção da Saúde, Motivação, alguns gestos técnicos como suturas simples, pequenas cirurgias, colpocitologias, etc. para além das atividades da sala de tratamentos .E provavelmente mais algumas.

 

Em resumo :

Os enfermeiros generalistas não possuem à partida todas as competências necessárias ao papel que poderiam desempenhar nas USFs. Havendo algumas que estão reféns das várias especialidades.

Por exemplo conheço enfermeiros que suturam melhor que os médicos mas que numa USF o não fazem porque isso é uma competência específica dos Enfermeiros Especialistas de Cirurgia. Citologias só os Enfermeiros Especialistas de área as podem fazer, etc. etc.

Assim, a meu ver, o que faz falta é dotar cada enfermeiro das USFs das competências das várias  outras especialidades. Todas? Não, apenas aquelas que são relevantes nos CSPs. Por exemplo um Enfermeiro de Família Especialista poderá fazer citologias mas não poderá fazer partos.

E finalmente uma especialidade não é só conhecimentos. É também treino. Treino orientado.

Por isso defendo que se identifiquem as necessidades formativas dos atuais enfermeiros das USFs , que se realize a formação em exercício (como muitos médicos, como eu, fizeram) de forma a adquirirem a especialidade de CSPs, e depois que estes novos especialistas venham a ser tutores dos futuros Enfermeiros de Família

António Alvim

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