Pergunta clínica: Em paciente com lombalgia ou cervicalgia crónicas, a associação do mindfulness, da terapia cognitivo-comportamental, do ioga, do tai chi ou da acupunctura melhora o controlo da dor?
Enquadramento: A lombalgia e cervicalgia crónicas são condições muito frequentes e incapacitantes, com elevados custos associados (diretos e indiretos). É importante investigar alternativas ao tratamento farmacológico clássico que sejam seguras e com boa relação custo-efetividade. Há evidência inequívoca de que a dor crónica é modulada por aspetos físicos e psíquicos, pelo que o seu tratamento pode em teoria abranger modalidades como a terapia cognitivo-comportamental. Recentemente foi publicado um relatório acerca da eficácia e do papel de algumas modalidades terapêuticas alternativas no tratamento de lombalgia e cervicalgia crónicas, avaliando a evidência clínica e custo-efetividade.
Desenho do estudo: Revisão que incluiu 28 estudos randomizados e controlados para a lombalgia crónica e 17 randomizados e controlados para a cervicalgia crónica. Foi feita a comparação com placebo, terapia usual ou outras modalidades. Foram usados regimes de tratamento típicos para cada modalidade: 2horas/semana durante 8 semanas nas modalidades de mindfulness e terapia cognitivo-comportamental 75 minutos/semana durante 12 semanas para o ioga, 18 sessões de 40 minutos durante 10 semanas para o tai chi, e 10 sessões de 20 minutos durante 10 semanas para a acupuntura.
Resultados: Para a lombalgia crónica todas as modalidades exceto o tai chi condicionaram algum benefício quando adicionados à terapêutica usual (com redução da dor e melhoria da função), em comparação com a terapêutica usual isoladamente, tendo sido classificada a melhoria dos resultados em saúde desde “comparável” a “substancial”, face à terapêutica usual. Dada a segurança aparente destas modalidades, a conclusão teve por base apenas a melhoria clinicamente significativa da incapacidade. O número de ensaios para a cervicalgia crónica foi insuficiente para ser conclusivo. Foram ainda estimados os gastos adicionais com estas modalidades no tratamento da lombalgia crónica. Os custos adicionais com a acupuntura ou a terapia cognitivo-comportamental foram classificados desde “intermédios” a “elevados”. Já o ioga e o mindfulness tiveram ótima relação custo-efetividade, e foi estimado que os custos adicionais com estas intervenções correspondem a cerca de 5% dos custos associados ao uso de medicação.
Conclusão: No tratamento da lombalgia existe um discreto benefício na associação do tratamento dito “convencional” com a terapia cognitivo-comportamental, mindfulness, ioga, tai chi ou acupunctura. No tratamento da cervicalgia os estudos são inconclusivos.
Comentário: Os custos associados às várias intervenções poderão diferir de forma significativa entre países, sendo necessária alguma prudência na interpretação da custo-efetividade. São ainda necessários mais estudos para clarificar o papel do tai chi na lombalgia crónica, e de modalidades terapêuticas não farmacológicas na cervicalgia crónica. Por último, embora os estudos sejam randomizados, é de considerar a existência do chamado “Hawthorne effect”, em que sujeitos e/ou investigadores podem reconhecer que integram o grupo de estudo pelo facto de estarem sob tratamento com modalidades designadas de “alternativas”, face à terapêutica dita convencional, constituindo um possível viés.
Artigo original: JAMA Intern Med
Por Sara Coelho, USF Mondego