A mama

“Podemos pretender ser quanto queiramos; mas não é lícito fingir que somos o que não somos.”

Ortega y Gasset

 

O caso da prova de evidência de lactação provocou natural indignação. Mais não haveria a dizer se nos cingíssemos ao humilhante método escolhido para fazer prova, mas vale a pena aproveitar este pequeno incidente para discorrer sobre a inutilidade de certos atestados e a legitimidade de comprovar a veracidade da situação que justifique um direito.

Pôr em causa a legitimidade da verificação dum qualquer atestado é defender o direito à fraude, o que é inaceitável. Ora, um atestado identificando como amamentadora uma mãe que o não seja é uma fraude. É sabido que a OM  tem vindo sugerir que se incremente a verificação de atestados médicos de doença, com vista a combater a burla e consequente desprestígio da classe. Portanto, salvaguardada a decência do método, é legítimo confirmar se a mãe está ou não a amamentar. Aliás, em boa verdade, na esmagadora maioria dos casos o médico emissor desta declaração fá-lo baseado na boa fé da requerente. Isto é, limita-se a assinar de cruz um documento cuja veracidade não pode afiançar.

A intervenção da OM neste caso ficou muito aquém do desejável: deveria ter reivindicado o fim dos atestados de lactação, que servem apenas para desprestigiar os emissores e consumir tempo; às utentes e aos médicos.

Há quem defenda o subterfúgio do falso atestado com a legítima preocupação em aumentar o tempo que a mãe dispõe para o seu rebentinho. Mas então voltamos ao mesmo: para que serve um documento que se assume como falso, mas justificável? Se assim é mude-se a lei e, uma vez mais, acabe-se com este atestado fantoche. Acabe-se com a “mama”.

Por Acácio Gouveiaaamgouveia55@gmail.com

(artigo publicado em simultâneo no MGFamiliar e no Jornal Médico)

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