A espera





Estou sentado na sala. À espera. As paredes brancas transmitem calma que é interrompida pelo sonoro das conversas cruzadas entre os muitos que esperam. Não sou o único aqui. O jovem que em pé olha para a televisão fixa na parede. O pai que reclama com a senhora da secretaria porque tinha a consulta marcada para há 15 minutos. A idosa que suspira de impaciência por ainda faltar uma hora para o seu atendimento; ela sabe que é essa a hora, mas tenta a sorte ao vir mais cedo. 

Na sala não há nenhum relógio. Olho para a mesa de brinquedos deslocada para o canto, onde uma menina pinta um livro. Recordo a minha infância. Momentos perenes. Sorrio ao divagar em lembranças de aventuras e desventuras. 

Observo. Minutos após minutos o médico vem à sala chamar as pessoas que esperam. É jovem e veste a bata branca. Ao abrir as portas que guiam pelo corredor dos consultórios recebe as pessoas com um cumprimento. Não raras vezes é interrompido por alguém que quer “uma palavrinha”. Qualquer um percebe que cordialmente transmite a inconveniência desta interrupção. Mas há alguns bem insistentes que testam os limites da paciência. 

A manhã avança e o médico continua no vai e vem. Ainda não fez uma pausa. Talvez tenha “engolido” um iogurte num intervalo entre consultas. Agora, a sua expressão demonstra algum cansaço. E percebo bem a razão. As solicitações além das marcações são diversas. Já atendeu uma pessoa que apareceu com queixas de dor no peito e orientou para cuidados hospitalares. Contei pelo menos quatro pessoas que fizeram bypass à secretaria e a quem teve que recomendar dirigirem-se à mesma. A assistente técnica foi pelo menos três vezes falar com o médico. Também o sistema informático não funcionou durante cerca de 30 minutos. 

Estou na sala de espera e a minha consulta tinha hora marcada há 20 minutos. Há coisas que devo saber antes de julgar. Muitas das consultas estão marcadas com intervalos de 15 ou 20 minutos. O consultório é o último do corredor. O utente idoso com dificuldade na marcha demora o tempo necessário. A senhora que estava a reclamar do atraso, e entrou logo a confrontar indelicadamente o médico, ultrapassou bem o tempo de consulta. 

Reflito. Compreendo que é necessário um tempo de consulta para garantir acessibilidade; para organizar o atendimento aos utentes. Julgo que ao médico deve ser dada a flexibilidade necessária para organizar o seu horário de acordo com as características do ficheiro. As imposições na limitação do tempo de consulta para períodos inferiores a 15 minutos são determinações que não consideram a realidade da atividade clínica. Só quem não conhece o contexto pode na sua arrogância comparar uma consulta médica com uma linha de montagem industrial. Estes tempos de consulta só podem ser determinados por cientistas que não conhecem ou não querem conhecer o terreno. 

É a minha vez. O médico cumprimenta-me e desculpa-se pelo atraso. Retribuo com um sorriso de compreensão. Avanço para o consultório, sento-me e falo sobre o que me traz à consulta.  

Por Philippe Botas



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