Pergunta clínica: Em pacientes com necessidade de fazer medicação crónica, os dispositivos de “lembrete” da medicação melhoram a adesão terapêutica?
População: adultos a fazer medicação crónica, um a três medicamentos.
Intervenção: esquema com a medicação, temporizador digital ou caixa de medicação standard.
Comparação: controlo vs esquema com a medicação vs temporizador digital vs caixa de medicação standard.
Outcome: ótima adesão terapêutica (índice de cumprimento terapêutico >= a 80%).
Enquadramento: o processo de adesão terapêutica é dinâmico, na medida em que num mesmo doente há períodos de tempo em que este adere à medicação crónica e outros há em que não adere. Isto é explicado pelo facto da própria motivação e conhecimento do paciente em relação à sua doença crónica e consequentemente à medicação ser mutável ao longo do tempo. Por outro lado, os custos com a medicação são muitas vezes uma barreira importante à adesão terapêutica.
Desenho do estudo: Ensaio clínico controlado e randomizado, com 53480 pacientes (dos 18 aos 64 anos de idade) que tomavam um a três medicamentos crónicos (com uma adesão entre 30 e 80% no ano anterior à randomização). Os doentes foram estatificados e randomizados em dois grupos com base na medicação crónica. O primeiro grupo inclui os doentes medicados cronicamente para doença cardiovascular ou outra patologia crónica (excluindo depressão). O segundo grupo incluiu os doentes com medicação antidepressiva. Em cada um dos grupos os pacientes foram randomizados em quatro grupos: o controlo (não recebeu qualquer notificação ou dispositivo), os que receberam por correio um esquema com a medicação, um temporizador digital e caixa de medicação standard. Objectivo primário: ótima adesão terapêutica (índice de cumprimento terapêutico >= a 80%) para toda a medicação nos pacientes com doença crónica durante 12 meses de seguimento. O estudo decorreu durante cerca de 2 anos. Dos 53480 participantes, a média de idade foi de 45 anos e 56% foram do sexo feminino
Resultados: A ótima adesão à terapêutica foi alcançada em 15,5% dos pacientes que receberam a caixa de medicação standard, 15,1% dos que receberam um temporizador digital e em 16,3% dos que receberam o esquema da medicação. Não houve diferença estatisticamente significativa na adesão à terapêutica entre o grupo controlo e os restantes grupos. Na comparação direta, a adesão foi superior na caixa de medicação standard em relação ao esquema de medicação.
Conclusão: Este estudo não conseguiu demonstrar o benefício de dispositivos “de lembrete” de baixo custo na adesão terapêutica.
Comentário: O Médico de Família tem um papel primordial na adesão à terapêutica pelos seus doentes. Será que não é a comunicação a principal barreira na adesão terapêutica e aquela em nós poderemos ter um papel ativo na sua melhoria? Seria fundamental desenvolver mais estudos controlados e randomizados em que se estudasse a informação fornecida pelos profissionais de saúde e a adesão terapêutica.
Por Marisa Gomes, USF S. Miguel-o-Anjo