O "timing" da terapêutica hormonal de substituição

Por Mariana Rio, USF São João do Porto

As dúvidas em torno da terapêutica hormonal de substituição (THS) “arrastam-se” desde os anos 60. Até 2002, considerava-se que os malefícios da THS eram suplantados pelos seus benefícios [redução do risco de doença cardiovascular (CV), osteoporose e cancro do cólon e reto], mas nesse ano saíram os primeiros resultados que contrariavam essa premissa. Perante estes resultados, surgiu a hipótese do “timing”, ou seja, a hipótese de que as diferenças de outcomes CV estariam relacionadas com o tempo decorrido após a menopausa a partir do qual se iniciava a THS.
Este artigo, publicado a 9 de Outubro de 2012 no British Medical Journal, relata um ensaio multicêntrico prospectivo que procurou saber se a THS iniciada logo após a menopausa está associada a diminuição do risco de doença coronária e diminuição da mortalidade em geral.
502 mulheres foram submetidas a THS com 17-B-estradiol (2mg) durante 12 dias, seguido de 17-B-estradiol (2mg) com acetato de noretisterona (1mg) durante 10 dias e terminando com 17-B-estradiol (1mg) durante 6 dias. As mulheres incluídas no grupo de tratamento com menopausa por histerectomia realizaram a THS apenas com 17-B-estradiol (2mg), uma vez por dia. Todas as participantes foram avaliadas aos 0 e 6 meses, 1, 2, 3, 5 e 10 anos de estudo. A duração prevista do estudo era de 20 anos mas em Agosto de 2002 (10 anos após o início do estudo), as mulheres incluídas no grupo de tratamento foram aconselhadas a parar a THS, em vista dos seus efeitos adversos, e foram acompanhadas por mais 6 anos.
Aos 10 anos de seguimento, não foram encontradas diferenças entre os grupos em relação ao número de mortes, diagnósticos de insuficiência cardíaca (IC) e enfarte agudo de miocárdio (EAM), acidentes vasculares cerebrais (AVC), síndromes coronários  agudos (SCA) e de tromboembolismo (TE) venoso (trombose venosa profunda e embolia pulmonar). Também não houve diferença estatisticamente significativa na ocorrência  de morte por cancro (qualquer que ele seja) nem por cancro da mama.
Aos 16 anos de seguimento, o número de mortes, IC ou EAM foi mais baixo nas mulheres sob THS (P=0,02) mas não foi encontrada uma diferença estatisticamente significativa em relação à taxa de SCA, AVC e TE, nem em relação à incidência de cancro  da mama. O benefício CV encontrado está relacionado com o efeito que a combinação entre 17-B-estradiol com o acetato de noretisterona tem na diminuição dos níveis de colesterol total.
Foi encontrada uma associação entre a utilização de THS e a idade (<50anos) aquando do início do tratamento (P=0,028), com diminuição da mortalidade e do risco para cancro da mama. As mulheres com menopausa cirúrgica, cuja THS foi exclusivamente feita com estrogénio, também tinham o risco reduzido  de morte e de cancro  da mama (P=0,043). Não foi possível comparar os endpoints entre o grupo  de mulheres com menopausa natural e as submetidas a histerectomia. Não houve qualquer relação entre o tabagismo e os endpoints estudados.
O início da THS logo após a menopausa diminui significativamente a mortalidade, o risco de EAM e de IC, não estando associado a aumento do risco de cancro da mama e AVC.



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