Um cigarro por dia: qual o risco cardiovascular?




Pergunta clínica: Os fumadores de 1 a 5 cigarros por dia terão o mesmo risco de desenvolver doença coronária ou acidente vascular cerebral do que os fumadores de 20 cigarros por dia?

Enquadramento: Está demonstrado que o tabagismo aumenta o risco de desenvolver doença coronária e acidente vascular cerebral. Muitos fumadores pretendem apenas reduzir o seu consumo em vez de o cessarem, por considerarem o suficiente para reduzir substancialmente o risco de desenvolver as doenças associadas ao fumo do tabaco.

Desenho do estudo: Revisão sistemática e meta-análise. A pesquisa de estudos foi efetuada com recurso à base de dados bibliográfica Medline (1946 a Maio 2015), com pesquisa manual de referências. A meta-análise incluiu 55 publicações referentes a 141 estudos de coorte.

Resultados: Em relação o risco relativo global de desenvolver doença coronária, nos homens,  esse risco é de 1.48 (1.74 quando ajustado para confundidores) para os fumadores de um cigarro por dia e de 2.04 (2.27 quando ajustado para confundidores) para os fumadores de 20 cigarros por dia. Nas mulheres, o risco relativo global de desenvolver doença coronária é de 1.57 (2.19 quando ajustado para confundidores) para as fumadoras de um cigarro por dia e de 2.84 (3.95 quando ajustado para confundidores) para as fumadoras de 20 cigarros por dia.  Os homens fumadores de um cigarro por dia apresentaram 46% (53% quando ajustado para confundidores) do excesso de risco apresentado pelos fumadores de 20 cigarros por dia. As mulheres fumadoras de um cigarro por dia apresentaram 31% (38% ajustado para confundidores)
do excesso de risco apresentado pelas fumadoras de 20 cigarros por dia.

Em relação o risco relativo global de desenvolver acidente vascular cerebral, esse risco é de 1.25 para os fumadores de um cigarro por dia e de 1.64 para os fumadores de 20 cigarros por dia (1.30 e 1.56, quando ajustado para confundidores). Nas mulheres, o risco relativo global de desenvolver acidente vascular cerebral é de 1.31 para as fumadoras de um cigarro por dia e de 2.16 para as fumadoras de 20 cigarros por dia (1.46 e 2.42, quando ajustado para confundidores). Os homens fumadores de um cigarro por dia apresentaram 41% (64% quando ajustado para confundidores) do excesso de risco apresentado pelos fumadores de 20 cigarros por dia. As mulheres fumadoras de um cigarro por dia apresentaram 34% (368% ajustado para confundidores) do excesso de risco apresentado pelas fumadoras de 20 cigarros por dia.


Conclusão: Não existe uma relação linear entre o risco de doença coronária e acidente vascular cerebral e a quantidade de cigarros fumados. O risco de fumar um cigarro por dia é muito superior a 1/20 do risco das pessoas que fumam 20 cigarros por dia e é superior ao valor esperado.  O consumo de um cigarro por dia associa-se a cerca de metade do risco de desenvolver de doença coronária e de acidente vascular cerebral dos fumadores de 20 cigarros por dia. O risco é globalmente maior nas mulheres do que nos homens.

Comentário: Apesar do artigo só incluir pesquisa bibliográfica de uma base de dados, apresenta uma metodologia robusta. E torna-se inovador ao demonstrar que a relação entre o consumo de tabaco e de desenvolvimento de doença coronária e acidente vascular cerebral não é linear. Ao contrário do que seria de esperar, a diminuição do consumo de cigarros para 1 a 5 cigarros por dia apenas se traduz na redução aproximada de metade do risco dos fumadores de 20 cigarros por dia. Não existe, portanto, um nível de segurança no consumo de cigarros para o risco cardiovascular, sendo de reforçar a necessidade de cessação tabágica nos fumadores. Outro aspeto interessante apontado no artigo é que para o mesmo consumo de tabaco as mulheres terão globalmente um maior risco de desenvolver doença cardiovascular que os homens. Será como no consumo de álcool? Estes mecanismos não estão esclarecidos, nem são objetivo da meta-análise. Claro que fumar 1 cigarro é melhor do que fumar 20, mas… melhor mesmo, para a saúde, será fumar nenhum!

Artigo original: BMJ

Por Ana Sequeira, USF Lethes 








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