"Infopoluição": mais um desafio do universo digital para o médico de família actual

Quando o tema em debate é o universo digital as opiniões oscilam, habitualmente, entre dois extremos. De um lado temos os cépticos das novas tecnologias de informação que sonham, em tom nostálgico, com um regresso a um passado analógico. E no ponto oposto encontram-se os entusiastas dos últimos gadgets que, embalados por algum marketing, acreditam que qualquer resposta está à distância de um clique.

Mas nem todos ignoram que a realidade da infosfera é mais complexa e matizada.

O filósofo José Furtado, é um desses bons exemplos. O seu último livro “Uma Cultura da Informação para o Universo Digital” da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS-) oferece uma visão ponderada e fundamentada da nossa sociedade de informação.

O ensaísta começa por esclarecer a história da linguagem, da escrita à ilusão da alfabetização, e define conceitos como literacia e fractura digital.

Algumas das indagações e propostas do autor parecem-me muito pertinentes para os cuidados de saúde primários.

Interessa-me em particular a temática da “infopoluição” que inclui, segundo Eric Sutter, a superabundância, a desinformação, a contaminação e os abusos publicitários.

É que o nosso dia-a-dia, como cidadãos e médicos de família, implica uma gestão de dados digitais volumosos e num número crescente de plataformas.

Perante esta realidade, como podemos prevenir o nosso burnout e a entropia do sistema?

Julgo que o primeiro passo é assumirmos que a literacia para o universo digital é uma competência que deve estar incluída no plano de formação médica contínua.

Trata-se uma capacidade funcional, dinâmica, permeável à evolução e que não se esgota no domínio da técnica nem é monopólio de uma geração.

Quanto à entropia do sistema, esta só pode ser combatida com um trabalho em equipa, que nos ajude a distinguir o essencial do acessório, sinalizando a informação de qualidade.

Um exemplo concreto é, precisamente, o site em que o leitor está a ler este breve texto.

O portal mgfamiliar.net consegue agregar o contributo de vários colegas criando uma rede imaterial que enriquece a nossa especialidade.

Juntos transformamos o universo digital num meio para colocarmos a MGF na vanguarda, sem esquecermos que a sabedoria será sempre construída com a prática clínica cuidada, a leitura de livros fundamentais e a comunicação pessoal presencial e intransmissível.

Luís Monteiro, Médico de Família

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