Hemorragia: anticoagulante diferente, risco diferente




Pergunta clínica: Em pacientes medicados com anticoagulantes, qual o fármaco anticoagulante com maior risco de hemorragia digestiva alta? A terapêutica combinada com inibidores da bomba de protões reduz o risco de hemorragia digestiva alta?

Desenho do estudo: Estudo de coorte retrospetivo de 1 de janeiro de 2011 a 30 de setembro de 2015. Foram incluídos doentes com idade superior a 30 anos e que tivessem iniciado anticoagulação oral com apixabano, dabigatrano, rivaroxabano ou varfarina. Marcador primário: número hospitalizações por hemorragia digestiva alta (esofagite, úlcera péptica e gastrite).

Resultados: Foram analisados os registos de 1.643.123 doentes, num total de 1.713.183 novos episódios de início de anticoagulação oral. A média de idade dos pacientes foi de 76,4 anos e a indicação para anticoagulação foi fibrilhação auricular em 74,9%. Em pacientes que receberam tratamento com anticoagulante sem tratamento com inibidores da bomba de protões, a incidência ajustada de hospitalização por hemorragia digestiva alta foi significativamente maior nos tratados com rivaroxabano em comparação com tratados com dabigatrano, varfarina ou apixabano (144 por 10.000 pessoas-ano vs 120, 113 e 73, respectivamente). Em pacientes com anticoagulação associada a inibidores da bomba de protões, a incidência ajustada de hospitalização por hemorragia digestiva alta foi menor do que sem tratamento com inibidores da bomba de protões (76 / 10.000 por ano vs 115 / 10.000 por ano; NNT = 256). 

Conclusão: A incidência de hospitalização por hemorragia gastrointestinal foi superior nos doentes medicados com rivaroxabano e foi menor nos doentes medicados com apixabano. A associação com inibidores da bomba de protões diminuiu o risco de hospitalização por hemorragia gastrointestinal.


Comentário: A principal limitação prática deste estudo reside no facto de não terem sido incluídos todos os anticoagulantes, nomeadamente o edoxabano. Apesar disso, a evidência obtida neste estudo pode permitir alguma orientação da decisão terapêutica na seleção do anticoagulante, sobretudo em pacientes de elevado risco hemorrágico. Além disso, estes resultados sugerem que a associação com inibidores da bomba de protões poderá ser uma estratégia importante na prevenção dos eventos hemorrágicos. Fica o desafio de individualizar o tratamento, de estratificar o risco e de procurar sempre evidência para uma medicina que promova atitudes potencialmente menos deletérias.

Artigo original: JAMA

Por Carlos Cardoso, USF Condeixa




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