Homeopatia, um mal que não vem só

 

 


 

 

Ben Goldacre é um médico psiquiatra, inglês, investigador, autor de vários livros e de várias TED Talks sobre temas como ciência, medicina baseada na evidência, pseudociência e homeopatia. No passado dia 18, foi publicado um artigo muito pertinente escrito por Ben Goldacre e a sua equipa de investigadores. Trata-se de um estudo transversal, em que se tenta responder à seguinte questão: “Está a prescrição de tratamentos homeopáticos nos Cuidados de Saúde Primários ingleses associada à má qualidade de prescrição terapêutica? Por outras palavras, será que os médicos que prescrevem homeopatia, também têm uma prática de prescrição que se afasta da melhor evidência científica e das boas práticas?

Para responder a esta questão, a equipa de Ben Goldacre consultou as bases de dados de prescrição dos Cuidados de Saúde Primários ingleses e identificou 644 unidades de saúde que, num período de 6 meses, tinham prescrito tratamentos homeopáticos. Depois, foi comparar quatro indicadores de qualidade de prescrição terapêutica e ainda dois indicadores de qualidade de desempenho (estes não se relacionavam com a prescrição de medicamentos) entre as 644 unidades de saúde que tinham prescrito homeopatia com as 6974 unidades de saúde que não tinham prescrito homeopatia.

Os resultados demonstram que a prescrição de homeopatia está associada um pior desempenho nos quatro indicadores de prescrição terapêutica. Também se observou um efeito de proporcionalidade entre os prescritores de homeopatia. Ou seja, quanto mais frequente a prescrição de homeopatia, pior a qualidade prescrição terapêutica. No fundo, os profissionais de saúde que prescrevem homeopatia, tendem a praticar uma medicina menos fundamentada na evidência científica de melhor qualidade e mais distante das boas práticas.

Porque é que este artigo é relevante?

Porque enquanto médicos, devemos todos zelar pela boa qualidade da medicina e zelar por uma medicina baseada na ciência. Este estudo revela como a prática da pseudociência, típica da homeopatia, pode “infetar” colegas nossos e como isso se associa à prática de uma medicina de pior qualidade. No fim da linha, os nossos pacientes serão os principais prejudicados. 

O que é a homeopatia?

Para responder a esta pergunta, vou usar como fonte o próprio artigo da equipa de Ben Goldacre. A homeopatia não tem qualquer fundamentação científica nem um mecanismo biológico plausível de funcionamento. Os medicamentos homeopáticos são desenvolvidos a partir da descoberta do agente causal. Ou seja, descobre-se uma substância que causa certo sintoma. Por exemplo, uma substância que causa náuseas. Depois, 1 gota dessa substância é diluída em 100 gotas de água, tipicamente por 30 diluições sequenciais, resultando numa solução de 1 para 10. Embora nenhuma molécula do princípio ativo permaneça depois de tantas diluições, os homeopatas afirmam que a água tem memória para o princípio ativo. Uma gota dessa água é então colocada num recipiente com comprimidos de lactose. Os homeopatas afirmam que os comprimidos recebem e transmitem as qualidades previamente memorizadas pela água. Entre cada diluição, os homeopatas afirmam que o frasco deve ser batido firmemente contra uma superfície de couro sobreposta em crina de cavalo, a fim de “fortalecer” a água.

Pois é, agora que sabe como são produzidos os comprimidos dos tratamentos homeopáticos, também fica a saber que um comprimido homeopático não passa de um comprimido de lactose que levou umas pancadas contra um pedaço de couro.

Finalmente, uma curiosidade…

Este artigo, agora publicado no Journal of the Royal Society of Medicine, havia sido submetido pelos autores para publicação na edição especial de Natal do BMJ, mas foi recusado com o argumento de que não seria suficientemente “engraçado” para entrar nessa edição. Ora vejam este tweet:

 

ben goldacre on Twitter

OH I SEE, BMJ WON’T PUBLISH OUR PAPER BUT THEY WILL WRITE A NEWS STORY ABOUT IT. (Kidding, they rejected it from Xmas BMJ issue on the grounds that it “wasn’t very funny” among other things. We couldn’t decide if we disagreed…). https://t.co/DOxSia0emm

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