Isabel Santos Solha @ Atenas




Em que local estives na Grécia? Por quanto tempo?
Durante os meses de Setembro e Outubro de 2017 estive em Atenas, a colaborar enquanto voluntária com a Plataforma de Apoio a Refugiados (PAR), juntamente com outros três voluntários.

Porque optaste por uma missão?
Porque queria conhecer melhor o problema dos refugiados de guerra e outros tipos de opressão e contribuir de uma forma mais direta. Dar nomes e caras aos números que nos chegam através dos meios de informação torna esta situação num problema pessoal e que deve tocar a todos nós. É importante não me deixar distanciar só porque vivo num país pacífico e distante dos muitos que se encontram atualmente em conflito. 

Porquê Grécia?
Nos últimos dois anos, durante a ainda atual crise de refugiados, oriundos em grande parte da Síria, a Grécia foi uma das principais portas de entrada no continente europeu. Ilhas anteriormente conhecidas pelos seus hotéis, luxo e bom tempo foram adaptadas e reorganizadas na tentativa de alojar temporariamente os milhares de pessoas que faziam a travessia para o continente, na tentativa de reencontrar um pouco de terra firme e paz. Alguns estão “de passagem” nestes locais há mais de 2 anos. De tal forma este esforço e trabalho foram revolucionários e inspiradores que os “habitantes das ilhas gregas no mar Egeu” foram candidatos a prémio Nobel da Paz em 2016.
Desde o início de 2016, a PAR tem no terreno duas equipas de voluntários, renovadas periodicamente, uma na ilha de Lesbos e outra em Atenas, a trabalhar de perto com estas pessoas, num projeto intitulado “PAR – Linha da Frente”. 

O que te surpreendeu mais no primeiro contacto?
Algumas das famílias que conheci vivem em instituições de acolhimento há mais de um ano. Os processos de atribuição de estatuto de refugiado, reunificação de famílias ou recolocação são frequentemente morosos e isso causa desespero e isolamento de mães, pais e filhos, que se separam na expectativa de melhores condições para alcançarem um local seguro onde se estabelecer. 




Qual foi o maior desafio durante esses dois meses?
Quando se integra uma missão com uma dinâmica de continuidade, é fundamental a nossa capacidade de adaptação. Por um lado, a nossa equipa tinha a ambição de contribuir para melhorar as condições atuais das pessoas nos abrigos em que trabalhámos e criar novos projetos. Por outro, percebi a importância de manter um equilíbrio com as pessoas que continuarão a apoiar as famílias após a nossa partida e que é mais vantajoso a estabilidade dos avanços graduais, mas consistentes, do que mudanças radicais, mas sem sustentabilidade. A parte de ensinar inglês e participar em atividades de trabalhos manuais com crianças entre os 3 e os 8 anos, sobretudo quando envolvia tintas, foram sem dúvida desafios muito compensadores.

Esta missão mudou algum aspeto na forma como exerces a tua prática clínica?
O período que passei em Atenas e a variedade de trabalho e tarefas que fui exercendo reforçaram o meu gosto e convicção na importância da Medicina Geral e Familiar no contexto de uma comunidade. 
Mesmo depois das câmaras e jornalistas deixarem de falar destes refugiados, o facto é que muitos deles continuam à espera que o seu processo de reunificação com a família seja concluído, ou à espera de conseguir um trabalho e recomeçar a vida num novo país sem a sombra da guerra, muitos deles continuam a chegar à costa vindos não só do oriente, mas também de países africanos. De forma análoga, depois de milhares de pessoas chegarem à costa da Europa mediterrânea com necessidades urgentes de saúde, vários meses depois, persistem problemas de saúde maioritariamente não urgentes e menos visíveis à primeira vista. Os problemas crónicos do corpo e da mente são igualmente incapacitantes e destruidores quando negligenciados. Além de necessidades médicas, existem sobretudo necessidades humanas, de apoio e incentivo a quem não tem nada nem ninguém conhecido, nem está familiarizado com a cultura onde se tenta integrar. Esta abrangência de cuidados enquadra perfeitamente no papel que atribuo ao médico de família.

Quais os conselhos práticos que podes dar a um colega português que pretenda participar numa missão semelhante?
Estas missões são periodicamente avaliadas, mas quem sentir que pode contribuir enquanto voluntário para tornar a espera destas pessoas menos angustiante e destruidora, pode informar-se no site da PAR (refugiados.pt) e perceber qual a melhor forma de contribuir. Esta organização trabalha não só na linha da frente, mas também cá em Portugal. O projeto PAR Famílias, em parceria com várias instituições de acolhimento, presta assistência não só em alojamento, mas na integração destas famílias no nosso país.


Muito obrigado, Isabel Santos Solha!

 
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