Humanizar a saúde

 



“Um médico que só de Medicina sabe, nem Medicina sabe”. (Abel Salazar)

 

Deparamo-nos muitas vezes com a seguinte situação: “Se estivermos doentes, preferimos um médico com muitos conhecimentos técnico-científicos, mas distante, frio, que mal encara o doente nos olhos ou, menos conhecedor cientificamente, mas mais humano?”. Julgo tratar-se de uma falsa questão. Na realidade, se o médico é “frio” na relação que estabelece com o utente, então já não é competente, pois todos sabemos que “o melhor remédio para o utente é o próprio médico”. Daí se explica o facto de muitas vezes nos sentirmos quase curados ou, pelo menos, muito mais aliviados quando saímos de uma consulta médica. Mas, para que tal ocorra, o utente tem que sentir que foi compreendido pelo seu médico, que este o ouviu e legitimou as suas queixas e preocupações, que o tranquilizou em relação aos seus receios, esclareceu todas as suas dúvidas e mostrou total disponibilidade para si. Ora, um médico que carece desta competência, que não estabelece qualquer relação com o utente, que não o encara, que negligencia os seus sentimentos e emoções face à situação que motivou a procura de cuidados médicos, não deve ser considerado um médico competente.

A Medicina pura aprende-se nos livros, nas aulas da Universidade, nos congressos e nas sessões de formação. O “Ser Médico” aprende-se no dia-a-dia, no contacto com o doente, através de um processo simultâneo de hetero e autoconhecimento, em que tentamos constantemente compreender as reações que o outro causa em nós e a forma como estas se refletem na nossa relação com o outro. A empatia, capacidade de nos colocarmos no lugar do outro, é provavelmente o determinante fulcral para o sucesso da relação terapêutica médico-doente. Através da empatia aprendemos a colocar-nos na pele do outro e, se conseguirmos saber como o outro sente e pensa, poderemos aprender tanto com as suas vidas como com a nossa. A empatia abre-nos os horizontes, permite-nos ver muitas realidades (e não apenas a nossa), permite-nos uma aprendizagem constante, em cada contacto com o outro. Pelo contrário, a falta de empatia aprisiona-nos, torna-nos pequenos, limitados e egocêntricos, isolando-nos do mundo. Ora, ninguém deseja um médico que fala mas não diz, observa mas não vê, ouve mas não escuta, pensa mas não compreende. E isto, só se aprende com o doente. 

Assim, um atendimento humanizado pressupõe a união de um comportamento ético com conhecimento técnico e com a oferta de cuidados dirigidos às necessidades dos pacientes. Muitas dificuldades enfrentadas pelos cidadãos enquanto frequentadores dos Cuidados de Saúde podem ser evitadas quando se ouve, compreende, acolhe, considera e respeita suas opiniões, queixas e necessidades. Atualmente, a humanização e o investimento no bem-estar do paciente são objeto de intenso debate no mercado de Saúde, pois, como sabemos, os constantes avanços tecnológicos do setor podem não se acompanhar do aprimoramento na qualidade do relacionamento humano que tanto dignifica, ou deve dignificar, a relação médico-doente. 

Por Babila Carvalho, USF do Minho (Braga)

 

 

 

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