Diferenças étnicas no estudo do cancro da próstata




Pergunta clínica: Existem diferenças étnicas na abordagem dos pacientes ao diagnóstico do cancro da próstata?

Enquadramento: Quando se comparam os outcomes do cancro da próstata entre homens de raça branca e raça negra, estes últimos apresentam, nos Estados Unidos da América, 1,6 vezes maior probabilidade de serem diagnosticados com cancro da próstata e o dobro da mortalidade e, no Reino Unido, três vezes maior incidência sendo a probabilidade de desfecho fatal 35% maior. Estas diferenças podem justificar-se por factores biológicos mas, também, pelas abordagens diagnósticas e de tratamento, condicionadas por atraso no diagnóstico, co-morbilidades, diferenças socio-económicas ou auto-medicação perante sintomas urinários.

Desenho do estudo Estudo efectuado através de um questionário electrónico em que era apresentada uma situação clínica hipotética, ao nível de quatro unidades de cuidados de saúde primários em Bristol, entre Janeiro e Abril de 2014. Os participantes tratavam-se de homens com idade igual ou superior a 40 anos, residentes em áreas com uma elevada concentração de minorias étnicas, após recorrerem a consulta médica e perante consentimento informado. Os inquéritos entregues continham uma explicação sobre os sintomas de cancro da próstata e o nível de risco de cancro da próstata ajustado aos sintomas e pretendiam, no final, questionar os intervenientes sobre se perante essa sintomatologia optariam ou não por realizar investigação diagnóstica e uma lista de razões acerca do porquê de escolherem ou declinarem.

Resultados: dos 555 homens que participaram neste estudo, 52% tratava-se de homens de raça negra e 48% de raça branca. Os homens de raça negra eram mais jovens e tinham mais empregos a tempo inteiro quando comparados com os de raça branca, sendo que os de raça branca tinham mais familiares ou amigos com história de cancro da próstata que os de raça negra. No global, 81% dos participantes optaria por realizar investigação diagnóstica, sendo que os homens de raça branca optariam por fazer essa investigação de forma independente do risco em 94% versus 70% de raça negra. Para um nível de risco baixo, esta diferença foi mais acentuada com 91% dos homens de raça branca a optar versus 44% de raça negra. Mesmo após ajuste à idade, situação profissional, antecedentes pessoais de neoplasia ou nível de risco de cancro da próstata, estas diferenças permaneceram com significado estatístico (p<0,001). Quanto às razões evocadas para justificar a investigação, em ambos os grupos e em maior proporção nos homens de raça branca a mais vezes respondida foi o “diagnóstico precoce”, sendo que na raça negra a “consciência tranquila” foi a segunda resposta mais vezes dada, com valores próximos do “diagnóstico precoce”. Relativamente aos casos em que optariam por não realizar investigação diagnóstica, a principal razão foi “baixo risco de cancro da próstata”, destacando-se ainda uma proporção maior de homens de raça negra a responder “não quero saber se tenho cancro” relativamente aos de raça branca.

Comentário: este estudo, com base em cenário hipotético, concluiu que os homens de raça negra optariam por investigação diagnóstica de cancro da próstata menos frequentemente que os homens de raça branca (70% versus 94%), sendo esta diferença mais acentuada quando o risco teórico de cancro da próstata é baixo com 44% dos homens de raça negra a optar versus 91% dos homens de raça branca. Nos casos em que a investigação seria declinada, a principal razão foi o baixo nível de risco em ambos os grupos, sendo que a ausência de vontade em saber se teriam cancro se destacou em maior proporção nos homens de raça negra. Estes dados poderão explicar o maior número de casos diagnosticados em estadios avançados e a maior mortalidade verificada na raça negra. Este estudo pode ajudar o médico de família na abordagem biopsicossocial da problemática do cancro da próstata. Este deve estar alerta para a possível maior renitência dos indivíduos de raça negra na investigação diagnóstica, mesmo sabendo que a incidência e a mortalidade são maiores neste grupo, pelo que deverá saber usar estratégias proactivas de transmissão da informação não esquecendo nunca a medicina centrada no paciente.

Artigo original: Br J Gen Pract

 Por Ana Rita Magalhães, USF Topázio  




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