Trabalhar melhor – O Exemplo das USF

Que Portugal tem um problema de produtividade não é nada de novo. Todos o conhecemos há muitos anos, visto que temos ocupado, entre os 27 da UE, o 20º posto.

Os políticos e alguns patrões, olhando para este ranking, defendem reformas laborais que cortam direitos, diminuem os salários, os números de dias de férias, cortam feriados e aumentam o tempo de trabalho dos portugueses.

Parece simples, mas a receita não tem resultado. Primeiro, porque em relação ao tempo de trabalho, já somos o 5º país com maior carga horária laboral e a produtividade não aumentou! Somos entre os que mais trabalham e menos produzem.

Apesar dos números, os nossos políticos continuam a acreditar que sim, é preciso trabalhar mais. A qualidade não conta. E, vai daí, todos os funcionários públicos devem passar das 35 para as 40 horas semanais, sem aumentos salariais!

Sabemos (os governantes parecem não saber) que trabalhar muito não significa trabalhar bem. A competitividade não tem que ver, apenas, com o número de horas de trabalho. Os trabalhadores mais desonestos sempre passaram tantas horas no emprego, sem acrescentarem nada de relevante, quando os seus directores nomeados em comissão de serviços, estão a negociar à mesa do almoço ou do jantar.

Não será baixando sistematicamente os salários e aumentando os impostos, pagar o subsídio de férias o mais tarde possível ou tratar os trabalhadores da administração pública como se eles fossem culpados de todos os males da baixa produtividade que se vai melhorar o desempenho. Bem pelo contrário. Com esta Politica, afastam-se os melhores quadros da órbita do Estado, prejudicando todo o país.

E, a reforma do Estado para aumentar a eficiência? Nada, a não ser despedir e aumentar o horário de trabalho!

Reformar exige que se saiba exactamente o caminho que se quer tomar com transparências e criar condições para envolver todos os profissionais. Exige muito tempo e uma permanente avaliação dos sucessos e insucessos e, já agora, que não se deite fora o que de bom os outros fizeram. Veja-se o exemplo da implementação das Unidades de Saúde Familiar (USF), única marca portuguesa inserida no memoranda da Troika na área da eficiência.

O que separa o Governo Português dos países desenvolvidos é a qualidade das decisões, com o fim único de alimentar a quantidade do trabalho. Este governo mostra-se incapaz de compreender que para aumentar a produtividade necessita de trabalhadores felizes, motivados, autónomos e responsáveis, à semelhança do que acontece nas USF.

Por falar em USF, recordo os números apresentados por José Luís Biscaia, no Encontro Nacional das USF em Lisboa, 11 de Maio, do estudo efectuado pela Associação Nacional de USF em parceira com a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS):

– Em termos de acessibilidade aos Cuidados de Saúde Primários (taxa global de consultas médicas e de enfermagem) se o país estivesse todo coberto por USF, teríamos mais 1,2 milhões de portugueses abrangidas por uma consulta médica nos últimos 3 anos, 510.740 mulheres com uma consulta de planeamento familiar, 283 mil mulheres com uma mamografia realizada nos últimos dois anos e 530 mil adultos teriam feito o rastreio do cancro do cólon.

– Além disso, teríamos mais 120 mil diabéticos controlados e mais 120 mil hipertensos com tensões arteriais normalizadas.

– Em relação aos custos com meios auxiliares de diagnóstico por utilizador, as USF de Modelo B atingiram um valor de 46,89 euros em contraste com os 58,66 euros dos centros de saúde tradicionais.

– No custo por medicamento facturado por utilizador, as USF (B) atingiram 144,8 euros e os centros de saúde tradicionais 188,83 euros.

Em conclusão, se o País estivesse totalmente abrangido pelo modelo USF, teríamos uma poupança com medicamentos prescritos e exames de 172 milhões de euros, além dos ganhos de acessibilidade e qualidade assistencial enumerados anteriormente.

Mais uma vez, ficou claro que a demonstração do valor das USF através dos resultados obtidos, nas áreas do acesso, do desempenho, da qualidade e da eficiência, significativamente melhores do que os alcançados pelas unidades tradicionais, destacando-se sobretudo o acesso geral, o acesso a cuidados domiciliários, vigilância da doença crónica e oncológica, precocidade na vigilância da grávida e recém-nascido e eficiência económica.

Todavia, apesar destes números serem arrasadores e confirmarem que o modelo das USF, modelo positivo que promove a participação e co-responsabilização dos profissionais e cidadãos, quer pela autonomia reconhecida e pelos mecanismos de compromisso, este Governo, nomeadamente as ARS, lutam diariamente para que as condições de abertura de mais USF, não existam e lutam para que burocraticamente as USF de modelo A com parecer técnico aprovado, não passam a USF de modelo B, argumentando com a incapacidade de as orçamentar!

Em suma, este Governo está a produzir, um país de gente infeliz, amargurada, triste, revoltada e frustrada, e gente que emigra, mesmo nos médicos de família que ainda não fazem parte do batalhão de desempregados, as portas das USF estão a fechar-se.

Haja esperança que o futuro próximo nos traga a abertura de novas portas das USF.

João Rodrigues, Coordenador da USF Serra da Lousã, smzcjnr@gmail.com

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