Estudo RCT: hipertensão resistente



Pergunta Clínica: Em pacientes com hipertensão arterial resistente, também designada por refratária, qual será a opção terapêutica mais eficaz para se associar?

Enquadramento: A hipertensão arterial resistente define-se como uma hipertensão que não é controlada apesar do tratamento com três fármacos anti-hipertensores na sua dose máxima recomendada. Estudos recentes sugerem que a espironolactona pode ser um fármaco associado eficaz nesses casos. No entanto, a qualidade da evidência é baixa, e ainda não houve estudos comparando a eficácia da espironolactona em relação a outros anti-hipertensores. O objetivo deste estudo foi testar a hipótese de que a hipertensão resistente poderá ser causada pela retenção excessiva de sódio, e que a associação de espironolactona será mais eficaz que qualquer outro fármaco não-diurético.

Desenho do estudo: Estudo duplamente cego, controlado com placebo, com doentes dos 18 aos 79 anos, com pressão arterial sistólica ≥140 mmHg no consultório (≥135 mmHg para diabéticos) e ≥130 mmHg em ambulatório, apesar de ≥3 meses com doses máximas recomendadas de três anti-hipertensores. Os doentes passaram numa ordem pré-estabelecida através de 12 semanas de tratamento com uma dose diária (duplicada após 6 semanas de cada ciclo) de espironolactona (25-50 mg), bisoprolol (5-10 mg), doxazosina (4-8 mg) e placebo, em associação à terapêutica anti-hipertensora prévia. Os endpoints primários foram: a diferença na pressão arterial media em ambulatório entre espironolactona e placebo; a diferença (se significativa) entre espironolactona e a média dos outros dois fármacos; e a diferença entre espironolactona e cada um dos outros dois fármacos individualmente.
De 15/05/2009 a 08/07/2014, foram analisados 436 doentes, 335 foram selecionados aleatoriamente, e 21 foram excluídos. 285 doentes receberam espironolactona, 282 doxazosina, 285 bisoprolol e 274 placebo. 230 doentes completaram todos os ciclos de tratamento.
Resultados:. A redução média da pressão arterial sistólica em ambulatório com espironolactona foi superior ao placebo (-8,70 mmHg [IC 95% -9,72 a -7,69]; p <0,0001), superior à média dos outros dois fármacos (-4,26 mmHg [IC 95% -5,13 a -3,38]; p <0,0001), e superior quando comparado com os fármacos individualmente: doxazosina (-4,03 mmHg [IC 95% -5,04 a -3,02]; p <0,0001) e bisoprolol (-4,48 mmHg [IC 95% -5,50 a -3,46]; p <0,0001).

Conclusão: A espironolactona foi o fármaco associado mais eficaz no tratamento da hipertensão resistente. A superioridade da espironolactona reforça a hipótese de um papel primário da retenção de sódio nesta condição.

Comentário: A hipertensão tem sido muito estudada nos últimos anos, com revisão dos esquemas terapêuticos nas normas que vão saindo, não sendo hoje fixa a sequência de associação ótima, mas sendo cada vez mais óbvia a necessidade da individualização da terapêutica conforme o tipo de doente. No caso da hipertensão resistente, segundo este estudo, a espironolactona parece ser o fármaco associado mais eficaz. É um estudo relevante, apesar de alguns erros metodológicos, mas que não nos permite entender se a redução da pressão arterial objetivada se repercute em redução de eventos clínicos importantes (enfarte, insuficiênica cardíaca, insuficiência renal crónica, morte cárdio ou cérebrovascular) e se existe diferença entre a espironolactona e outros diuréticos, nas mesmas condições.

Artigo original: Lancet

Por Luís Paixão, UCSP Fernão de Magalhães  




Prescrição Racional
Menu