Limiar de Saúde

 

Entre 10 de Maio e 6 de Junho de 2013 foi divulgado um questionário nas redes de conversação “MGF XXI” e “MGFamiliar”, no âmbito de um projeto de investigação, com o objetivo de conhecer a opinião de médicos quanto à existência de um hipotético novo síndrome médico (“Azeites matinais de segunda-feira”), especificamente quanto à sua aceitação em campanha de rastreio e recetividade de respetiva oferta terapêutica. O mesmo questionário foi divulgado na rede de conversação de alunos finalistas de uma escola superior de tecnologias de saúde. Na amostra de 130 médicos e 45 alunos, não se verificou diferença na distribuição por sexo, por sofrer de doença crónica e quanto à qualidade de saúde atual. Com diferença no consumo crónico de medicamentos [médicos n=34 (26,4%) vs. alunos n=3 (6,7%), p=0,003]. Comparando médicos com alunos verificou-se diferença significativa para “Julga ser esta síndrome muito frequente?” [n=95 (73,1%) vs. n=23 (51,1%) p=0,006], para “Julga sofrer desta síndrome?” [n=65 (50,0%) vs. n=6 (13,3%), p<0,001] e para “Concordaria em fazer este rastreio?” [n=94 (72,3%) vs. n=39 (86,7%), p=0,037].  Sem diferença significativa para “Sendo o rastreio positivo concordaria em realizar o tratamento?” [n=74 (57,4%) vs. n=25 (55,6%), p=0,484] e “Julga que esta síndrome existe?” [n=59 (45,4%) vs. n=14 (31,1%), p=0,066].

Os resultados obtidos, mesmo considerando as limitações do estudo, fazem-me refletir sobre dois conceitos: prevenção quaternária e disease mongering. De forma simples a prevenção quaternária tem como objetivo evitar excesso de intervencionismo médico sem clarificação da relação riscos/benefícios. Disease mongering pode traduzir-se como “promoção da doença” e é potencializada por estratégias de marketing para tornar a saúde como um bem de consumo, com as quais somos confrontados diariamente.

Todos os dias, em todas as consultas, somos confrontados com o frágil equilíbrio destes dois conceitos. As expectativas do utente estão moldadas por inúmeros estímulos conscientes e inconscientes. O contacto com o seu médico de família é apenas uma parcela ínfima da sua realidade.

E o médico? Está isento das diversas fontes de influências? Tem total noção que toda a sua atividade clínica é baseada na mais recente evidência científica?

O desafio que vos faço, é que me recordem o que já foi a prática clínica do médico de família e o que é agora. Encontram diferenças?    

O nosso limiar de saúde está a diminuir.   

 Philippe Botas

 

MaisOpinião - Philippe Botas
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