Sintomas ocultos na consulta




Pergunta clínica: Com que frequência e qual o tipo de sintomas que os utentes não abordam com o seu médico de família?

Desenho do estudo: Estudo observacional em cuidados de saúde primários. Incluídos utentes com idade 45 anos. Foi entregue um questionário a cada utente antes da consulta, sobre o motivo da consulta, sintomas presentes na última semana e desejo de os abordar com o seu médico de família. Foi pedido aos utentes o consentimento para preenchimento de questionário e gravação vídeo da consulta em 3 momentos: antes, logo após e 48 horas depois da consulta. Os sintomas foram agrupados em 11 grupos, com base no Subjective Health Complaint Inventory e Consultations in Primary Care Archive .

Resultados: Foram convidados 252 utentes, sendo o número final da amostra de 190 utentes. Os problemas mais identificados foram músculo-esqueléticos (21,6%), da pele (11,6%) e respiratórios (10,5%). Dos utentes que descreveram um motivo de consulta, 98,4% expressaram-no ao médico de família. Em 43 consultas (22,6%), 67 grupos de sintomas não foram discutidos. Apenas um médico não teve consultas em que ficaram sintomas por discutir (variação de 0-41% entre diferentes médicos). Os grupos de sintomas mais reportados foram “dores articulares”, “dor de costas ou de pescoço” e “cansaço/problemas de sono”, com n=88, n=62 e n=59, respetivamente. Quanto aos grupos cuja intenção de discutir foi completada, destacam-se “problemas com a micção” (88,9%) e “dificuldade respiratória/tosse” (83,3%), como os mais frequentes, e “problema íntimo/pessoal” (50%) e “cansaço/problema de sono” (34,8%) como os menos frequentes. 
Sintomas que mais frequentemente foram referidos como sendo um problema, mas sobre os quais não queriam falar com o médico, incluíram stress, preocupações ou tristeza, fadiga, problemas de sono, queixas de micção urinária, cefaleias e problemas de intimidade ou problemas pessoais.

Comentário: Como limitações desta investigação apontam-se o possível aumento do número de sintomas reportados (eventualmente provocado pela sua descrição em forma de lista); as dificuldades na caracterização detalhada dos sintomas e a sua possível sobreposição em diferentes categorias. A ausência de representatividade da população, por comparação com a portuguesa, é outra das limitações. Destaca-se ainda a possível subestimação destes resultados tendo em conta o conhecimento prévio, por parte do utente e do médico de família, da vídeo gravação da consulta. Durante a consulta é importante identificar a agenda escondida dos utentes. Alguns problemas relevantes podem ser, por exemplo, considerados mais sensíveis pelo que nem sempre são abordados de forma expressa. O desenvolvimento de competências em comunicação clínica é um dos pilares da medicina geral e familiar.

Artigo original: Fam Pract

Por José Teixeira, USF Viriato 



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