Pergunta clínica: Será que o ácido acetilsalicílico (AAS) reduz a probabilidade de reincidência de tromboembolismo venoso quando administrado após interrupção da anticoagulação?
Enquadramento: Os doentes, após um primeiro episódio de tromboembolismo venoso, apresentam um elevado risco de reincidência após a interrupção da anticoagulação. Aumentar o tempo de anticoagulação reduz esse risco, mas está associado a um risco aumentado de hemorragias.
Desenho do estudo: Meta-análise (denominada INSPIRE) que combina dados de 2 estudos prévios: WARFASA (com 403 doentes) e ASPIRE (com 822 doentes). Ambos os estudos tinham desenhos e populações semelhantes: adultos (não grávidas) com um primeiro episódio de trombose venosa profunda ou tromboembolismo pulmonar na ausência de qualquer factor de risco temporário ou permanente, que completaram o tratamento inicial com heparina e varfarina, ou outro esquema anticoagulante equivalente. O estudo WARFASA seguiu os doentes durante 2 anos, enquanto o estudo ASPIRE seguiu durante 4 anos. Em ambos os estudos a intervenção foi com 100 mg de AAS, uma vez por dia, ou placebo (616 doentes – AAS e 608 doentes – placebo, tendo sido 1 doente excluído).Os parâmetros analisados foram: reincidência de tromboembolismo venoso, eventos cardiovasculares major (enfarte agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral), hemorragia e morte.
Resultados: Tromboembolismo venoso ocorreu em 112 dos 608 doentes medicados com placebo (18,4%) e em 81 dos 616 doentes medicados com AAS (13,1%), o que representa uma redução relativa de 32%. Registaram-se 4 mortes, 2 em cada grupo. O AAS reduziu o risco de eventos cardiovasculares major em 34% (8,7% por ano versus 5,7% por ano). Hemorragia clinicamente relevante ocorreu em 12 doentes medicados com placebo (0,7% por ano) e em 18 doentes medicados com AAS (1,1% por ano), não tendo sido considerado estatisticamente significativo. Houve ainda uma redução absoluta de tromboembolismo venoso em subgrupos com maior risco: redução de 3,3% por ano em homens versus 1,7% por ano em mulheres e redução de 5,5% por ano em idades superiores a 65 anos versus 1,3% em idades inferiores a 65 anos. A redução relativa de tromboembolismo venoso não diferiu significativamente em cada ano de follow-up, contudo a redução absoluta foi maior no primeiro ano.
Conclusão: O AAS, após tratamento anticoagulante, reduz o risco global de reincidência de tromboembolismo venoso em mais de 30%, sem aumentar significativamente o risco de hemorragia.
Comentário: Além da demonstração da eficácia do AAS na prevenção do tromboembolismo venoso após um primeiro episódio, este estudo demonstra ainda a segurança do tratamento, o que, associado ao baixo preço do mesmo, faz com que seja uma óptima opção na prática clínica. Um dos aspectos que não foi alvo de análise foi a duração do tratamento, uma vez que um estudo teve a duração de 2 anos e outro de 4, não se retiram conclusões sobre durante quanto tempo beneficiam os doentes do tratamento com AAS, após um primeiro episódio de tromboembolismo venoso.
Por Carlos Alves Ferreira, USF Esposende Norte