Raiva

 

“Guardar raiva é como segurar um carvão em brasa com a intenção de atirá-lo em alguém; é você que se queima.”

Buda

Com muitos temas que pensava abordar, alguns já em fase mais apurada, foi este que surgiu espontaneamente após uma semana caótica, pelo menos num ponto de vista subjectivo.

É fácil imergir nos problemas quotidianos. Problemas que surgem, mas que muitas vezes criamos e amplificamos. Mas o que é que este tema tem a ver com a medicina? Tudo.

Para além de ser um termo relativo a uma doença infecciosa, também é uma palavra que procura definir uma emoção. E quando falamos de medicina, falamos de emoção. Somos humanos, somos emoção. Após pesquisa verifiquei que a palavra raiva deriva do Sânscrito rabhas que significa “ser violento” ou do Latim rabere que significa “fúria” ou “delírio” ou “loucura”.

A consulta é um contacto entre dois mundos, por vezes mais. Nem sempre com as mesmas motivações. Este contacto desperta emoções, que por vezes são difíceis de gerir. A Emoção é um estado temporário, marcado por modificações fisiológicas, em resposta a uma pessoa ou algo no imediato. É diferente do Sentimento, que é mais prolongado no tempo, e é um “processo de decisão”. Como médico, o que me motiva é o acto de sempre decidir pelo bem do utente (sentimento). Este facto não impede que seja invadido por emoções menos positivas.

A capacidade de gerir estas emoções deve ser aprimorada. Após reflectir sobre as consultas, percebi o impacto que a emoção pode ter no processo de relação. Não só naquela consulta, mas nas que se seguem. E não só na consulta, mas também nas relações pessoais. É importante ter um tempo de reflexão. O acumular de emoções que não pairam no crivo da reflexão (nem que seja só por um segundo), prejudicam a relação médico-utente subsequente. A pressão de consultas sequenciais para se cumprir horários e expectativas é uma exigência incontornável, mas não deve descartar a etapa de reflexão. É preferível despender um minuto a filtrar emoções, do que tentar corrigir conflitos criados pelo acumular das mesmas.

“De médico e de louco todos temos um pouco”. A diferença está na quantidade que queremos de cada um.    

Philippe Botas
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